A força das ‘tias do Zap‘ na defesa da liberdade
Mudar as regras eleitorais fora do prazo estabelecido pela lei pouco contribui para a lisura do processo
A pressão da sociedade começou a fazer efeito no posicionamento dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Depois de uma série de atitudes consideradas por muitos como antidemocráticas, algumas decisões foram revistas e o presidente do órgão, ministro Alexandre de Moraes, percebeu que é hora de deixar de lado toda sua empáfia e voltar a dialogar com os coordenadores dos dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições presidenciais.
A decisão de censurar órgãos de imprensa, influenciadores digitais e até de barrar o lançamento de um filme sobre a facada contra o presidente Bolsonaro na campanha de 2018, mexeu com o brio de milhões de pessoas. Entidades ligadas ao jornalismo protestaram, deputados foram à tribuna do Congresso para denunciar os abusos, jornalistas usaram todos os meios possíveis para anunciar aos quatro cantos as pressões que estavam recebendo na hora de exercer a profissão. A grita foi geral.
Aqui na região de Sorocaba, como apurou o jornal Cruzeiro do Sul em reportagem publicada ontem (21), todos os parlamentares eleitos e reeleitos foram unânimes em condenar a censura arbitrária promovida pelos ministros do TSE.
Ontem, em São Paulo, o candidato ao governo do Estado Tarcísio de Freitas (Republicanos) comentou as recentes decisões tomadas pelo tribunal. Segundo ele, é preciso “ter muito cuidado para não cruzar a fronteira” da liberdade. O ex-ministro do governo Bolsonaro reforçou que não é possível “permitir censura em nenhum grau”.
“A gente tem que tomar muito cuidado para não cruzar a fronteira, a gente tem que ter muito cuidado para preservar nossa liberdade. É uma coisa muito cara, a gente não pode transigir com a liberdade, a gente não pode transigir com a liberdade de imprensa, a gente não pode permitir censura em nenhum grau, acho que é isso que todo mundo lutou sempre”, afirmou Tarcísio a um grupo de jornalistas.
A pressão contra o TSE aumentou depois que a Corte aprovou, na quinta-feira, 20, uma resolução que amplia os poderes do colegiado para determinar a remoção de notícias que considerar falsas e acelerar o prazo para que a ordem seja cumprida.
Em um dos trechos mais polêmicos, o texto aprovado permite à Corte ordenar a exclusão de conteúdos já classificados pelos ministros como fake news que tenham sido replicados em outras redes sociais sem abertura de um novo processo. Além disso, canais que, na avaliação da Corte, divulgarem sistematicamente desinformação poderão ser temporariamente suspensos.
Mudar as regras eleitorais fora do prazo estabelecido pela lei pouco contribui para a lisura do processo. Não se pode usar uma medida ilegal para justificar a tomada de uma decisão, em tese, emergencial. Ainda mais considerando que, em alguns casos, a definição do que é ou não fake news é muito subjetiva, variando da cabeça de cada um que toma a decisão. O processo eleitoral brasileiro não pode ficar subjugado por ideologias ou pensamentos deste ou daquele ministro.
Uma decisão importante para reestabelecer, em parte, o equilíbrio do processo eleitoral foi tomada na noite de quinta-feira pela ministra do TSE Maria Claudia Bucchianieri. Ela decidiu acolher os recursos apresentados pela campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL) e suspendeu os direitos de resposta que haviam sido concedidos ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Se a decisão tivesse sido mantida liminarmente, o presidente Bolsonaro, numa caneta só, teria perdido 164 inserções de 30 segundos no horário eleitoral gratuito. Isso feriria de morte a campanha do atual presidente sem que houvesse tempo para correções caso fosse comprovado erro da justiça.
Como a decisão anterior perdeu efeito, Bolsonaro vai poder veicular, por enquanto, suas inserções no horário político gratuito. A ministra Bucchianieri passou a responsabilidade da decisão para o colegiado de juízes da Corte e abriu um prazo de 24 horas para que as campanhas de Lula e Bolsonaro se manifestem. Uma medida mais justa do que a que se tinha anunciado primeiramente.
Nesse embate entre TSE e o cidadão comum, a força das redes sociais foi determinante para pressionar os ministros. Apesar do silêncio dos grandes veículos de comunicação, que por muito menos já atacaram as restrições à liberdade de imprensa, os influenciadores digitais conhecidos e as anônimas “tias do Zap” mostraram que tem força suficiente para garantir um Brasil livre de qualquer arroubo autoritário.
Os tempos andam tão confusos, que vale repetir aqui parte do voto proferido por uma envergonhada ministra Carmen Lúcia durante o julgamento que confirmou a censura ao documentário produzido pelo Brasil Paralelo sobre o atentado contra o presidente Bolsonaro. Apesar de votar favoravelmente à censura, Carmen Lúcia disse que esse tipo de decisão que implica em censura “pode ser um veneno ou um remédio”. E completou “não se pode permitir a volta de censura sob qualquer argumento no Brasil”. Apesar dessas belas palavras, a censura voltou inclusive com a anuência dela.