Iriélisy e Beatriz, uma história de amor
Mãe passou pela Covid durante a gravidez e conta que teve de optar pela cesárea pela saúde a filha
Mãe. No dicionário, substantivo feminino, uma mulher que deu à luz, que cria filhos. No dia a dia, sentimentos e aplicações diferentes para cada mulher em distintas fases da vida, afinal, cada maternidade é única. Entretanto, no geral, muitos classificam a palavra “mãe” como amor incondicional.
E, em forma de agradecimento por todo esse afeto, hoje (14) é comemorado o Dia das Mães em todo o País. Uma data que para a enfermeira Iriélisy Cáceres, de 41 anos, do setor de endoscopia do Hospital Evangélico de Sorocaba, mãe da pequena Beatriz, de 2 anos, é ainda mais especial, sobretudo pelas dificuldades enfrentadas durante a gestação, vivida durante o início da pandemia de Covid-19.
Hoje, o coronavírus não é configurado mais como emergência em saúde pública de importância internacional, de acordo com anúncio da Organização Mundial da Saúde (OMS) no último dia 5. A notícia foi vista pela população com alívio, bem diferente de março de 2020, quando a pandemia se instaurou em todo o mundo de maneira devastadora.
Foi nesse mesmo ano, em janeiro, que o casal Iriélisy e Henrique começou a pensar e planejar a gravidez. Antes, devido à rotina de trabalho intensa da enfermeira, que na época atuava na da área materna infantil, e do engenheiro, o tema não era discutido em casa. E, por conta da idade, decidiram fazer exames para saber se estava tudo bem com a saúde de ambos. Foi aí que a primeira má notícia chegou. Com os resultados, descobriu-se que a chance de gravidez era de 10%.
Entretanto, uma palavra de conforto do esposo fez com que a enfermeira não desistisse. “Ele disse assim para mim: Vamos deixar na mão de Deus, tentaremos pelo menos por seis meses, se não der certo por vias naturais, tentamos no máximo duas fertilizações in vitro. Se for pra ser, Ele vai tomar todos os caminhos e vai acontecer”, contou. Poucas semanas depois, em fevereiro, a surpresa, Iriélisy estava grávida.
A vida foi seguindo com eles tomando todas as precauções possíveis, inclusive em março daquele ano, com o anúncio da pandemia e atuando na linha de frente. Naquela época não existia regulamentação em relação ao grupo de risco e ao afastamento de grávidas no trabalho com o perigo para a mamãe e bebê.
A promessa
Algumas semanas depois, veio uma sensação de cansaço, que não era vista como sintoma porque os plantões estavam bem exaustivos. O que a profissional não imaginava era que seria uma paciente assintomática. Na 21ª semana de gestação, a notícia: resultado positivo para Covid-19 e 55% do pulmão já comprometido. O medo veio e uma correria começou.
“Um pouco antes de me levarem para o Samaritano, um dos hospitais referência para o isolamento de pacientes na época, eu comecei a conversar com meu marido e ‘caiu a ficha’. Eu falei pra ele que, até o momento, quem estava com essa porcentagem de comprometimento no pulmão não teve sucesso, e que por mais dolorido que fosse, aquela conversa era necessária. Foi então que eu falei que ‘se caso eu não voltar, como acredito que não vá acontecer pelo grau que está, eu quero que você invista na vida da Bia’. E ele concordou”, disse emocionada à reportagem.
A partir daquele momento Iriélisy sentiu muita paz no coração. “Eu não a tinha no colo ainda, não sabia o que era ser mãe, mas ela já estava dentro de mim, então a partir daí que tudo começa a mudar e eu senti força pra fazer aquele pedido a ele”, complementou.
No dia da transferência, uma cena que ela guarda como se fosse hoje é quando entrou, deitou e olhou o teto da ambulância e percebeu o quando a doença era solitária. “Ao fechar os olhos um filme passou pela minha cabeça e tudo em questão de segundos. Eu nunca tinha vivido uma experiência de pré-morte, de diagnóstico como aquele, gozava de plena saúde. Nesse ‘vídeo’ eu lembrei de tudo que Deus prometeu na minha vida e foi mais um conforto, apesar de temer muito pela prematuridade da bebê e estar, de certa forma, sozinha.
A piora e a melhora
Já internada, no sétimo dia com a medicação, a enfermeira começou a ter um agravamento no caso: tosse, baixa saturação, os rins e pâncreas começaram a parar, glicemia e hipertensão em níveis altos. Com tudo isso acontecendo, o medo ficou maior, já que o risco da criança ser afetada era grande. Em meio a toda essa situação, Iriélisy só podia contar com o marido e, por escolha própria, escondeu de seus pais o que enfrentara.
Em agosto, optou em contar aos familiares sobre a doença e os riscos da gravidez, apesar da imensa dificuldade em respirar. Desde então, passou a receber orações constantes das pessoas que conhecia. Poucos dias depois, na madrugada anterior do dia em que seria intubada, começou a ter uma melhora no quadro clínico. Ela estava há 20 dias internada e com 31 semanas de gestação. Com isso, recebeu a alta do hospital e, sob supervisão médica, o controle de insulina e hipertensão continuou em casa.
O parto
Apesar da saída do hospital e a cura da Covid, a preocupação maior era a criança. Ao chegar nas 36 semanas, mesmo com todo o cuidado, a glicemia baixava muito e o risco do coração do bebê parar era potencial. Foi então que a família optou por antecipar o parto e iniciar a cesariana.
“Eu tinha idealizado um parto humanizado, natural, mas foi o contrário, foi horrível, mesmo a equipe tentando deixar o melhor possível. Eu passei mal, o pulmão já não estava aguentando muito também. Aquela foto clássica do bebê no colo da mãe eu não tive, o mais próximo que cheguei foi eu segurando a mãozinha dela na incubadora. Tudo que eu via com outras mães na UTI Neonatal, eu vivi e foi difícil sim”, analisou.
Já no mundo, Beatriz se recuperou rápido e em dois dias mãe e filha já estavam em casa. “Vivi toda a questão da amamentação, consegui ficar com ela, Deus abençoou e hoje estamos aqui, aproveitando esse contato”, disse.
Ser mãe
Depois que tudo que passou, Iriélisy acredita que ser mãe é um sentimento indescritível e isso, se deve, talvez, por ter sido mãe aos 40 anos. “É encantador, a gente vibra, comemora e rende graças por coisas mínimas do dia a dia. Muita gente fala que o amor só cresce e eu não acreditava muito nisso, mas é verdade. Quando nasce a gente já ama, mas com o passar do tempo, o amor só aumenta. É inacreditável”, contou.
Hoje, com dois anos e sete meses de vida, Beatriz Cáceres Dias está saudável, espoleta e sem nenhuma sequela por causa da Covid-19 da mãe.
Administrar a rotina de plantões, da casa e dos cuidados de uma criança pequena, para muitos é complicado, mas a enfermeira diz que é possível. “É um grande desafio, mas a gente consegue e dá conta. O maior desafio hoje é vencer o físico, porque o emocional e o espiritual, por tudo que a gente passou, traz um preparo para tudo. Dou graças a Deus por tudo que tenho hoje”, finaliza Iriélisy Cáceres. (Thaís Marcolino)