A narrativa e os preços da Petrobras
Embora não seja tão diferente, o novo arranjo aponta para alto grau de subjetividade
Nas batalhas de narrativas, nem sempre se afirma o contrário do que não se quer dizer. Pode ser a mesma coisa -- ou quase -- desde que não se repitam expressões malquistas ou politicamente pichadas.
No caso dos preços da Petrobras o que nem Lula, nem o PT raiz, nem os corporativistas do setor queriam ouvir é que os preços internos dos derivados seguissem a trajetória dos importados ou que a tal paridade internacional de preços tivesse de continuar. Mas poderia ser muito da mesma coisa, desde que se evitassem certas expressões.
No comunicado da nova política de preços da Petrobras não se viu nenhuma profissão de fé em tabelamentos, nem em subsídios ao consumidor, nem em fixação de preços em detrimento dos lucros da empresa, como tantos por aí defendiam.
A informação de que passaria a fixar seus preços com base no “custo alternativo do cliente e no valor marginal da Petrobras” é o que qualquer empresa tem em mente quando trata de precificar seus produtos ou serviços.
No caso da Petrobras, a questão técnica imediata é a de que em dois dos seus principais produtos, diesel e gasolina, o Brasil depende de importações (foram 4,5 milhões de metros cúbicos importados de janeiro a março de 2023) e terá de continuar a levar em conta os preços internacionais em dólares convertidos pelo câmbio da hora em reais. Boa parte do “abrasileiramento” prometido pelo presidente Lula tem a ver até que ponto a Petrobras pretende monopolizar também as importações e até que ponto terá condições logísticas para suprir os mercados hoje não atendidos por ela.
Embora não seja tão diferente, o novo arranjo aponta para alto grau de subjetividade. Os preços reais não seguirão mais regras claras e transparentes como as anteriores, que qualquer um poderia rastrear. Dependerão da decisão de apenas três pessoas: do presidente da Petrobras, do diretor de logística e do diretor financeiro.
Isso significa duas coisas. Primeira, o resultado final que terá impacto sobre os lucros e sobre a capacidade futura de investimento só ficará claro quando se conhecerem os critérios operacionais do que ficou definido. Quanto mais barato o petróleo em dólares, menos complicada será a definição do preço final. E, segunda, a nova estratégia operacional da Petrobras, como investimento e seu grau de agressividade na ocupação de segmentos do mercado hoje detidos por outras empresas, poderá ter impacto sobre a definição dos preços, que, além de tudo, poderão variar por região.
A percepção da hora é de que muda pouca coisa, com a diferença de que a tal narrativa poderá reduzir o nível de tensão política produzida não pelo critério que ficou para trás, mas pela escalada anterior dos preços.
Celso Ming é comentarista de economia