Seis de cada dez pessoas em situação de rua buscam vida melhor
Censo também mostra que 21,4% têm ensino médio completo, 15,3% concluíram o ensino fundamental e 4,2% concluíram o ensino superior
Júlio César Cardoso
Uma reportagem do “Fantástico” de 23 de janeiro abordou um problema que está nas ruas de todas as grandes cidades do País, mas que as autoridades e a mídia de modo geral parecem não enxergar: os moradores de rua, ou as “pessoas em situação de rua”, como quer o jargão sociológico.
A reportagem se restringiu a São Paulo, onde um novo Censo da População de Rua aponta que em dois anos esse contingente de desabrigados dobrou na maior cidade do País. São 32 mil pessoas nas ruas da capital paulista neste início de 2022. A maioria, homens, idade média de 41,7 anos e 70% pretos ou pardos. Em cada dez, apenas quatro são naturais da cidade, dois são de outras cidades do Estado os quatro restantes são de outros Estados. Ou seja, seis em cada dez moradores das ruas de São Paulo são pessoas que saíram de suas cidades em busca de vida melhor na capital paulista.
O censo da população de rua em São Paulo é feito periodicamente. O próximo seria em 2023, mas a prefeitura decidiu antecipá-lo diante de um cenário de urgência: o visível aumento do número de pessoas vivendo nas ruas da cidade. Em 2019 eram cerca de 24 mil pessoas, agora são quase 32 mil pessoas. Em dois anos, essa população cresceu 31%. Isso contando também quem pernoita em abrigos. Levando em consideração apenas os que ficam o tempo todo na rua, o aumento registrado pelo Censo é ainda maior: 54%.
O novo censo também mostra que 18 em cada 100 pessoas vivem há menos de um ano nas ruas. Outros dados: 93,5% das pessoas frequentaram escola; 92,9% sabem ler e escrever; 21,4% têm ensino médio completo; 15,3% concluíram o ensino fundamental; e 4,2% concluíram o ensino superior.
O primeiro levantamento foi feito em 2000. Na época, em cada 10 mil paulistanos, oito viviam nas ruas. Em pouco mais de duas décadas, a proporção saltou para 26 moradores de rua em cada 10 mil paulistanos.
Os movimentos e agentes sociais que dão assistência a essa população consideram os números do censo estão aquém da realidade. O padre Júlio Lancellotti, por exemplo, diz que muitos moradores de rua não são sequer localizados. “Não é só aquele que está na rua ou está no abrigo. Às vezes ele está em buracos, em lugares inacessíveis. E se você não tem contato com essas pessoas, você não é capaz de saber que elas existem”, afirma Júlio Lancellotti.
O problema social no País é muito grave. Mas pouca importância representa para a nossa classe política e governamental. Quanto se gasta para manter o paquiderme Congresso Nacional, inchado de políticos gastadores do dinheiro público? Quanto se gasta para manter também os legislativos e câmaras municipais? Todas essas instituições estão repletas de mordomias desnecessárias, cujos recursos fazem falta para minimizar a situação de pobreza.
Se não for a mídia fazer abordagem do problema, nenhum representante político e governamental sai do comodismo de seus gabinetes para tratar com seriedade a situação.
É inconcebível o que se gasta com a manutenção dos Três Poderes, enquanto a crise social continua desamparada. Veja, por exemplo, como o governo não está nem aí para crise social: autorizou que ministros e outros servidores viajem ao exterior em voo de classe executiva. Os demais governos federais também pouco se importaram com a vida dos infortunados brasileiros, senão o quadro da situação de pobreza brasileira não seria essa vergonha descarada.
Pelos salários e mordomias desfrutados por toda a classe política, esta deveria envergonhar-se ao se defrontar diuturnamente com tanta gente humilde vivendo em condições sub-humanas nas cercanias de nossas cidades. A despesa política é uma das causas da falta de recursos para o enfrentamento das necessidades sociais. Dinheiro público dos contribuintes existe, mas é consumido pela casta política brasileira, a qual entra para a política e não quer mais largar a boa vida dos gastos públicos. Não precisamos de tantos políticos, mas de políticos com qualidades.
Certa feita o jornal espanhol El País escreveu que ser político no Brasil é um grande negócio -- que não requer conhecimento algum e nem competência --, devido às grandes vantagens auferidas. E são tantas as mordomias e salários compensadores que o indivíduo chega a renunciar à sua própria profissão para labutar na “vida espinhosa” da política e depois não quer mais deixar as luzes da ribalta do poder.
Júlio César Cardoso é advogado e servidor federal aposentado