Trinta anos de Plano Real
Os compradores já podiam comparar os preços, a corrida de gato e rato com os remarcadores quase desapareceu
No último dia 27, o Plano Real completou 30 anos. Começou no dia 1º de março com a Unidade Real de Valor (URV), uma quase moeda que valia 647,50 cruzeiros reais, a moeda titular de então, e que preparou a entrada da nova moeda, o real.
Salários, aposentadorias e contratos foram convertidos imediatamente em URVs. O primeiro objetivo foi pulverizar a chamada inflação inercial. Quatro meses depois, quando todos os preços estavam alinhados entre si, a URV deu lugar ao real.
Essa engenharia monetária foi planejada pelos economistas André Lara Resende e Pérsio Arida e, por isso, foi chamada Plano Larida.
A inflação, que rodava nos 3 mil por cento ao ano, despencou. Como até então os preços mudavam todos os dias, os consumidores haviam perdido a memória de quanto custavam as coisas e só lhes restava a saída de comprar antes que seu salário desvalorizasse mais e os preços disparassem ainda mais.
A partir do real, os compradores já podiam comparar os preços, a corrida de gato e rato com os remarcadores quase desapareceu e houve grande alívio entre a população.
A URV e o real não se limitaram a ser extraordinária sacada técnica, o único plano de estabilização bem-sucedido depois de seis tentativas fracassadas. Foi uma grande proeza política, com importantes consequências, que tem um nome: Fernando Henrique Cardoso (FHC), à época ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, que reuniu uma equipe econômica de notáveis.
Itamar chegou a demonstrar certo ciúme quando o sucesso do Plano Real foi mais creditado a FHC do que a ele. Mas acabou por reconhecer os méritos do seu ministro e trabalhou para fazê-lo seu sucessor.
O PT que, na ocasião, contava com emplacar seu presidente Lula da Silva na Presidência da República, fez de tudo para desdenhar o Plano Real entre a população e o eleitor. Seus dirigentes proclamavam que não passava de golpe tecnocrático que viraria fumaça em questão de meses. O então assessor especial para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, com um linguajar não condizente com sua função, chegou a afirmar que o Plano Real “não passa de um Rolex produzido no Paraguai”.
Mas o povo adorou o real e consagrou com o voto um político que, até então, era considerado um intelectual, mas desconhecido pelo grande público.
As consequências econômicas vieram em seguida. A estabilização da moeda abriu espaço para que os demais fundamentos da economia obtivessem equacionamento necessário, a começar da questão fiscal e da enorme crise da dívida externa. A política de juros foi submetida a metas de inflação. Hoje, apesar dos problemas que ainda existem, o Brasil luta para que a inflação se enquadre na meta de 3% em 12 meses. Enquanto isso, os hermanos da Argentina batalham com uma inflação que hoje está em 254% ao ano.
Celso Ming é comentarista de economia