Reforma tributária de volta ao limbo
Ao contrário da expectativa geral, o que se engendra são mais tapa-buracos, novos remendos na imensa colcha de retalhos
Discutida há pelo menos 30 anos, a reforma tributária está novamente relegada ao limbo neste 2022. Ou seja, foi empurrada para o fim da imensa fila de prioridades do Congresso Nacional.
Nos discursos politiqueiros de praxe, mantém o status de requisito elementar à modernização da economia brasileira; na prática, mais uma vez, está sucumbindo à campanha eleitoral de novembro. Enquanto isso, a classe produtiva e os trabalhadores do País, aqueles que pagam a conta -- e o pato -- precisarão de muita criatividade, jogo de cintura e resiliência para continuar ampliando o repertório de dribles necessários, por exemplo, para superar a escaladas de preços da energia elétrica e dos combustíveis derivados de petróleo.
Representantes dos setores da indústria, comércio, agricultura, pecuária e transportes, entre outros, estão cansados de repetir que o País precisa urgentemente de um sistema tributário que, se não ajudar, pelo menos, não os atrapalhe.
O sonho de todos aqueles que investem, criam empregos, exportam, pagam impostos e fazem a roda da economia girar é serem regulados por um sistema menos burocrático e mais simples e barato.
Evidentemente, que essas melhorias precisam vir desacompanhadas de aumento da carga tributária.
Ao contrário da expectativa geral, no entanto, o que se engendra são mais tapa-buracos, novos remendos na imensa colcha de retalhos que deveria regular ao invés de penalizar. Uma dessas aberrações é o Projeto de Lei 1.472/2021, que pretende criar um programa de estabilização do preço do petróleo e derivados.
A ideia é amortecer os impactos dos aumentos do custo do barril e conter a alta nos valores dos combustíveis. A iniciativa propõe como fonte de recursos um novo imposto sobre as exportações do petróleo bruto. A receita advinda dessa cobrança seria usada para subsidiar a estabilização dos preços internos quando os valores do produto subirem.
Não é preciso ter um bola de cristal para prever que, em algum momento não muito distante, as exportações brasileiras de óleo cru serão prejudicadas por conta da perda de competitividade. E o vilão será justamente o novo imposto.
Imbróglio semelhante envolve a explosão dos preços nas bombas de combustíveis. Além do componente cambial, o encarecimento de quase 80% em 2021 foi insuflado também pelo Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), a cargo dos Estados.
O fim do rápido congelamento -- apenas dois meses -- do tributo, anunciado para 31 deste mês, promete reacender a quebra de braço entre o governo federal e os mandatários estaduais em torno das reais causas da crise.
No rastro dessa polêmica retorna à baila mais um “frankenstein legislativo”, o Projeto de Lei Complementar 11/2020 -- já aprovado na Câmara e agora sob análise do Senado --, que torna fixo o ICMS sobre combustíveis pelo período de um ano, com base no valor médio dos dois últimos anos.
O fim do congelamento do ICMS decreta a volta da regra anterior. De acordo com essa metodologia, a base de cálculo do imposto é estimada a partir de preços médios ponderados ao consumidor final, calculados a cada 15 dias pelos governos estaduais. No caso da gasolina, a alíquota de ICMS varia de 25% a 34%, de acordo com o Estado, sobre esse preço médio ponderado.
Empresários e trabalhadores já associam essa tábua de salvação a um certo subsídio ao consumo de energia elétrica concedido pela ex-presidente Dilma Rousseff em 2013. Como um bumerangue maligno, o “benefício” retornou ao bolso dos consumidores quatro anos depois, na forma de aumento das tarifas para repor os R$ 62,2 bilhões de alegados prejuízos sofridos pelas concessionárias enquanto o valor das contas chegou com descontos. Desde 2015, a conta de luz dos brasileiros subiu mais do que o dobro da inflação.
Dados da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abracel) apontam que a tarifa residencial acumula alta de 114% ante 48% de inflação no mesmo período, uma diferença de 137%. Além das correções anuais nas tarifas, os últimos anos têm sido marcados pela criação de novos encargos -- incluindo impostos -- e custos diretamente repassados para os consumidores.
Os fatos aqui expostos são apenas alguns dos inúmeros efeitos danosos resultantes da política tributária arcaica, inconsequente e escorchante praticada no Brasil. Por si só, já seriam suficientes para levar o Congresso Nacional, as assembleias legislativas e o Poder Executivo Federal e dos Estados a se unirem na busca de normas capazes de colocar o País no caminho do desenvolvimento. Afinal, todos sairiam lucrando. A pergunta que resta é: por que isso não acontece?