‘Contra toda esperança’ no Cine Reflexão

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Depois de um casamento feliz, Réjeanne passa a viver uma tragédia moderna. Crédito da foto: Divulgação

Depois de um casamento feliz, Réjeanne passa a viver uma tragédia moderna. Crédito da foto: Divulgação

Nildo Benedetti - nildo.maximo@hotmail.com

Bernard Émond é um diretor, roteirista e romancista canadense nascido em 1951 em Montreal. Estudou antropologia e dedicou-se inicialmente à criação de documentários de televisão.

Émond se confessa agnóstico, ou seja, partidário da doutrina que considera que as questões propostas pela metafísica ou pela religião -- a existência de Deus, o sentido da vida e do universo etc. -- são inacessíveis à compreensão do ser humano. Sua trilogia, contudo, trata das três virtudes teologais: fé, esperança e caridade. “Contra toda esperança” é a segunda parte dessa trilogia e foi dirigida em 2007.

Quando o filme principia, Réjeanne, uma operadora de telefonia, está em estado de choque em uma delegacia e mantém silêncio absoluto. Não consegue explicar à polícia a presença do sangue do seu marido Gilles nas sua roupa, no seu rosto e mãos. Gilles fora assassinado com um rifle, ela foi presa portando a arma e, por isso, é acusada de ser a homicida.

Um delegado investiga o caso, ao mesmo tempo em que o filme nos mostra em flashbacks a vida pregressa do casal. Saberemos então que Réjeanne e Gilles haviam comprado uma casa à beira de um lago, eram felizes, apaixonados, mas Gilles sofreu um AVC e ficara parcialmente paralisado. Por isso, perdera o emprego. Ela também é demitida do emprego porque a empresa operadora canadense de telefonia em que trabalhava foi vendida a uma multinacional norte-americana. O novo acionista, que tem brevíssimo mas marcante papel no filme, é o protótipo do indivíduo ávido por lucro, insensível às desgraças que provoca em milhares de funcionários e suas famílias. À adversa situação econômica, Réjeanne adiciona a necessidade de sustentar o casamento e o amor por Gilles.

Raymond Williams, no seu livro “A tragédia moderna”, afirma que a tragédia grega estava vinculada aos sofrimentos de indivíduos reinantes, de homens de posição social elevada e o destino desses homens é o destino do reino que eles dirigem e incorporam. A literatura especializada muitas vezes divide as tragédias gregas sob dois critérios. Existem tragédias sociais, em que homens são arruinados pelo poder, pela fome, em que civilizações combatem e são destruídas ou se destroem internamente. Por outro lado, existem tragédias pessoais; nestas, seres humanos, em seus relacionamentos íntimos, sofrem e fazem outros seres humanos sofrerem. Williams contesta a divisão entre as experiências humanas nas categorias social e pessoal formulada pela literatura por considerá-la ideológica, porque tragédias sociais e tragédias pessoais na modernidade estão intimamente vinculadas.

O caso de Réjeanne e Gilles é o de uma tragédia moderna, como definida por Williams. É uma entre a infinidade de outras tragédias que se abatem sobre pessoas comuns e são provocadas por situações social, política e econômica atuais. Por essa razão, interpretar “Contra toda esperança” apenas como um drama familiar esconde seu conteúdo profundo, o da descrição de um contexto social que provocou uma tragédia familiar.

Serviço

Cine Reflexão

Contra toda esperança, de Bernard Émond

Hoje, às 19h

Sala Fundec (rua Brigadeiro Tobias, 73)

Entrada gratuita