As consequências do vandalismo

Ações dessa natureza não se restringem apenas aos bens patrimoniais, pois atingem até mesmo equipamentos de uso coletivo que são disponibilizados à população

Por Cruzeiro do Sul

 

Neste artigo, vamos tentar entender o que se passa na cabeça de quem danifica bens públicos, como aconteceu recentemente na zona norte de Sorocaba, onde um ônibus foi incendiado. A ideia é não julgar, muito menos justificar ações que a sociedade abomina, pois contrariam a condição intrínseca à nossa espécie: a capacidade de pensar antes de agir. Algo que, em tese, evitaria atitudes animalescas ou mesmo grandes tragédias motivadas por supostos direitos que nem mesmo encontram amparo legal.

Porém, antes de qualquer análise, é mister perceber que “vandalismo”, etimologicamente, tem sua origem em “vândalos” -- vocábulo que denominava um povo bárbaro germânico que, durante o século 5º, devastou a Andaluzia, no sul da Espanha. Uma explicação: os romanos rotulavam de “bárbaro” todo aquele que não falasse latim ou estivesse além das fronteiras do Império; por outro lado, os gregos empregavam tal termo para designar alguém de cultura inferior.

Assim, não é à toa que a Gramática Normativa Brasileira (NGB), dentro do capítulo “Vícios de Linguagem”, emprega a expressão “barbarismo” para indicar que houve um erro grosseiro, algo que contraria os princípios da norma culta da língua, tanto na fala quanto na escrita. Como exemplo temos a popular palavra “mortadela” que, equivocadamente, muitos pronunciam “mortandela”.

Na verdade, há outros tantos casos semelhantes que merecem uma análise mais aprofundada, mas desviaria, aqui, o foco do nosso assunto, já que mais do que ferir regras de etiquetas do idioma, os bárbaros de hoje, por onde passam, deixam um rastro de destruição. De forma metafórica, podemos dizer que tais indivíduos, quando agem dessa maneira, declaram “guerra” à sociedade.

Mas, quanto ao uso corriqueiro do adjetivo “vândalo” nos dias de hoje? Por que há esse emprego? Culturalmente, tornou-se usual, na sociedade, para identificar alguém que, deliberadamente, depreda patrimônios públicos, rouba placas de bronze de monumentos ou picha paredes de prédios históricos. Ou seja, trata-se do indivíduo que destrói ou danifica bens públicos, objetos valiosos ou históricos. Todavia, por extensão, ações dessa natureza não se restringem apenas aos bens patrimoniais, pois atingem até mesmo equipamentos de uso coletivo que são disponibilizados à população.

No tempo em que os telefones públicos eram colocados em várias partes da cidade, para a que população pudesse se comunicar -- já que as linhas fixas eram caríssimas - constantemente os famosos orelhões sofriam verdadeiros “atentados terroristas”. Geralmente, os ataques criminosos aconteciam na calada da noite e, no dia seguinte, o humilde serviçal amanhecia estatelado no solo. Por mais que o governo fizesse campanhas para preservar a dignidade dos aparelhos, nada sensibilizava os cruéis “assassinos”.

Os orelhões se foram, no entanto, uma brincadeira perigosa ainda persiste em Sorocaba. Talvez, o leitor tenha observado que, em alguns bairros de nossa cidade, há uma prática estranha que não só enfeia a paisagem urbana como coloca em risco a vida das pessoas. Trata-se o péssimo hábito de descartar pares de tênis velhos nos fios da rede elétrica. Como fazem? Simples: usam os próprios cadarços para arramar os tênis e, depois, arremessam-nos na fiação.

Muitos indagam: por que agem assim? Será que há um motivo que justifique destruir bens públicos a bel prazer? Nada justifica tais ações, nem a título de protesto. Afinal, um ônibus incendiado é um ônibus a menos na linha. Ou seja, os passageiros terão mais dificuldades para chegar aos seus compromissos. Os bens disponibilizados aos cidadãos são de todos. Logo, não pertencem a ninguém, pois é um bem comum.

Então, por que praticam tais ações? Quiçá, Simão Bacamarte, personagem de “O alienista”, de Machado de Assis, tenha a resposta. Há quem diga que lhes falte o sentimento de pertencimento ou, então, só querem chamar a atenção. Talvez, falte empatia. Bom domingo!

João Alvarenga é professor de redação