Equinos e asininos

Quando se fala em maus-tratos aos animais, poucos se atentam ao suplício que muitos cavalos são submetidos, em pleno século 21

Por Cruzeiro do Sul

 

A ideia deste artigo é recuperar um pouco da trajetória de uma das espécies mais sofridas da história da humanidade; mas que, nem sempre seu sofrimento é observado pela sociedade. Referimo-nos aos castigados equinos. Ou seja, dóceis criaturas que, embora sejam responsáveis pelo sucesso da evolução da nossa espécie, não têm, até hoje, o devido reconhecimento. E muito menos o respeito. No entanto, paradoxalmente, é inegável que sem a colaboração dos equinos não teríamos avançado tanto.

Porém, antes focar tal problemática, chamamos a atenção dos leitores para alguns aspectos preponderantes sobre o mundo dos bichos. Em primeiro lugar, é notório que, neste século, houve uma positiva mudança de paradigma no que tange à relação do ser humano e os animais domésticos. No passado, cães e gatos ficavam fora da casa. Muitos eram tratados como agregados ou meros ‘brinquedinhos’ das crianças.

Agora, tais espécies ganharam o ‘status’ de Pets e habitam o interior das residências. Em muitos casos, dormem nos quartos, junto com seus tutores. Ou seja, esses animais passaram de meros figurantes da cena doméstica para a posição de protagonistas. Pois, em muitos casos, são vistos como membros das famílias. Inclusive, a venda de rações e acessórios para os cães e gatos está em franca expansão. Aliás, esse setor tornou-se um ‘nicho’ de mercado que tem gerado lucros astronômicos. Também, sob o prisma do ‘amor aos bichos’, surgiu o ativismo animal para combater o uso de algumas espécies como cobaias em laboratórios de medicamentos e cosméticos.

Todavia, quando se fala em maus-tratos aos animais, poucos se atentam ao suplício que muitos cavalos são submetidos, em pleno século 21, principalmente no que tange ao uso de transporte com tração animal. Embora tal prática seja moralmente condenada pela sociedade, não existe, de fato, uma lei de abrangência nacional que proíba que cavalos, burros ou mulas puxem pesadas carroças, pelas ruas de muitas cidades.

Felizmente, em Sorocaba cuja história remete às feiras de muares tal cena é cada vez mais rara, pois desde 2007, por iniciativa da Câmara Municipal, o sistema de transporte, via tração animal, passou a ser crime. Mas, na região, há até denúncias de corridas de charretes. Nos rincões do país, o uso de burros e mulas em serviços pesados é visto com normalidade, afinal muitas famílias carentes precisam dessa ajuda adicional.

No entanto, em meio a essa polêmica, há os que defendam o uso de tais espécies, no chamado ‘transporte turístico’, por entenderem que isso não impõe tanto sacrifício ao bicho, além de gerar rendas. Assim, tais criaturas, durante uma longa jornada existencial, cumprem a dura sina de levar pesadas cargas sobre o lombo, seja para a obtenção de lucro ou para o lazer humano.

Porém, é inegável que o drama dos cavalos remonta o próprio itinerário do ser humano na conquista de territórios, com a formação de nações do mundo antigo. Afinal, sem a presença de potentes cavalarias, muitas guerras estariam perdidas. Nesse contexto, o Império Romano, sem seus cavalos, a 5ª Legião não teria se tornado a potência bélica da antiguidade. Infelizmente, muito sangue desses animais foi derramado, pois além do cavaleiro, o cavalo também tombava nos campos de batalha.

Além de ser usado como “arma de guerra”, o cavalo também sempre foi força de trabalho. E trabalho duro, na lavoura, pois antes da mecanização dos plantios, pesados arados eram puxados por cavalos e, em alguns casos, até por bois. Afinal, antigamente, as técnicas agrícolas eram rudimentares e, sem essa força extra, o resultado era pífio.

Portanto, devemos respeitar também os equinos, pois sempre estiveram presentes em vários contextos da nossa história. No esporte, estão presentes nas milionárias corridas de jóqueis, o hipismo e os controversos rodeios. Até a Medicina já comprovou que a equoterapia ajuda no tratamento de crianças com Transtorno do Espectro Autista.

João Alvarenga é professor de redação