Uma cidade do futuro
Foi noticiado pelos telejornais de 20 de junho que se encontra em trâmite na Câmara Legislativa do Distrito Federal um projeto de lei que pretende alterar o zoneamento e o gabarito do plano urbano de Brasília, com o objetivo de favorecer a construção de edifícios de alturas e finalidades em desacordo com o gabarito e o zoneamento originais da mencionada capital federal. Seguem abaixo alguns comentários.
Brasília resultou de um concurso público em que participaram vários arquitetos e urbanistas, dos quais sete projetos foram finalistas e o vencedor foi o de Lúcio Costa, com o desenho de um projeto urbanístico distribuído em dois eixos em forma de cruz ou pássaro.
Conhecido por Plano Piloto, assim o é por ser o plano antecedente ou de suporte ao ulterior desenvolvimento dele. Foi concebido pelo mencionado arquiteto sob influência do arquiteto franco-suíço Le Corbusier, que também tinha propostas urbanísticas modernistas.
Para esse arquiteto, as cidades deviam ser construídas para a velocidade, desenvolver-se de acordo com o progresso em voga e abrir ruas e avenidas largas com traçados regulares, desenhadas para a funcionalidade urbana. Em 1925 apresentou o Plano Voisin, cuja execução deveria destruir o centro de Paris e reconstruí-lo com traçados urbanos retilíneos e edifícios grandiosos.
Oscar Niemeyer foi o arquiteto que desenhou os edifícios que compuseram o conjunto urbano e o “skyline” de Brasília, com formas definidas em obediência aos critérios pensados pelo aludido arquiteto franco-suíço para as obras arquitetônicas (os cinco princípios do modernismo) e urbanísticas (distribuição das funções).
Em evidência no Brasil desde 1930 (quando Getúlio Vargas assumiu a presidência da República), tanto o Plano Piloto quanto os edifícios construídos foram fundamentados na escola modernista, da qual dois dos ramos foram a arquitetura e as cidades futuristas (manifestos de 1909 e 1914).
Inaugurada aos 21 de abril de 1960, Brasília foi alçada em 1987 a Patrimônio Mundial pela Unesco, devido às características únicas que a configuram desde a concepção do Plano Piloto. Em 1990 foi inscrita no Livro do Tombo Histórico pelo Iphan.
Brasília foi a consolidação e consagração do modernismo em nosso País e no mundo, desde o projeto urbanístico até os edifícios, desenhados criteriosamente para a cidade ser funcional, de acordo com as finalidades de cada trecho daquele projeto e construída com vistas a ser uma cidade do futuro.
Conclusivamente, o referido projeto de lei, se sancionado e tornado lei, porá fim às características que fizeram (e ainda fazem) da cidade de Brasília um conjunto arquitetônico e urbanístico único no mundo e dela extinguirá o futuro desenhado e consolidado em cada edifício, transformados em símbolos da modernidade em que ainda vivemos e do futuro que ainda almejamos. Nada a mais.
Marcelo Augusto Paiva Pereira é arquiteto e urbanista