Educar a afetividade
Para educar a afetividade é necessário exprimir de maneira consciente e construtiva os sentimentos e as emoções
Para educar a afetividade é necessário primeiramente conhecer as emoções e os sentimentos.
Isso não é óbvio? Sim, mas infelizmente as coisas mais básicas parecem ser as que menos damos atenção. A todo o momento somos movidos pelos nossos sentimentos, mas não temos consciência disso, somos dominados por emoções que nos fazem agir impulsivamente e de maneira contraditória, ferindo pessoas e a nós mesmos. Não sabemos reconhecer os sentimentos alheios, nem acolher as emoções das pessoas com quem nos relacionamos.
Se não queremos continuar vivendo como “analfabetos emocionais”, é preciso aprender a dar nome às emoções para ter consciência delas. Conhecer os sentimentos e emoções, saber os seus nomes é um pressuposto necessário para conhecer a si mesmo e aos outros.
Em si mesmos os sentimentos não são nem bons nem maus. Por exemplo, a alegria, enquanto sentimento, não é boa nem má. A tristeza não é, em si mesma, boa ou má. É o que fazemos com tais sentimentos que determinam se eles são bons ou maus. Se eu me alegro com o sofrimento do outro, experimento uma alegria perversa. Se eu fico triste e com raiva, quando vejo uma injustiça cometida contra uma pessoa vulnerável, demonstro uma sadia reação emocional que está fundada em uma boa formação moral.
Para educar a afetividade é preciso integrar os sentimentos e emoções na prática do bem. Nesse sentido o Catecismo da Igreja Católica afirma de maneira tão acertada quanto clara: “As emoções e os sentimentos podem ser assumidos em virtudes ou pervertidos em vícios” (1768).
A afetividade educada é o que me permite conhecer e aceitar que tenha sentimentos de raiva, ódio, cólera, tristeza. Ela conduz tais emoções para o andar de cima (a vida do espírito, a consciência moral, a razão e a vontade). É nesse andar que se dá o discernimento das motivações dos sentimentos e no qual eles podem ser integrados na prática do bem.
Por fim, para educar a afetividade é necessário exprimir de maneira consciente e construtiva os sentimentos e as emoções. É a afetividade educada que conduz o que foi elaborado e integrado no andar de cima para o de baixo. Posso exprimir sentimentos de raiva ou de alegria, agora sim, de maneira moral, se estes foram integrados na virtude.
Foi uma afetividade educada o que permitiu que Jesus exprimisse toda a sua cólera de maneira justa quando expulsou os vendilhões do templo. Ele exprimiu sua indignação quando enfrentou a hipocrisia dos doutores da lei. Foi também uma afetividade educada que fez com que a sua misericórdia se exprimisse em gestos afetivos de compaixão, de tristeza e de alegria. “Em Cristo, os sentimentos humanos podem receber sua perfeição na caridade e na bem-aventurança divina” (Catecismo da Igreja Católica, 1769).
A plena realização da pessoa humana não consiste somente em que ela seja movida ao Reino de Deus unicamente por sua vontade, mas também por seus sentimentos e emoções.
Educar a afetividade consiste em alcançar de maneira prática o ideal que é expresso no salmo 84,3: “Meu coração e minha carne exultam pelo Deus vivo”.
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba