Cidadania é vacina no trânsito
Artigo escrito por Neto Mascellani
Apesar de, felizmente, a pandemia estar perdendo fôlego, ainda assim o País amarga milhares de casos de contaminação e centenas de óbitos.
Em dias como segunda-feira, quando todas as perdas não são contabilizadas no fim de semana, o consórcio de veículos da imprensa costuma divulgar em torno de 250 vítimas das variantes do Coronavírus.
Acredite se quiser, mas este número macabro chega a ser inferior ao que o Infosiga (sistema de dados gerenciado pelo programa Respeito à Vida) registrou de mortos no trânsito em noites de sábado e domingo no período de janeiro de 2019 a julho de 2021.
São 378 óbitos de condutores que perderam a vida com suspeita de embriaguez de um total de 892 mortes. Ou seja, 42% das ocorrências. Dessas vítimas 18% são motoristas de 18 a 24 anos. Não tem como se acostumar com essa tragédia urbana, embora esteja em curso hoje a banalização da morte.
Para se ter uma ideia da chaga social, o valor gasto ano a ano com internações relacionadas a acidentes de trânsito bate em torno de R$ 320 milhões por ano no Brasil e atinge um montante de R$ 70 milhões somente no Estado de São Paulo. Uma aberração!
A única vacina que efetivamente salva vidas -- tema desta Semana Nacional de Trânsito -- chama-se cidadania. O remédio milagroso não depende de IFA (insumo farmacêutico ativo) de laboratório de multinacional para imunizar a população. É o antídoto para dar um basta nesta assustadora escalada de óbitos.
Embora a educação para o trânsito não seja uma atribuição exclusiva dos Detrans, conforme dispõem os artigos 74 e seguintes do CTB, enquanto presidente do Detran-SP e da Associação Nacional dos Detrans (AND), tenho acompanhado o empenho dos meus pares em investir pesado em campanhas para formar o cidadão.
É um trabalho hercúleo, desde à infância, que visa habilitar condutores com o mínimo grau de cidadania no trânsito. O que se busca é uma formação mínima que comece nos bancos de sala de aula e transmita para as crianças a importância do respeito às leis.
Aqui em São Paulo, o Detran-SP renovou convênios com prefeituras em duas frentes: uma, em parceria com a Fundação Mapfre, com ações educativas para reduzir os índices de sinistros de trânsito; e outra ação com a Fundação Volkswagen, cujo objetivo é contribuir para solucionar desafios reais da mobilidade urbana.
Não se avança no trânsito seguro com um programa apenas e com ações isoladas, sem sinergia. É em regime de parceria, como a que é feita com a Polícia Militar há 30 anos com o premiado Clube do Bem-te-vi, que você começa a formar condutores responsáveis a partir do ensino fundamental.
São Paulo só registrou também uma queda de 32% nos óbitos em sinistros de trânsito na Década de Ação para Segurança no Trânsito 2010-2020 graças às ações do Respeito à Vida.
O tratamento para um trânsito ainda doente passa por educação e investimento, mas também por capacitação, sinalização e cidadania, acima de tudo. Temos avançado, mas ainda há um longo e sinuoso caminho a percorrer até a cura.
Neto Mascellani é diretor-presidente do Detran-SP e da Associação Nacional dos Detrans.