Centrão elabora PEC para anular decisões do Supremo
Reversão poderia ocorrer nos casos em que não houve unanimidade
A cúpula do Centrão pôs no papel uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite aos deputados e aos senadores anularem decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), prerrogativa que o Legislativo não tem hoje. O texto dá ao Congresso o poder de revogar julgamentos da mais alta Corte do País sempre que a decisão judicial não for unânime e houver uma alegada extrapolação dos “limites constitucionais”.
A intenção do grupo é reverter julgamentos que tenham derrubado leis aprovadas no Congresso ou contrariado bancadas. Os parlamentares poderiam também revisar decisões tomadas pelo Supremo em temas que não são consenso no Legislativo, como, por exemplo, a definição sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas e a criminalização da homofobia. Ambos os casos são citados pelos políticos defensores da PEC como parte do que consideram um “ativismo judicial” da Suprema Corte.
Como a condicionante para o que pode ser revisto é abrangente, tudo o que “extrapolar limites constitucionais”, o Congresso poderia anular até mesmo condenações de políticos, bastando para isso que a sentença não tenha sido aprovada por unanimidade no STF.
Levantamento mostra que de janeiro de 2019 até hoje, foram 5.865 acórdãos (registro de decisões) por unanimidade no plenário do STF. No mesmo período, 2.402 foram aprovados sem votação unânime.
O caso do julgamento da criminalização da homofobia, por exemplo, está na mira de deputados que patrocinam a PEC -- grande parte do Centrão é da bancada evangélica. O julgamento no Supremo não foi por unanimidade -- foram oito votos favoráveis.
A estratégia do Centrão que tem à frente o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e os deputados Wellington Roberto (PL-PB), Ricardo Barros (Progressistas-PR) e Marcos Pereira (Republicanos-SP) é fazer a proposta avançar depois das eleições de outubro sob o argumento de que é preciso conter o que consideram um “ativismo judicial” do Supremo.
O discurso casa com o do presidente da República, Jair Bolsonaro, crítico da atual composição da Corte, para quem o Supremo tem extrapolado suas atribuições.
O deputado Domingos Sávio (PL-MG), destacado pelo grupo de partidos para colocar a proposta no papel disse que fará um “esforço concentrado” para reunir as 171 assinaturas que garantem a tramitação da proposta na Câmara.
Pelo texto, para derrubar uma decisão do Supremo, bastaria o Congresso aprovar um projeto de decreto legislativo específico -- o que exige 308 votos na Câmara e 49 no Senado.
Inconstitucional
A reportagem apresentou o texto da proposta a constitucionalistas, que veem uma interferência indevida no Judiciário. “É uma inversão do sistema de separação de Poderes. Uma coisa é dizer que o Legislativo pode mudar a interpretação sobre a Constituição, outra coisa é transformar o Congresso numa instância revisora de decisões do Supremo”, afirmou o professor de Direito Constitucional Wallace Corbo, da Fundação Getulio Vargas (FGV-Rio). (Estadão Conteúdo)