A origem do universo

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Crédito da foto: PXHere

Dom Julio Endi Akamine

Qual é a origem do universo? Como ele se formou? De onde o universo provém? Essas perguntas não são somente objeto das ciências, mas também da filosofia e da fé. Com efeito, o conhecimento da origem do universo não está somente ligado aos tempos e aos modos (como e quando surgiu?) de sua origem, mas sobretudo ao seu sentido e finalidade (por que e para que o universo existe?).

Os cristãos respondem à questão da origem do universo (seu sentido e finalidade) com uma confissão de fé: “Creio em Deus Pai todo-poderoso, Criador do céu e da terra”. Que significado tem essa confissão? O que muda no nosso modo de ver o mundo, confessar que Deus é o Criador? Tem isso alguma influência na vida das pessoas e no modo como a sociedade se organiza?

Na Bíblia, há um termo hebraico (“bará”) que exprime a ação criadora cujo único sujeito é Deus. Criar é, nesse sentido, a ação própria e exclusiva de Deus. Criar significa: fazer a partir do nada, chamar à existência, formar um ser do nada, produzir algo não de coisas preexistentes.

Enquanto criador, Deus está de certo modo “fora” da criação (ou seja, é transcendente a ela), e a criação está “fora” de Deus (porque não é Deus e não se confunde com Ele) e, por isso, possui uma consistência própria e uma relativa autonomia doada.

Qual é o sentido da criação? Deus criou o mundo por amor, porque quis comunicar à criação a sua bondade, a sua verdade, a sua beleza e a sua felicidade. Criando todos os seres do nada, Ele os chamou a participar de Suas perfeições divinas em medida diversa e conforme o lugar que os diversos seres ocupam na hierarquia dos seres.

Crer que Deus criou o mundo é ter uma visão positiva da realidade material. Com efeito, é notável o otimismo da fé na criação: Deus cria todas as coisas porque as ama e as ordenou em uma graduação que vai do mais ínfimo até o mais elevado dos bens.

Não existe nada que não participe, em seu modo e grau, do Sumo Bem que é Deus. Por isso a cada criatura lhe compete um lugar correspondente na hierarquia dos seres e, consequentemente, em tudo há um grau de bondade que varia de acordo com o lugar que o Criador assinalou em tal hierarquia.

O mundo não tem origem do caos nem do acaso. Crer no Criador significa afirmar que o mundo é fruto de uma decisão de amor. Há, portanto, uma opção livre que se expressa na palavra divina criadora. O universo assim não apareceu como resultado de uma onipotência arbitrária, de uma demonstração de força ou de um desejo de autoafirmação. A criação pertence à ordem do amor.

Quando nós confessamos: “creio em Deus Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra”, queremos dizer que o amor de Deus é a razão fundamental de toda a criação. Cada criatura é objeto da ternura do Pai que lhe atribui um lugar no mundo. Até a vida mais efêmera é objeto do amor de Deus. Mesmo nos poucos segundos de existência dessa vida limitada, Deus o envolve com o seu carinho. A criação está cheia de palavras de amor do Criador (Papa Francisco, Laudato sì, 77).

Ao mesmo tempo, é preciso advertir que essa participação gradual das criaturas de Deus coloca a possibilidade de a criatura humana e angélica se distanciarem da plenitude do ser, passando a um nível inferior que lhe conviria por criação, sem, contudo, sair totalmente da bondade do Criador. Assim o pecado não tem o poder de destruir totalmente a obra de Deus.

Certamente, pelo seu pecado, o homem se separou de Deus, mas não colocou fim ao amor que Deus tinha por ele, pois este amor precede a criação e subsiste a todas as revoltas. Em seu amor imutável, Deus ama aquilo que é sua obra e odeia o pecado, que Ele não fez. Se Ele tivesse odiado algo, não teria criado porque não seria objeto de sua vontade. Nada poderia subsistir se o Onipotente não tivesse chamado à existência. Nem mesmo o pecador existiria se nele não subsistisse algo que Deus pudesse amar.

Com efeito, sempre devemos distinguir entre a criatura como obra de Deus e o pecado como fruto de uma escolha errada. Deus não odeia nada daquilo que criou, mas como autor da natureza, não do pecado, odeia o mal que Ele não criou. À diferença do maniqueísmo, a doutrina católica não separa bondade e onipotência divinas. Deus é bom e onipotente de tal modo que pode tirar proveito também do mal que Ele permite e condena. Ele é o autor do bem que tira do mal, seja sanando com a misericórdia, seja fazendo-o servir aos seus planos.

Por causa de seu poder, Deus pode fazer o que quer, mas tal liberdade corresponde ao seu amor, ou melhor, a vontade de Deus se compreende pelo seu amor. Vontade e bondade se interpenetram, se completam, animadas pela superabundância do amor divino. Por esse motivo as criaturas são produto de um puro dom.

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo da Arquidiocese Metropolitana de Sorocaba. E-mail: arcebispo@arquidiocesesorocaba.org.br