Ronaldinho Gaúcho nega ser dono de empresa de criptomoedas
O ex-atleta prestou depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras, na Câmara dos Deputados
O ex-jogador de futebol Ronaldo Assis Moura, o Ronaldinho Gaúcho, negou ser fundador e sócio-proprietário da empresa 18K Ronaldinho Comércio e Participações Ltda, de investimentos de moedas virtuais (criptomoedas), e, também, de ter firmado contrato com a empresa LBLV.
O ex-atleta prestou depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras, na Câmara dos Deputados, nesta quinta-feira (31), em Brasília, por envolvimento com essas duas empresas que teriam causado prejuízos milionários a investidores em esquemas fraudulentos de pirâmides financeiras. No Brasil, essa prática é considerada ilegal e um crime contra a economia popular.
Durante a sessão, primeiramente foram cobrados esclarecimentos da empresa que leva o apelido na razão social (18kRonaldinho) e que prometia retorno financeiro, em menos de um ano, de até 400% dos valores investidos em bitcoins ou rendimentos de 2% ao dia. Além de ganhos pelo rendimento do valor investido, a 18kRonaldinho ainda prometia bônus pela indicação de novos membros para o negócio de alto risco. O valor inicial dos investimentos era de U$ 30.
A CPI das Pirâmides Financeiras alega que a 18K Ronaldinho bloqueou os saques de investidores, que não conseguem reaver os valores. Ainda em outubro de 2019, a empresa foi apontada pelo Ministério Público Federal (MPF) como uma pirâmide financeira.
A segunda acusação aponta o envolvimento de Ronaldinho Gaúcho com a empresa LBLV, por ser garoto propaganda no site da instituição, que tem endereço comercial nas Ilhas Seychelles. Em 2019, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) suspendeu a atuação da empresa no Brasil por captar clientes em operações irregulares.
Alegações
O ex-atleta esteve acompanhado do irmão e empresário dele, Roberto de Assis Moreira, e de um advogado, que deu orientações durante o depoimento de duas horas e 30 minutos. Sobre essa acusação envolvendo a LBLV, Ronaldinho negou aos parlamentares conhecer qualquer representante da empresa ou ter contrato direto com LBLV, mas admitiu ter firmado contrato com outra empresa de gestão de mídias sociais, a Tailor Media, para cessão de direitos de imagem. E esta última tinha ligação com a LBLV.
"A campanha de marketing para empresa LBLV foi contratada pela agência de publicidade e negócios de nome Tailor Media, radicada em Israel, e ela possui a conta de marketing da empresa LBLV".
No depoimento, o ex-jogador explicou também a relação com a 18K Ronaldinho. Ele reiterou que, em 2016, assinou contrato com a empresa norte-americana 18k Watches Corporation para licenciamento temporário de sua imagem para criação de uma linha de relógios vendidos em vários países, com o nome 18K Ronaldinho.
Segundo ele, outras personalidades do mundo esportivo licenciaram suas respectivas imagens para a criação das linhas de relógio similares, com a mesma empresa.
Em seguida, Ronaldinho confirmou que, posteriormente, em julho de 2019, firmou contrato com a empresa brasileira 18k Watches Comércio Atacadista e Varejista de Relógios e Intermediações de Negócios Eireli, dos sócios Rafael Honorário Nunes de Oliveira e Marcelo Lara Marcelino.
O acordo comercial era para licença temporária de uso de imagem, nome, assinatura, apelido e som de voz do atleta para divulgação de empresa do marketing multinível [modelo comercial de distribuição de bens ou serviços em que os ganhos podem vir da venda de produtos ou do recrutamento de novos vendedores, o que é considerado por alguns especialistas como uma pirâmide].
Ronaldinho Gaúcho afirmou que seu nome e sua imagem foram usados de forma ilícita, sem autorização. "O senhor Marcelo Lara havia registrado na Junta Comercial uma empresa de nome 18K Ronaldinho Comércio e Participações Ltda. [...] Eu fui, em verdade, vítima dos senhores Rafael e Marcelo, ora investigados pelo Ministério Público e pela polícia. [Eles] utilizam o meu nome indevidamente, os senhores Rafael e Marcelo utilizaram a minha imagem captada para a promoção da linha de relógios indevidamente", argumentou o ex-atleta.
"Jamais foi contratada qualquer prestação de serviço [minha] à empresa 18k Ronaldinho Comércio e Participações Ltda, nunca foi autorizado que a empresa 18 Carro Ronaldinho Comércio e Participações Ltda utilizasse meu nome e a minha imagem, meu apelido na razão social da empresa, conforme já referido ao próprio Ministério Público de São Paulo e à Polícia Civil do Rio de Janeiro", disse Ronaldinho Gaúcho ao negar envolvimento em fraudes.
Ele informou aos parlamentares que os dois contratos foram rescindidos em outubro de 2019, logo que foi avisado pelo irmão Roberto de Assis sobre o suposto uso indevido de imagem. O ex-jogador garantiu, também, que as atividades previstas no contrato não foram executadas e que, até hoje, não entrou com qualquer ação judicial contra os proprietários da 18K Ronaldinho.
Contradições
A rescisão de contratos entre a 18K Ronaldinho e o ex-atleta ocorreu após o Ministério Público Federal apontar a empresa como sendo uma verdadeira pirâmide financeira. A própria CPI das Pirâmides Financeiras afirmou no requerimento de convocação dos irmãos Ronaldo e Roberto de Assis Moreira, que "a 18k adotava uma fachada ao comercializar relógios da 18k Watches como seu produto principal, embora, não fosse essa a atividade real do empreendimento."
O relator da CPI, deputado Ricardo Silva (PSD-RJ), desmentiu a versão apresentada por Ronaldinho Gaúcho e afirmou que ele não cessou as atividades ilícitas, como alegava, mesmo após o rompimento dos contratos, e faz uso de sua credibilidade e popularidade até os dias atuais para incentivar milhares de pessoas a investir em uma fraude que causou prejuízos a investidores.
"Em 2020, Ronaldinho se tornou réu em uma ação que pede R$ 300 milhões por prejuízos a investidores, em sua maioria pessoas simples e sem familiaridade com investimentos, seduzidas pela marca de um dos maiores jogadores de futebol da história do Brasil e do mundo", lamentou o relator da CPI.
Já o presidente da CPI, deputado Áureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) ressaltou a responsabilidade de influenciadores em tempos digitais. O parlamentar repudiou as celebridades que usam as próprias redes sociais e a credibilidade junto aos fãs para induzi-los a investir em empresas ilícitas, sem qualquer regulamentação no mercado. O parlamentar acrescentou que vários influenciadores não se preocupam com as consequências dos negócios anunciados. "O senhor Ronaldo está aqui por ter feito e continuar utilizando de sua credibilidade para levar milhares de brasileiros a investir suas economias, seus sonhos, seu patrimônio em uma empresa que prometia lucro fácil. Claramente, uma pirâmide financeira", argumentou.
Durante a maior parte do depoimento, Ronaldinho deixou de responder a questionamentos feitos por parlamentares ou afirmou desconhecer diversas situações. Ele esteve amparado por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que lhe garantiu o direito ao silêncio em relação a fatos que poderiam implicar sua autoincriminação. No mesmo habeas corpus, o ministro Edson Fachin também escreveu que o depoente não poderia sofrer constrangimentos físicos na sessão.
Outras ações
A CPI das Pirâmides Financeiras já aprovou a quebra de sigilo bancário dos atores Tatá Werneck e Cauã Reymond e do apresentador de TV Marcelo Tas. Os três foram convocados na CPI para prestar esclarecimentos sobre campanha publicitária para a Atlas Quantum, empresa do ramo de criptomoeda, mas era uma pirâmide que gerou prejuízo de R$ 7 bilhões aos investidores.
Porém, Tatá e Reymond foram dispensados de depor na condição de investigados, após conseguirem dois habeas corpus no STF, concedidos pelo ministro André Mendonça, no dia 14.
Entre outros casos investigados pela CPI por suspeitas de fraudes, está o da empresa 123Milhas, que, inicialmente, suspendeu o fornecimento de passagens da linha promocional e, depois, as viagens, e, no dia 29, pediu recuperação judicial.
A CPI remarcou os depoimentos dos sócios da 123Milhas, Ramiro Júlio Soares Madureira e Augusto Júlio Soares Madureira, para 6 de setembro. Os dois faltaram à sessão do colegiado na Câmara dos Deputados, na quarta-feira (30) e será expedida condução coercitiva, caso não compareçam à CPI. (Agência Brasil)