Vândalos disfarçados de torcedores
Jogo entre Palmeiras e Santos na Copa Votorantim de Futebol Sub-15 foi mais um péssimo exemplo de torcedores brigões
Há mais de duas décadas, a Copa Votorantim de Futebol Sub-15 -- que nasceu com o nome de Copa Brasil de Futebol Infantil -- abre o calendário esportivo da região com um torneio essencialmente familiar, no qual a população se reúne nas arquibancadas do Estádio Municipal Domênico Paolo Metidieri para ver os primeiros passos das futuras gerações do futebol brasileiro.
A lista de talentos que dela surgiram é imensa: tem Denílson, Robinho, Jô, Alex, Renato Augusto, Rafael Cabral, Neymar, Gabigol, Vinícius Júnior, Rodrygo, Lucas Paquetá e Alisson, entre outros. É uma oportunidade de ouro para que os moradores da região possam ver, em ação, as categorias de base dos grandes clubes do País. E foi num embate entre dois gigantes do futebol brasileiro, Palmeiras e Santos, na última terça-feira (18), que um problema muito sério aconteceu.
Toda a festa programada para a primeira rodada das quartas de final foi estragada por um confronto entre brigões que, escondidos sob as camisas dos dois times, começaram a se provocar antes mesmo do apito inicial, nos arredores do estádio. Comerciantes tiveram de baixar as portas com medo de quebra-quebra.
Já dentro do Domênico, integrantes da torcida organizada Mancha Verde, do Palmeiras, tentaram invadir o espaço designado à Sangue Jovem, do Santos, e para isso forçaram e derrubaram um portão à beira do gramado.
Torcedores de Votorantim, que aguardavam o início do jogo seguinte, contra o Avaí, e estavam ali pacificamente, assistiram a tudo horrorizados. Muitos deixaram o local enquanto a Polícia Militar controlava a situação. O jogo foi paralisado pelo árbitro, que dispensou as equipes e decretou a vitória santista por 2 a 1.
Nas redondezas do estádio, a Polícia localizou um veículo estacionado que continha seis barras de ferro, quatro pedaços de madeira e rojões. Ao delegado, os responsáveis, com camisas do Santos, afirmaram que seriam para “defesa” contra a torcida adversária, do Palmeiras, e acabaram liberados juntamente do automóvel. Os itens de guerra foram apreendidos.
O mais irônico é que, na véspera do jogo, representantes da Secretaria de Esportes, da Secretaria de Mobilidade Urbana de Votorantim, da segurança do estádio, da Guarda Civil Municipal, do 40º Batalhão da Polícia Militar e da Sangue Jovem haviam se reunido para alinhar a entrada e saída das organizadas a fim de evitar qualquer tipo de confronto ou provocação.
Conforme a assessoria de imprensa da Prefeitura de Votorantim, representantes da Mancha Verde haviam sido convidados, mas não participaram.
Além de dobrar a segurança no Estádio Municipal Domênico Paolo Metidieri e reforçar a estrutura vandalizada, a Secretaria de Esportes de Votorantim informou que apresentará à Federação Paulista de Futebol (FPF) as imagens dos atos realizados pela Mancha Verde e registrará boletim de ocorrência na Polícia Civil por dano ao patrimônio público.
As ações estão sujeitas, ainda, ao enquadramento dos autores em artigo do Estatuto do Torcedor (lei 10.671/2003): “Promover tumulto, praticar ou incitar a violência, ou invadir local restrito aos competidores em eventos esportivos”, cuja pena é reclusão de um a dois anos e multa.
Identificar os brigões e puni-los como determina a lei é essencial para que tais cenas não se repitam. Mais que uma nova geração no futebol, esses garotos na faixa etária de 15 anos também serão os cidadãos de amanhã.
Em nome de todos nós, mas principalmente deles, é preciso impor o exemplo, reforçando o dever de cumprimento das leis, e assegurando a aplicação efetiva dos dispositivos legais como forma de combater os atos de transgressão.
Alguns defendem a ideia da torcida única como uma solução para o confronto de torcidas, ou a suspensão sumária das organizadas -- cujo caso mais famoso decorre, inclusive, de uma competição de base, a Supercopa São Paulo de Juniores, em 1995, que terminou em uma batalha campal entre integrantes da Mancha Verde e da Independente Tricolor, com o saldo de 102 feridos e uma morte --, mas que acaba punindo, na verdade, um grande contingente de pessoas que não pratica violência. O ponto a ser atacado, portanto, chama-se impunidade.