Um gênio
Foi só de um tempo pra cá que eu resolvi falar de música por aqui. Isso tem chamado a atenção de alguns leitores. Não reclamam, longe disso, acham divertido. Perguntam onde estava a música nesses anos todos. Minha resposta é meio esquisita.
Tirei minha habilitação de motorista aos 18 anos. Por um bom período, os carros que fui usando tinham toca-fitas ou toca-cds. Era bem legal na época das fitas. Lá em casa eu tinha um aparelho que gravava música de cd em fitas. Eu fazia a festa. Minhas fitas tinham de tudo um pouco. Isso durou uns dois, três anos.
Quando o toca-fitas foi trocado pelo toca-cds, passei a levar no carro umas bolsinhas com dezenas de cds. Até que era uma coleção interessante. Também tinha de tudo um pouco lá. Nunca fui intransigente na música. Acho que música tem a ver com humor. Tem hora que a gente quer dar uma sacudida no corpo. Tem hora que a gente quer baixar a bola.
Entre fitas e cds fui tocando o barco por muitos anos. Depois parou do nada, não sei dizer o que aconteceu. Passei a ouvir apenas música que tocava nas rádios da cidade enquanto esperava o semáforo abrir. Na época eu não me dei conta, mas agora eu posso cravar: que jeito triste de passar o tempo.
Então, em julho deste ano, resolvi assinar um serviço de música na internet. No meu celular, passei a ter acesso a milhões de discos. Eu sei que é meio egoísta falar assim meio deslumbrado, alheio às consequências disso pro mundo da música -, mas tem sido uma farra. Um dia eu escrevo de um jeito mais sério a respeito de como o serviço que passei a assinar não é tão fofo assim.
De julho pra cá, não liguei mais o rádio do carro. Vou à academia e às caminhadas ouvindo umas coisas muito, muito legais. Continuo ouvindo de tudo um pouco. Se bem que nos últimos dias eu tenho procurado artistas brasileiros que fazem crônica em forma de música. Acho um filão maravilhoso. Noel Rosa, Gonzagão, Aldyr Blanc, João Bosco, Racionais MCs, Wilson das Neves, Paulinho da Viola, Zeca Pagodinho. Pausa pra falar desse último cara.
Eu sou fanzão do Zeca Pagodinho. Do jeito dele, das músicas. Aproveitando o embalo, passei a semana passada ouvindo todos os discos dele. Vamos combinar uma coisa? O Zeca Pagodinho, além de ser um dos caras mais legais do mundo, é um artista gigante. Dá pra gente ficar um tempão falando das músicas dele. Ali você encontra a alegria, a sabedoria, o bairro, a farra, a amizade, o amor, os perrengues. Meu amigo, faça a experiência. Comece com “Zeca Pagodinho”, de 1985, e manda brasa.
E agora não tem como eu não comentar sobre as capas dos discos do Zeca Pagodinho. O disco de 1985 mostra o cantor novinho de tudo, com um casaco branco e uma camisa polo amarela. Lembro de ver
sempre esse disco na casa da minha vó Mariquita. Aí você vai vendo as capas dos discos seguintes e vai percebendo que elas são de uma simplicidade comovente.
Não sou nada entendido dessas paradas de capa de disco, então vocês perdoem o que vou dizer: acho que a capa de “Pagode de Cosme”, de 1986, é a mais linda de todas que eu já vi. É a foto do Zeca Pagodinho e um monte de crianças, de tudo quanto é idade. Mais pro fundo, o cantor, com um bebê em cada braço. Parece tanto aquelas fotos caóticas de aniversário dos anos 80! Sei lá, vai ver é viagem minha, mas acho que a imagem resume a grandeza do Zeca Pagodinho. Alegria, festa, comunidade, criança, folia, pode vir que sempre cabe mais um.
Zeca Pagodinho é a graça que entra sem pedir licença.