Uma saudosa estrada de ferro
A edição de 9 de março deste jornal publicou matéria sobre a publicação da lei municipal que transformou em patrimônio cultural material o conjunto de edifícios da Estrada de Ferro Sorocabana (E.F.S.). Seguem abaixo alguns comentários.
Remonta a meados do século XIX a implantação das primeiras linhas de trem no nosso País, das quais fazem parte o ramal paulista para escoar a produção de café até o porto de Santos. Muitas cidades surgiram ao lado das linhas de trem e a população desenvolveu diversas atividades, várias delas vinculadas às ferrovias.
Sorocaba faz parte da história da industrialização do Brasil, na medida da importância que teve a E.F.S. para expandir a economia da cidade e região. Depois, porém, que a indústria automobilística se instalou em fins da década de 50 do século XX, as ferrovias perderam a importância dos serviços de transporte, principalmente de passageiros, com o consequente sucateamento.
A memória de quem viveu aquela época continua a reverberar pelos familiares e pelo que restou da aludida ferrovia, deixada ao abandono. Se assim permanecer, Sorocaba perderá parte significativa da própria história porque naquele espaço urbano surgirá uma lacuna que não mais se preencherá nem continuará o trajeto histórico, político e cultural do município dado pela ferrovia.
Na arquitetura e urbanismo, diversas obras e cidades surgiram ao longo do tempo e a ele tem resistido com maior ou menor conservação, as quais são monumentos ou documentos que trazem o passado até nós e nos levam de volta a ele.
Pelos seus componentes entramos em espaços deixados para trás, ao mesmo tempo em que vem até nós na configuração dada pela atualização, conservação ou modificação de cada obra. Ciências, costumes, crenças, mitos, política e religião de épocas passadas repercutem da razão da existência de cada e na dimensão entre tempo e espaço, pelas quais aludidas obras devem ser em relação ao tempo e estar em relação ao espaço.
Ser e estar numa delas podem significar o resgate psicológico ou afetivo de uma pessoa, em que ela faz uma viagem no tempo e resgata a própria origem (ser) enquanto se identifica com o espaço (estar). É uma relação pela qual se incorpora no ambiente e o vivencia como se retroagisse aos primórdios daquela obra ou da própria origem genealógica.
Conclusivamente, uma saudosa estrada de ferro se relaciona na existência de cada edifício, em que cada um poderá ser transformado pela variação do tempo no espaço e a alteração deste no tempo, enquanto a cultura da sociedade requalifica os usos ou finalidades deles; mas, não devem deixar de ser o que foram. A razão e a dimensão que os transformam para o que são (ou foram) e estão (ou estiveram) não desaparecem. Nada a mais.