A era da informação é também a da desinformação

Por

Thífani Postali

A internet trouxe uma forma de comunicação mais democrática, pois permitiu que não só as grandes instituições disseminassem conteúdos, mas qualquer pessoa que tivesse acesso à rede.

A troca de informações se intensificou com as redes sociais digitais, que possibilitaram o compartilhamento de informações de maneira mais efetiva, já que, nelas, as pessoas possuem um catálogo de contatos mais próximos de seus comportamentos.

A comunicação se democratizou, mas também trouxe problemas sociais. A internet deu voz a diferentes indivíduos, oferecendo mecanismos de proximidade. Isso quer dizer que pessoas com diferentes intenções e graus de conhecimento dividem o mesmo ambiente. Nesse ponto, poderíamos imaginar que ela traria mais troca de conhecimentos e valores, no entanto, vemos o aumento da crença e compartilhamento de informações falsas e prejudiciais à organização social.

O sociólogo espanhol Manuel Castells diz que o mundo vive um momento de “ataque à razão e de posições irracionais contra a ciência”. E essa postura é resultado de uma educação que não está bem estruturada. De nada adianta estarmos na era da informação se não temos a capacidade de processar e deliberar sobre os conteúdos recebidos.

Essa colocação vai ao encontro de Edgar Morin, para quem o planeta é uma espaçonave cujos quatro motores essenciais (economia, ciência, tecnologia e política) estão danificados, pois tentam funcionar sem um estar ligado ao outro. Para ele, essa desconexão é consequência da educação que não desempenha um papel eficaz, desde a educação que se dá entre pais e filhos, recheadas de brigas, às formais e inúmeras guerras internas e externas.

Para Morin, o objetivo da educação é ensinar valores, a compreensão sobre si, sobre os Outros e as coisas do mundo. Ao contrário, o sistema atual fragmenta a realidade, simplifica o complexo, separa o inseparável, ignorando as relações que são fundamentais para o funcionamento dos motores da nave.

A desconexão abre campo para o ataque à razão, promovendo a disseminação de informações falsas, nosso atual cenário. Então, vemos afirmações de que a terra é plana, as vacinas são prejudiciais etc. Como essas afirmações são passíveis de ganhar força justamente na era da informação?

Além da crise educacional, Castells chama a atenção para o fato de sermos seres emocionais, antes de racionais. Para ele, a matriz do comportamento é emocional e, só depois, utilizamos a nossa capacidade racional para pensar sobre o que queremos.

Assim, as pessoas não leem jornais ou veem o noticiário para se informar, mas para se confirmar. Por isso, buscam fontes que concordam com as suas visões de mundo, mesmo que essas não sejam verossímeis. E isso está relacionado a um comportamento emocional e não racional.

Castells nos permite entender porque pessoas compartilham conteúdos oriundos de sites não confiáveis, mesmo quando são alertadas sobre a fonte duvidosa. Será que queremos realmente saber se o que compartilhamos é fato? Ou apenas desejamos nos confirmar?

Vivemos também em um momento em que a desinformação está sendo promovida, propositalmente, por inteligências que influenciam pessoas desinformadas ou ideologicamente favoráveis ao conteúdo, por meio de mecanismos de comunicação já utilizados em outros momentos. Eram os cartazes ideológicos, o cinema, o rádio e a televisão; hoje, são conteúdos digitais distribuídos por robôs e sistemas de algoritmos que encontram o público potencial.

E em um momento no qual aumenta a descrença sobre pontos já resolvidos pela ciência, a partir de inúmeros cientistas de diferentes áreas e períodos históricos, cabe a reflexão: que peças nós somos diante dos motores da espaçonave terra? O que fazemos para contribuir para o bom funcionamento da sociedade? A comunicação é fundamental para a organização social.

Thífani Postali é doutoranda em Multimeios pela Unicamp e mestra em Comunicação e Cultura pela Uniso. É professora da Uniso e membro dos grupos de pesquisas MidCid e Nami. Blog: www.thifanipostali.com