Climão
Artigo escrito por Nelson Fonseca Neto
Quem lê regularmente esta coluna sabe que o passar do tempo é um tema central. Grande novidade. Cronista que é cronista é vidrado nas maravilhas e nos estragos que o passar dos anos carrega.
Então senta que lá vem história.
Não se preocupe. Isto aqui não será o muro das lamentações. Também não será o retrato exemplar da vida bem vivida.
(Já fui meio chorão e já dei uma de sábio em várias ocasiões. Hoje, não espere reflexões, em tese, refinadas. Quero mais jogar conversa fora. Pode ser?)
Ô teminha abrangente esse.! Falar da passagem do tempo abre margem pra várias coisas. Escolhi algo que tem chamado a minha atenção nos últimos dias.
Falemos de clima. Clima no sentido literal. Clima no sentido de condições atmosféricas mesmo.
Se você tem a minha idade ou é mais velho, sabe que, alguns anos atrás, temperatura e regime de chuvas eram coisas mais, digamos, domesticadas. Não que não houvesse uma ou outra ocorrência bizarra. Havia. Mas tudo parecia mais organizado.
Janeiro, fevereiro e março: calorão e chuva com hora marcada. Nasci em novembro. Meu pai também. Meu irmão é de janeiro. Quase sempre nossos aniversários eram comemorados com calorão e chuva. Pegar os salgadinhos era um treco meio épico. Todos nós saíamos nas fotos com o rosto brilhando de suor.
Abril e maio: meses de moderação. Tudo funcionando como se a natureza estivesse mostrando que o caminho do meio é o caminho da sabedoria. Dias de frio que faziam a gente se sentir mais elegante. Dormir era mais fácil. Acordar, nem tanto. Era gostoso estar na escola nesses dias.
Junho e julho: a prova de que o Brasil bem que poderia ser mais precavido e montar uns sistemas mais parrudos de aquecimento. Minha mãe faz aniversário em julho. Ela é da região de Campos de Jordão, da gloriosa Santo Antônio do Pinhal. Faz todo sentido. Não costumávamos fazer festinhas em casa no aniversário dela. Até hoje é assim. Ela prefere desse jeito. Concordo com ela. Em décadas passadas, ela comandava os esquemas das festinhas da homarada da casa. Trabalheira danada.
Em junho e julho, também tinha a festa junina no CIC e os casacões de náilon. Era Sorocaba ou era Montana? E dá-lhe chocolate quente torrando o beiço da moçada. E dá-lhe aquele treco meio nojento de fondue.
Agosto, setembro e outubro: meses de pouca emoção climatológica. Meses mutantes, de transição. Nada que causasse mudanças chamativas nas roupas que vestíamos. Nada de eventos bombásticos.
E é aqui que a cuíca ronca um pouco mais forte.
Escrevo este texto porque não me conformo com o calorão que tem feito nos últimos dias. Agosto não era assim. Certeza. E estou vendo que a temperatura cairá nos próximos dias. E subirá daqui uma semana.
Aqui entra o lance da passagem do tempo. A coisa era meio maluca desse jeito? Eu bem que poderia gastar alguns minutos pesquisando na internet. Seria fácil. Mas perderia a graça. Prefiro ficar com a convicção da subjetividade e da memória afetiva.
Talvez, ao chegar perto do final desta coluna, você pergunte: o cronista prefere calor ou frio? Chuva ou tempo seco? Passei grande parte da vida torcendo por dias nublados e frios.
Aí a gente se torna pai. E de repente a gente se vê jogando no time da moderação. Um tantinho de chuva para umedecer o ar. Um calorzinho durante o dia, de modo que o João Pedro aproveite o solzinho. Uma esfriadinha de leve para o sono ser mais confortável.
Ou seja: o infalível caminho do meio.