Raposas no galinheiro
Arranjos tendem a produzir mais barafundas politiqueiras do que leis que beneficiem o País
O presidente Lula vem justificando os acordos com o Centrão e adjacências, que nada têm a ver com as diretrizes do PT, como necessidade de garantir governabilidade e aprovação de projetos de lei no Congresso.
É movimento que contraria setores do PT que vêm argumentando que isso equivale a trazer raposas para o galinheiro, na ilusão de que elas se disporão a cumprir as vontades do proprietário das galinhas.
É difícil imaginar, por exemplo, que o PP, partido que compõe o Centrão e a que pertence o novo titular dos Esportes, André Fufuca, comandará uma política mais eficaz para a área do que comandaria a ex-ministra Ana Moser, demitida sem muita finesse pelo presidente Lula. Ou, então, é difícil imaginar que a maior parte dos parlamentares do PP se prontifique agora a executar as partituras orquestradas pelo governo no Congresso e fora dele.
Nas democracias avançadas, sempre que está em minoria no Parlamento, o governo se vê obrigado a negociar programas de políticas públicas com outros partidos, para compartilhar o poder e assegurar a governabilidade. É assim que funciona.
No entanto, no Brasil, onde prevalecem aglomerados de políticos fisiológicos -- e não partidos comprometidos com o interesse público --, esses arranjos tendem a produzir mais barafundas politiqueiras do que leis que beneficiem o País.
O problema não é só de falta de uma reforma política que assegure um mínimo de racionalidade às relações de poder. É, no caso do governo Lula, também de falta de consistência dos seus programas.
Na semana que passou, ficou dito que o governo não sabe qual direção dar às questões de segurança pública. Na Bahia, onde o PT já perfaz 16 anos de comando da Força Pública, a atuação do crime organizado e as chacinas têm aumentado.
O PT quer o voto dos evangélicos, mas não tolera as posições deles em relação a direitos das minorias, questões de gênero e descriminalização do aborto. Quer atrair apoiadores do ex-presidente Bolsonaro, mas estranha quando votam contra em política trabalhista e de empresas estatais.
O presidente Lula tenta compensar estas e outras contradições com uma política externa megalonanica, pretensamente promotora da paz global, mas esbarra na falta de compreensão da natureza dos conflitos que prevalecem no mundo.
A política ambiental está imersa em falatórios e falta de ação, em boa parte porque setores importantes do PT ainda entendem que programas de preservação do meio ambiente não passam de pauta neocolonialista dos países ricos que até recentemente usaram o ar e a água como cloaca do mundo e agora querem impor políticas irrealistas de descarbonização a países emergentes.
Enfim, não dá para garantir que o aliciamento de políticos clientelistas e oportunistas os leve a deixar de votar nos seus próprios interesses, e não no que pretende o governo.
Celso Ming é comentarista de economia