O real digital

O real digital poderá ser usado nas operações de pagamentos, transferências, investimentos, câmbio e formação de reservas de valo

Por Cruzeiro do Sul

 

O Banco Central (BC) começará ainda neste semestre o primeiro teste piloto do real digital, que deverá ser lançado no fim de 2024. O cronograma e requisitos básicos do piloto, que testará a estrutura básica de trocas de valores e protocolos de privacidade e segurança da rede em que o ativo vai operar, serão divulgados pelo regulador em março.

A criação dessa nova versão do real deverá ser uma das primeiras respostas incisivas dos bancos centrais -- e não só do Banco Central do Brasil -- à atuação agressiva dos emissores de criptomoedas (como o bitcoin e o ethereum), que ameaça tomar parcela relevante do mercado das moedas convencionais e leva o risco de prejudicar a política monetária (política de juros).

O real digital poderá ser usado nas operações de pagamentos, transferências, investimentos, câmbio e formação de reservas de valor. Utilizará a mesma tecnologia das criptomoedas, o blockchain, que armazenará todas as informações do sistema, mas em uma rede própria monitorada pelo BC -- que definirá também os agentes que poderão atuar nesse ambiente.

O coordenador do projeto do real digital no BC, Fábio Araújo, informa que o sistema garantirá a mesma qualidade de sigilo e proteção de que desfrutam hoje as operações do sistema financeiro. Uma das características das transações do real digital será a pseudoanonimização, em que os dados das operações poderão ser identificados por códigos não associados ao seu portador.

Mas ele admite que 100% de privacidade não é possível, porque sempre pode aparecer um algoritmo capaz de apropriar-se de informações sigilosas. Graças à maior flexibilidade e rapidez do sistema, o BC espera grande redução dos custos no sistema de pagamentos e de transferências, fator que deverá baixar substancialmente as taxas hoje cobradas pelos bancos.

A ideia é aumentar o número de agentes financeiros no sistema, e, nesse sentido, atuará como novo fator de concorrência para os bancos. Um dos efeitos da expansão do uso do real digital será a ampliação da inclusão social no setor financeiro. Fábio nega que o processo reduza a bancarização. Ao contrário, tenderá a aumentar o número de correntistas à medida que mais pessoas utilizarem o Pix e o real digital. Outra consequência será a redução da circulação de papel-moeda e moeda metálica, mas não a extinção, o que reduzirá os custos do sistema. Espera-se, também, que aumente a velocidade de circulação da moeda, o que, no entanto, não deverá ter nenhuma influência na condução da política de juros.

Quando se reuniram para examinar a proposta de lançamento de moedas digitais, os grandes bancos centrais pretendiam um sistema de uso limitado. Foram as autoridades do Banco Central do Brasil que os convenceram a ampliar suas atribuições para além do sistema de pagamentos e de transferências internacionais. Hoje o próprio Bank of International Setlements (BIS) recomenda a extensão do seu uso para outras operações, observa Araújo. (Com Pablo Santana)

Celso Ming é comentarista de economia