Restauração: Viollet-le-Duc x John Ruskin

Enquanto Viollet-le-Duc acolhia a intervenção na forma da restauração, John Ruskin não a acolhia e admitia apenas a conservação como método (ou providência) de preservação das obras

Por Cruzeiro do Sul

Marcelo Augusto Paiva Pereira.

Marcelo Augusto Paiva Pereira

A Europa do século XIX teve dois expoentes das doutrinas de restauração. Foram o francês Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc (1814 - 1879) e o inglês John Ruskin (1819 - 1900). Contemporâneos, tinham posições antagônicas quanto aos métodos de restauração dos bens culturais. Seguem abaixo comentários sobre ambos.

Viollet-le-Duc entendia, a restauração, um processo fundado na unidade estilística (formal) dos edifícios com o escopo de criar um modelo procedente da versão originária do estilo (pensamento pioneiro da obra).

Seu sistema teórico fundava-se nos elementos da forma (ou estilo), função e estrutura, a obter a coerência do conjunto arquitetônico. Admitia uma reformulação ideal, um tipo característico da obra. A ele devia haver uma unidade estilística que traria à tona o pensamento pioneiro fonte primeira da referida. Esta fonte era o fundamento da restauração.

A restauração deveria identificar o pensamento pioneiro da obra, os acréscimos e modificações tempestivas (readaptação e reformulação) e redesenha-la sem estas intervenções posteriores, a fim de obter a unidade estilística (reformulação ideal) da obra.

Após obtida, dever-se-ia distinguir o antigo do novo, fazer sobressair os sinais das intervenções e das partes substituídas por equivalentes de melhor material e por mais eficazes meios (clonagem de peças). Traria ao presente a obra como foi ou como poderia ter sido.

Este último efeito resultava da hipótese ou imaginação (às vezes fantasiosa), que retirava a autenticidade e causava o falso histórico. Acolheu o uso adequado da obra restaurada.

O inglês se opunha ao francês. John Ruskin defendia a preservação da integridade das obras no estado de conservação em que estivessem. Deveria haver o respeito absoluto à matéria original, sem nada remover.

A ele a restauração era intervenção que descaracterizava, retirava a autenticidade, porque o novo estado da obra pertencia a uma nova época. A restauração era imitação (réplica e falso histórico) da arquitetura passada e causava a falsa descrição do que a obra teria sido.

As obras arquitetônicas deveriam atravessar os séculos de modo intocado e submetidas ao envelhecimento próprio das suas destinações. São expressões fortes e duradouras, aptas a se eternizar e a carregar grandes valores históricos e culturais.

A conservação deveria ser o método de preservação às obras. Ele valorava a passividade (a não intervenção) e admitia o fim da existência da obra, conforme o estado de conservação.

Havia um dueto nostálgico-romântico pelas ruínas arquitetônicas, as quais testemunham a idade, o envelhecimento e a memória e nelas pode estar expressa a essência do monumento. Nelas protraem a dúvida do que se teria perdido e o mistério do que teriam sido.

Em suma, enquanto Viollet-le-Duc acolhia a intervenção na forma da restauração, John Ruskin não a acolhia e admitia apenas a conservação como método (ou providência) de preservação das obras. Ambos, porém, foram muito empíricos em suas doutrinas.

Na primeira metade do século XX, três italianos criaram outras doutrinas menos empíricas e mais científicas. Para o próximo artigo. Nada a mais.

Marcelo Augusto Paiva Pereira é arquiteto e urbanista