Filmes da Netflix: ‘Inspire expire’ e ‘Meu nome é Chihiro’ (parte 2 de 3)
Encerrei o artigo da semana passada citando o livro “Feminismo para os 99%”. Para compreender essa vertente feminista, é necessária uma brevíssima explanação sobre dois conceitos intimamente relacionados entre si: o de neoliberalismo e o de desigualdade socioeconômica.
Neoliberalismo: Recorrerei ao livro “A nova razão do mundo -- ensaio sobre a sociedade neoliberal” do filósofo Pierre Dardot e do sociólogo Christian Laval.
Os autores definem neoliberalismo como o conjunto de discursos, práticas e dispositivos que determinam um novo modo de governo dos homens segundo o princípio universal da concorrência. Os neoliberais consideram direitos trabalhistas como conquistas socialistas que emperram a economia e que os programas sociais, ao garantirem segurança econômica, desestimulariam o trabalho e a inovação; portanto, afetariam a produtividade e enfraqueceriam o país. Entendem que é preciso “reduzir os gastos governamentais; aumentar a taxa de juros; desregulamentar a economia; e instituir um sistema tributário regressivo”, ou seja, os ricos devem pagar menos impostos do que as demais classes econômicas. Impõe a competição generalizada, incluindo entre os sexos. Intima os assalariados e as populações a entrar em luta econômica uns contra os outros, cria justificativas para as desigualdades sociais cada vez mais profundas, muda a psicologia do indivíduo, que é instado a conceber a si mesmo e a comportar-se como uma empresa. Apresenta-se como embaixador da democracia, mas é individualista e dirige seus esforços no predomínio da competitividade e da lucratividade. Ele é essencialmente antidemocrático.
A crise de 2008 mostrou que o neoliberalismo quer privatização generalizada, propaga a ineficiência dos governos, mas recorre a eles para salvá-los com dinheiro público quando se tornam vítimas da sua própria patifaria. E enriquecem com as crises, como a da Covid 19.
Desigualdade socioeconômica: Na exposição que farei a seguir utilizo transcrições quase literais de trechos de “O Capital no século XXI” e de ‘Capital e ideologia” do prestigiado economista francês Thomas Piketty.
Desde os anos 1980-1990 vem sendo observado o aumento da desigualdade socioeconômica em quase todas as regiões do mundo. Ela é produto legítimo do neoliberalismo. Piketty mostra que, mesmo nos países desenvolvidos, a taxa de acumulação de renda é maior do que as taxas de crescimento econômico, ou seja, parte do crescimento econômico foi transferido dos mais pobres para os mais ricos. Em alguns casos, a desigualdade assumiu tamanhas proporções que tem sido cada vez mais difícil justificá-la em nome do interesse geral.
Há cinco ou seis décadas, a maior parte das mulheres desempenhava o papel de cuidadora do lar, enquanto os homens ganhavam o suficiente para o sustento da família. A educação dos filhos era dividida entre os esposos e a nação. A atribuição da autoridade familiar era dividida entre, de um lado, o Estado e os pais, e de outro, entre os pais e as mães. Muitas dessas mulheres agora são mães solo que foram abandonadas pelos companheiros e pelo Estado, têm de cuidar das tarefas domésticas e prover os recursos para o sustento do lar. Seu padrão de vida desmoronou e grande parte delas se juntou à enorme massa de miseráveis.
Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec