Novos Céus e Nova Terra
Com o gênero humano, o universo será transformado e alcançará a sua perfeição definitiva. O ser humano, segundo a doutrina cristã, é a única criatura que Deus desejou por si mesma (cf. GS 24); as outras criaturas foram queridas em função do ser humano. Por isso, o destino final do Cosmos deve ser visto em íntima relação com o do ser humano.
Somente quando ele alcançar o seu destino final em Cristo é que também o universo chegará à sua plenitude.
O conjunto da humanidade e do Cosmos transformados e glorificados em Cristo constitui os “novos céus e a nova terra”. Significa simultaneamente o pleno domínio de Cristo ressuscitado sobre todas as coisas, pois nada foge ao seu poder salvador. Será a plena identidade entre a obra da criação e da salvação, que se cumprirá quando tudo for recapitulado em Cristo (cf. Ef 1,10). Com essa recapitulação se cumprirá o desígnio
divino anterior à criação do mundo (cf. Ef 1,4ss). Os “novos céus e a nova terra” são a Jerusalém celeste que se caracteriza sobretudo pela presença de Deus (cf. Ap 21): nela Deus habitará com os homens. O céu consiste exatamente nessa comunhão da pessoa humana com Deus. Isso inclui o desaparecimento de todo sofrimento e dor, porque o Senhor enxugará toda lágrima de nossos olhos.
A Jerusalém celeste consiste também na unidade de todo o gênero humano. Com efeito, a Igreja é agora o sacramento, ou seja, o sinal e o instrumento dessa unidade (LG 1), que na consumação escatológica será plena e perfeita. A perfeita harmonia entre os seres humanos será a consequência da comunhão com Deus que é fonte de felicidade e de paz e de comunhão entre nós. Assim a relação com Deus perfeitamente alcançada torna possível a perfeita relação entre os homens entre si e com o Cosmos.
Há uma real comunhão de destinos do mundo e do homem. É o que descreve Rm 8,19-23 que fala sobre a futura transformação cósmica em relação com a glorificação do ser humano e com a manifestação da plena liberdade dos filhos de Deus. O pecado, pervertendo a relação do ser humano com Deus, alterou a relação com o Cosmos. Por isso a criação está submetida à mesma escravidão em que o homem caiu. A transformação do Cosmos é, em última análise, um elemento a mais do pleno domínio de Cristo ressuscitado sobre toda a criação, da salvação e da redenção de tudo. Estando o ser humano inserido no Cosmos, sendo também as realidades materiais chamadas à perfeição, compreende-se que esta plenitude não pode ser alcançada sem um universo transformado.
A ressurreição, como participação na glorificação de Jesus, não significa que o homem se converterá em um ser “acósmico”. Exatamente o contrário. Tudo isso reaviva o senso de responsabilidade que a humanidade tem pelo mundo presente e que Deus lhe confiou.
A preocupação ecológica do cristão não se restringe ao limite do tempo; expande-se até a dimensão da eternidade. Essa esperança é o conteúdo da expressão “novos céus e nova terra”.
Não é possível descrever o mundo que esperamos, porque ultrapassa a nossa imaginação e as nossas capacidades. O que não pode diminuir, porém, é a certeza de fé e a esperança na nova morada que o Senhor nos prepara.
O mundo que esperamos é dom de Deus, mas não deixa de ser fruto da resposta humana a essa graça. Por isso a esperança na nova terra não diminui o nosso empenho por esta terra, pelo contrário, o intensifica. Na esperança cristã, os nossos esforços são radicalmente salvos da transitoriedade que caracterizam a condição presente em que vivemos. O que fazemos neste mundo transitório em vista do bem dos irmãos adquire umvalor e um peso de eternidade.
É verdade que precisamos sempre distinguir entre o progresso terrestre e o Reino de Deus. O progresso terrestre, porém, enquanto contribui para o melhoramento integral e humano da sociedade, não é indiferente ao Reino que nós esperamos. Deus, de fato, não quer destruir o nosso esforço nem os seus frutos. Ele quer transformá-los exatamente porque quer transformar o mundo, no qual está inserida a ação do homem.
Assim encontraremos nos “novos céus e na nova terra” tudo o que verdadeiramente colaborou com o desígnio de Deus. Tudo será purificado, transformado e transfigurado em Cristo. Nenhum esforço e iniciativa, realizados segundo a vontade de Deus, se perderá. Toda obra em vista do Reino, toda ação e trabalho realizados em obediência ao Espírito farão parte dos “novos céus e da nova terra”.
Essa é a vida eterna que esperamos.
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba.