Pedagogia versus andragogia
Desde que o mundo é mundo, de um ou mais pontos de partida, as sociedades têm trabalhado na classificação das coisas. Isso é feito para tudo, como se fosse possível limitar a complexidade do mundo em simples divisões ou classificações. Esse quadradismo social, científico, entre outros, considerando a existência de exceções necessárias, inclusivas, etc., é muito ruim. Segrega, exclui, generaliza, desrespeita, enfim.
Na ciência e na educação essa dinâmica está revestida de um propósito maior que é o de facilitar a aquisição de saberes. Eu defendo que esse fracionamento do aprendizado facilita mesmo é o ensino, mas isso é bom para ambos os lados. Porém, no contraponto do que escrevi, esse fracionamento pode ser um fator limitante para a compreensão da complexidade, da abrangência e da integração dos saberes neste mundo.
Fizeram caber a educação no que conhecemos por pedagogia e andragogia ou foi a pedagogia que se fez organizar na educação que conhecemos? Duas divisões que carregam a complexidade do mundo da educação nas costas e que não se limitam a estudar somente o valor etimológico de cada palavra, ou seja, a educação de crianças e de adultos. Essa limitação não seria possível. A educação é uma ciência em movimento e diretamente dependente da variabilidade de seus interlocutores.
O fato é que se de um lado temos as crianças e do outro os adultos. O que temos no abismo que separa esses dois mundos? A adolescência e a juventude são períodos muito complexos e únicos e, ainda que a andragogia evidencie a educação de adolescentes, jovens e adultos, para além do fator adicional que é o mundo digital que vivemos, adolescentes e jovens aprendem e possuem necessidades diferentes de crianças e adultos.
Enquanto educador da área da saúde e limitado aos saberes que possuo, tenho identificado que muito do que vejo em meus adolescentes e jovens em sala de aula possui embasamento neurocientífico e precisa ser levado em consideração no processo de ensino e aprendizagem; muito mais que isso, precisa ser levado em consideração para a preservação da saúde mental de estudantes e professores.
Professores da educação superior precisam calibrar as suas expectativas e compreender a complexidade de seus interlocutores, que são principalmente adolescentes e jovens. Segundo a neurociência, na adolescência, uma região do encéfalo chamada córtex pré-frontal ainda está em desenvolvimento e estará madura, em média, somente aos 25 anos de idade. Obviamente existem exceções para mais e menos tempo.
O fato é que o córtex pré-frontal é a área do cérebro que gerencia as emoções e atitudes como a empatia, otimismo, tolerância, controle e impulsividade, motivação e recompensas, iniciativa etc., e no mundo da educação por competências, trabalhar o domínio sócio afetivo, para além de contribuir no desenvolvimento cognitivo e psicomotor de estudantes e profissionais, é um fator protetor para a vida.
No relatório sobre as competências socioemocionais de estudantes de 10 a 15 anos de idade publicado em 2022 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi evidenciado que o ambiente escolar competitivo e a exigência intensa de pais e professores influenciam os níveis de estresse, ansiedade e insatisfação com a vida, e destaco que adolescentes e jovens ainda não estão preparados para lidar sozinhos com isso.
O relatório também revelou que jovens de 15 anos, independentemente do sexo ou histórico socioeconômico, possuem competências mais baixas do que os de 10 anos, com as diferenças sendo particularmente pronunciadas em casos de habilidades como otimismo, confiança, entusiasmo e iniciativa social. Essas ausências podem impactar o convívio em sala de aula e a efetividade do processo de ensino e aprendizagem.
Por fim, parafraseado o relatório, competências socioemocionais são bons preditores de resultados educacionais, de trabalho e sociais e desempenham papel importante no desenvolvimento de competências. É preciso compreender nossos interlocutores para que possamos calibrar nossas ações, potencializar o processo de ensino e aprendizado e prezar pela saúde mental de estudantes e professores.
Éric Diego Barioni (eric.barioni@prof.uniso.br) é professor doutor na Universidade de Sorocaba (Uniso), conselheiro e presidente da Comissão de Toxicologia no Conselho Regional de Biomedicina da 1ª Região (CRBM-1)