Combater o terrorismo
Julio Endi Akamine
Os atentados terroristas nos obrigam a refletir sobre como reagir ao terrorismo. A posição da Igreja Católica em relação ao terrorismo é clara e pública. Ela decorre tanto do quinto mandamento da Lei de Deus quanto do Evangelho de Jesus.
O preceito do decálogo, “não matarás” (Ex 20,13), recebeu de Jesus uma profundidade, uma extensão e uma exigência ainda maior quando, no sermão da Montanha, ele afirmou: “Ouvistes o que foi dito: ‘Não cometerás homicídio! Quem cometer homicídio deverá responder no tribunal’. Ora, eu vos digo: todo aquele que tratar seu irmão com raiva deverá responder ao tribunal” (Mt 5,21-22).
A partir disso, a Igreja condena explicitamente toda forma de atentado à vida humana. A sacralidade da vida nada tem a ver com o tabu: não se trata da imposição ou atribuição externa e artificial de um respeito exagerado, de um medo injustificado e sem motivo. A vida é sagrada porque desde a sua origem ela está relacionada com Deus: a vida tem dentro de si uma relação especial com o Criador da vida.
Ninguém se dá a vida a si mesmo: ela é recebida. Recebemo-la dos nossos pais, deste mundo que nos fornece todos os dias alimento, bebida e ar. A fonte da vida não está dentro nós: nós a recebemos! A partir desse fato tão elementar e evidente, descobrimos que recebemos a vida do Criador. No fim e no alto da longa cadeia de dom e de oferta de vida, está o Criador. Por isso, Ele é “o dono da vida do começo ao fim da vida; ninguém, em nenhuma circunstância, pode reivindicar para si o direito de destruir diretamente um ser humano inocente” (CatIgCat 2258).
A partir do reconhecimento da sacralidade da vida, a Igreja Católica indica quatro ações concretas para responder ao terrorismo.
1. Temos o direito de nos defender do terrorismo. Tal direito não pode, todavia, ser exercido sem o respeito aos preceitos morais e jurídicos, aos diretos da pessoa humana e aos princípios do Estado de Direito. Mesmo que o terrorista realize um ato condenável, isso não autoriza que, na defesa contra ele, nós usemos dos mesmos meios desumanos. Sem esse respeito, a defesa se degenera em vingança e violência.
2. É preciso identificar os culpados pelos atos de terrorismo. Para que a identificação não se degrade em caça indiscriminada, tal identificação deve ser suficiente e devidamente provada, pois a responsabilidade penal é sempre pessoal. A responsabilização não pode ser estendida e generalizada às religiões, às nações, às etnias a que pertençam o terrorista. O fato de um terrorista ser motivado por uma ideologia fanática de caráter religioso não deve nos levar a considerar nem a tratar todos os pertencentes da mesma religião como terroristas.
3. O combate ao terrorismo exige a colaboração internacional para desbaratar e impedir as ações terroristas. Essa colaboração internacional não se deve somente ao fato de que o terrorismo se articula internacionalmente, mas sobretudo de que atinge a humanidade e os povos como um todo. Por ser um atentado contra a dignidade humana, toda a humanidade é ferida. Mesmo que o terrorismo estivesse circunscrito a um só lugar, toda a humanidade seria atingida por ele.
4. A colaboração internacional não se esgota em operações punitivas e repressivas. É imprescindível que esse recurso à força repressiva e punitiva seja acompanhada por um estudo corajoso e lúcido das motivações subjacentes aos ataques terroristas. Combater as causas que podem motivar e fazer crescer o terrorismo exige um esforço político e pedagógico decidido para resolver os problemas e as situações dramáticas que fomentam o terrorismo. É bem sabido que o recrutamento de terroristas é mais fácil em contextos sociais onde os direitos são espezinhados e as injustiças são longamente toleradas.
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba.