Filmes do Youtube: ‘Dinner for few’ (‘Jantar para poucos’)

Por Cruzeiro do Sul

O filme trata da ganância dos detentores do poder econômico

Esta animação de 2014, do grego Nassos Vakalis, com 10 minutos de duração, concentra toda a condição das relações sociais que envolvem o mundo contemporâneo sob a governança do neoliberalismo econômico.

Vakalis afirmou que o filme foi feito sob o impacto da crise financeira de 2008 na Grécia. Vários filmes foram produzidos analisando a crise de 2008, como, por exemplo, o excelente documentário “Trabalho interno”. A crise evidenciou que os defensores ardentes do neoliberalismo querem privatização generalizada, propagam a ineficiência dos governos, mas, quando se tornam vítimas da sua própria velhacaria, exigem que os mesmos governos os salvem com dinheiro público. Com isso, saem ilesos e transferem os danos das crises para o resto da população. A Islândia foi o único país a meter na cadeia os executivos responsáveis pelos estragos financeiros da crise.

Talvez “Dinner for few” seja especificamente significativo para o espectador grego. Mas, ainda assim, pode ser analisado nesta coluna, porque é uma alegoria que trata do tema universal dos efeitos do neoliberalismo: seu fortalecimento nas crises (como ocorreu depois de 2008 e na pandemia da Covid 19, por exemplo), a extrema desigualdade social entre os países e dentro de cada país, a ganância patológica dos detentores do poder econômico, que quanto mais têm mais querem ter.

Há quatro décadas o neoliberalismo promete uma prosperidade que nunca chega. Essa condição está sintetizada em uma frase do famoso dramaturgo e poeta alemão Bertholt Brecht que abre o filme: “Those who eat their fill speak to the hungry of wonderful times to come” (literalmente: “aqueles que comem até se fartar falam aos famintos de tempos maravilhosos que virão”).

A animação se inicia e se encerra com uma terrível tormenta -- tida na Bíblia como metáfora da cólera divina. Somos então conduzidos a um hotel parcialmente em ruínas, dentro do qual transcorre um jantar de porcos. Cada porco representa uma parcela do poder político: magnata do petróleo, líder religioso, banqueiro, juiz etc. Estão presos por uma corrente que os interliga, constituindo assim um sistema sólido e interligado de poder. Os gatos, que representam a população, se movem em torno da mesa e miam desesperados pedindo comida. Um gato ousa entrar sob a mesa e é tragado pela corrente que une os porcos e que se transforma em uma cobra enorme para protegê-los frente à ameaça do faminto.

Quando a comida começa a faltar, os porcos exigem comida, e os gatos miam mais e mais, chegando a subir na mesa, desesperados. Entre esses gatos surge um tigre ameaçador que liquida os porcos e “assume o poder”.

A única figura representativa da espécie humana é um operário corpulento que prepara a comida dos porcos em uma máquina que desprende fumaça negra poluente. Ele transforma objetos comuns em comida. Sua ação é uma representação da devastação dos recursos da Terra para alimentar glutões financeiros insaciáveis. É esse representante do proletariado, que garante a continuidade da comilança. O operariado foi beneficiado com as políticas sociais que lhe garantiu os direitos trabalhistas. Agora foi cooptado pelo neoliberalismo que condena as políticas sociais, taxando-as de “esquerdistas”.

O curta-metragem tem muito mais para ser apreciado. Sirvam-se!

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

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