Filmes da Netflix: ‘Jogo justo’ (parte 2 de 6)

Por Cruzeiro do Sul

Margareth Thatcher foi primeira-ministra do Reino Unido

Encerrei o artigo da semana passada escrevendo que grande parte dos super-ricos é composta de especuladores financeiros. O capitalismo que vigorava até o surgimento do neoliberalismo na década de 1980 era mais direcionado aos investimentos produtivos e, com isso, os pobres se beneficiaram pela geração de empregos. A redução de empregos na sociedade contemporânea se deve à conjugação das diretrizes neoliberais com outros fatores, notadamente a inteligência artificial.

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O neoliberalismo, em seus fundamentos, leva os indivíduos a se comportarem como empresários de si próprios. Tal transformação foi assinalada pela primeira-ministra do Reino Unido, Margareth Thatcher, tida como iniciadora e defensora incondicional do liberalismo, na entrevista ao Sunday Times de 01 de maio de 1981.

“O que me irritou sobre toda a direção da política nos últimos 30 anos é que sempre foi para a sociedade coletivista. As pessoas se esqueceram da sociedade pessoal (...) eu realmente decidi mudar a abordagem, e mudar a economia é o meio de mudar essa abordagem. Se você mudar a abordagem, você realmente está atrás do coração e da alma da nação. A economia é o método; o objetivo é mudar o coração e a alma”.

Escrevem Dardot e Laval sobre essa transformação da subjetividade dos indivíduos nas sociedades neoliberais defendida por Thatcher:

“O neoliberalismo produz certos tipos de relações sociais, certas maneiras de viver, certas subjetividades. Em outras palavras, com o neoliberalismo, o que está em jogo é nada mais nada menos do que a forma de nossa existência, isto é, a forma como somos levados a nos comportar, a nos relacionar com os outros e com nós mesmos. O neoliberalismo define certa norma de vida nas sociedades (...) Essa norma impõe a cada um de nós que vivamos num universo de competição generalizada, intima os assalariados e as populações a entrar em luta econômica uns contra os outros, ordena as relações sociais segundo o modelo do mercado, obriga a justificar desigualdades cada vez mais profundas, muda até o indivíduo, que é instado a conceber a si mesmo e a comportar-se como uma empresa. Há quase um terço de século, essa norma de vida rege as políticas públicas, comanda as relações econômicas mundiais, transforma a sociedade, remodela a subjetividade”.

O neoliberalismo opera no sentido do egoísmo social, da negação da solidariedade e da redistribuição. Ele pode levar a movimentos reacionários ou até mesmo neofascistas e neonazistas, como os que vemos pelo mundo. Como consequência, ocorre uma tendência antidemocrática na política. “O sistema neoliberal está nos fazendo entrar na era pós-democrática”, afirmam Dardot e Laval.

Uma colocação interessante sobre os efeitos psicológicos do neoliberalismo pode ser visto em uma entrevista da Psicanalista Ingrid Geromilich, no site do Youtuve, https://www.youtube.com/watch?v=GyUO5VzIHX0&list=WL&index=3&ab_channel=InstitutoConhecimentoLiberta. Sugiro ao leitor que assista ao vídeo da entrevista. Nela, Geromilich fala do estresse, da depressão, cuja propagação na contemporaneidade está intimamente relacionada à necessidade, na sociedade neoliberal, de produzir cada vez mais, de desempenhar cada vez melhor Para sobreviver a essa realidade sufocante, um número crescente de indivíduos recorre a medicamentos.

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec

nildo.maximo@hotmail.com