O sono dos justos
Com a mudança de paradigma, a vida urbana impôs transformações drásticas que alteraram a rotina dos cidadãos e, consequentemente, o sono da maioria também foi afetado
Você é do tipo bom de cama? Ou seja, deita e dorme? Se você consegue ter uma boa noite de sono, de forma ininterrupta, parabéns! Afinal, dormir bem, nos dias de hoje, tornou-se um grande desafio para a maioria dos sorocabanos, principalmente depois que inventaram o celular, já que todo mundo está 24 horas conectado às redes sociais.
Logo, ninguém prega os olhos porque as notificações não dão trégua. Basta aquele sinalzinho ser acionado, para que a persistente luzinha invada o aconchego do quarto. Com isso, os insones sofrem na pele, digo, na mente, as consequências da ausência do eficaz sono tranquilo. Quem não descansa o mínimo necessário está sujeito a inúmeros transtornos que serão focados ao longo deste texto.
Mas, esse problema não começou agora. Na verdade, o advento da famosa Revolução Industrial, no final do século 19, afetou a qualidade do repouso noturno dos operários. Isso piorou com a invenção do “terceiro turno”. Nele, o colaborador atravessa a madrugada na fábrica e tenta cochilar durante o dia. É óbvio que o sono diurno não se compara ao noturno. Afinal, os ruídos diurnos impossibilitam atingir o estado ideal de relaxamento mental.
Até o poeta parnasiano Olavo Bilac, em seus versos, já alertava para os riscos de ficar acordado por longas horas. Dizia o autor do Hino à Bandeira: “A escassez de luz favorece o sono”, para criticar a chegada da eletrificação urbana ao Rio de Janeiro. Ele temia que isso pudesse prejudicar a serenidade que reinava na vida dos cariocas. Não houve jeito, pois a força do progresso atropelou a calmaria.
Aliás, a partir da luz elétrica, as noites do Rio nunca mais foram as mesmas. Isso porque, com a chegada dos cafés, teatros, cabarés e boates, a pálida vida noturna de outrora ganhou agitação. Esse clima, em pouco tempo, espalhou-se por outras cidades brasileiras. Pronto! A paz noturna estava ameaçada definitivamente.
Pois, aliada à iluminação, surgia um dos maiores inimigos do sossego noturno: a poluição sonora. Ou seja, barulho provocado, ou pelas máquinas que atravessam noite, funcionando a todo vapor, ou pelo som altíssimo das baladas e pancadões que perturbam a vida de quem precisa e merece descansar. Isso, somado aos motores das motos com escapamentos abertos que riscam a noite em altas velocidades. Os que moram em avenidas enfrentam esse pesadelo sem trégua.
Todavia, antes da urbanização do País, a maioria da população se concentrava na zona rural, cuja simplicidade permitia uma vida sem estresse porque, como diziam os antigos, “as pessoas dormiam com as galinhas e acordavam com os galos”. Ou seja, aproveitavam mais os momentos de descanso, já que o breu dominava as noites. Então, a solução era se recolher mais cedo, já que não havia vida noturna nem lazer com o sentido que conhecemos atualmente.
Com a mudança de paradigma, a vida urbana impôs transformações drásticas que alteraram a rotina dos cidadãos e, consequentemente, o sono da maioria também foi afetado. Especialistas alertam que, neste século, as pessoas dormem menos do que necessitam para garantir uma vida saudável. O problema é que até crianças e adolescentes sofrem os efeitos dos distúrbios do sono que, por sua vez, geram graves problemas de saúde.
Estudiosos do assunto observam que, quando o sono é completo, nosso cérebro libera doses de serotonina e melatonina, hormônios que promovem o bem-estar da mente e do corpo. Há muitos benefícios nesse processo, tais como: melhora o ritmo cardíaco e influi no apetite e no humor. Também ajuda na preservação da memória, já que, durante a noite, o cérebro retém as informações necessárias.
Já a ausência de uma noite bem dormida pode gerar crises de ansiedade e depressão. Aliás, pesquisas investigam se a depressão, uma das piores doenças deste século, está ligada à ausência de uma boa noite de sono. Uma evidência é clara: precisamos dormir. Bom domingo!
João Alvarenga é professor de Redação