Arrecadar bem e gastar com responsabilidade
Há décadas o Estado luta para criar uma consciência de educação tributária na população
Termina nesta sexta-feira (15), o prazo para os consumidores cadastrados no programa Nota Fiscal Paulista resgatarem os créditos que foram liberados em abril de 2021. Quase R$ 14 milhões estão disponíveis para os contribuintes que informaram o número do CPF na hora de efetuar compras tanto em lojas físicas como pela internet. Os valores que não forem solicitados voltam para os cofres do Governo do Estado.
Não é a primeira vez que milhares de consumidores deixam de receber uma bolada como essa. Em outubro de 2021, por causa de uma mudança na lei que criou o programa, o sistema cancelou os créditos de 48 milhões de brasileiros. O dinheiro estava liberado fazia mais de um ano. O valor devolvido para o tesouro estadual ficou próximo de R$ 1 bilhão.
O desinteresse pelo programa Nota Fiscal Paulista se acentuou durante os anos. Quando foi lançado, em 2007, oferecia sorteios com prêmios bastante chamativos. E muita gente aderiu. A arrecadação do Estado melhorou com a redução da sonegação fiscal. O consumidor passou a exigir as notas e os vendedores tinham que declarar tudo que comercializavam ao fisco. Só que o próprio governo passou a negligenciar o programa. Foi cortando benefícios e o público deixou de participar.
Não foi a primeira vez que isso aconteceu. Há décadas o Estado luta para criar uma consciência de educação tributária na população. E isso vale para os dois lados do balcão.
Em São Paulo, as primeiras ações, de que se tem notícia, que visavam despertar o interesse da sociedade nas formas de arrecadação tributária tiveram início na década de 1950. Na época foram produzidas várias campanhas audiovisuais contra a sonegação. Mas foi nos anos de 1960 que surgiu a primeira campanha mais abrangente, o Talão da Fortuna.
O Talão da Fortuna era um concurso que incentivava os cidadãos a solicitar o documento fiscal no ato da compra. Eles eram convidados também a denunciar as infrações fiscais cometidas por comerciantes. A participação era premiada em dinheiro, tanto de forma direta, como nos casos de denúncia, quanto de modo indireto, por meio de cupons que davam direito a concorrer a sorteios. Com o fim do Imposto sobre Vendas e Consignações (IVC)) e a introdução do Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) o Talão da Fortuna foi abandonado.
Na década de 1980, a Secretaria da Fazenda de São Paulo decidiu promover uma nova campanha de arrecadação. Lançou um álbum de figurinhas chamado “A Turma do Paulistinha”. O concurso era destinado ao público infantil e consistia na troca de documentos fiscais por figurinhas e álbuns e com distribuição de prêmios. Mediante a apresentação do álbum totalmente preenchido e de figurinhas carimbadas, o concorrente recebia um cupom numerado com o qual participava do sorteio de prêmios em mercadoria pela extração da Loteria Federal. Mais de 50 mil prêmios foram distribuídos.
O programa foi um sucesso. A criançada ficava o dia na rua caçando notas fiscais. Filas e mais filas se formavam nos postos de troca. Eram horas de esforço para a checagem das notas, a soma dos valores e a entrega dos envelopes. Em muitas cidades, os lotes de figurinha se esgotavam em poucas horas. E a decepção era grande. Aos poucos o programa também foi sendo desativado. E ficou só na memória afetiva de quem viveu aquela época.
A relação entre o Estado e a sociedade, com o passar dos anos, foi sempre pautada pelo conflito entre a necessidade de financiamento das atividades e serviços públicos e a obrigação da população em pagar tributos. Esse dilema fica mais intenso cada vez que o povo se sente enganado com o mau uso dos recursos e com o aumento das denúncias de corrupção nas mais diversas esferas do governo.
É função de cada cidadão ajudar no combate à sonegação fiscal, mas é dever do Estado usar bem e de forma justa o dinheiro suado pago pela população.
Enquanto não vivemos nesse mundo ideal, vale a pena dar uma checada no site do programa Nota Fiscal Paulista para ver se há algum dinheirinho a nossa disposição.