Paciência tem limite
Arthur Lira tem avisado o governo que essa CPI promete causar problemas. "Não só o MST será alvo, mas todos os movimentos"
A semana começa com um sinal de alerta para o Governo Lula. Sem conseguir organizar uma base sólida no Congresso, apesar dos milhões de reais liberados em emendas, o atual presidente enfrenta sérias resistências em vários projetos apresentados aos parlamentares. Algumas medidas provisórias, editadas no primeiro dia de mandato, sequer foram apreciadas pelas comissões mistas. Outros projetos foram retirados de plenário pelo risco de derrota na hora da votação. Em alguns casos, como os decretos que alteram o Marco do Saneamento, a rejeição é ainda maior.
Para piorar a situação, o governo vai ter de enfrentar, logo de cara, 3 CPIs e uma CPMI. Todas com potencial para atingir a imagem do presidente e causar muita confusão no campo político.
O presidente da Câmara, Arthur Lira disse, no fim de semana, que as três Comissões Parlamentares de Inquérito aprovadas na Casa serão instaladas e terão início nesta quarta-feira, 17. São elas as CPIs do Movimento dos Sem Terra (MST), das Lojas Americanas e das Apostas Esportivas.
A CPI do MST é a que deve provocar mais danos. O clima entre o governo e a bancada ruralista se acirrou muito nos últimos dias. As lideranças do agronegócio se sentem constantemente atacadas por Lula e seus ministros e não conseguem engolir vários acenos e agrados feitos em direção aos movimentos sociais.
A participação de vários ministros numa feira do MST, em São Paulo, deixou a situação ainda mais tensa.
A Frente Parlamentar da Agropecuária, FPA, criticou a presença dos integrantes do governo na feira. Para o vice-presidente do grupo, deputado Evair de Melo, o governo “arrancou a ponte com o agro e não tem mais diálogo”.
“É a fotografia que nós precisávamos para poder provar o envolvimento do governo com o MST nessas invasões de terra”, disse o congressista em publicação nas redes sociais.
A reclamação dos agricultores tem motivo. Só nos primeiros quatro meses do atual governo já foram registradas 56 invasões de propriedades orquestradas pelos diversos grupos ligados ao movimento sem-terra. A alta é de 143% na comparação com o ano passado todo e já superou, em muito, os números do primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro.
A viagem de João Pedro Stédile à China, como membro da comitiva oficial da Presidência da República, também causou indignação. Stédile é um dos mais radicais defensores das invasões de terra e, poucos dias antes da viagem, havia incitado que membros das organizações que comanda avançassem sobre as propriedades rurais.
A bancada ruralista promete endurecer, na CPI, as investigações sobre a origem do dinheiro que mantém esses movimentos ativos no campo e também os nomes indicados pelo grupo para fazer parte da administração federal.
Arthur Lira tem avisado o governo que essa CPI promete causar problemas. “Não só o MST será alvo, mas todos os movimentos que pratiquem atos para os quais o objeto foi pedido, são vários movimentos agrários”, explicou Lira. O presidente da Câmara tem insistido, junto ao Governo, que a articulação política seja mais transparente e que as promessas feitas sejam cumpridas.
Lira também cobrou que o Senado seja mais ativo no debate e deliberação de temas sobre as atribuições do Legislativo e do Judiciário. Ele reconheceu que há um aumento nas críticas ao avanço do poder do Judiciário, especialmente do Supremo Tribunal Federal (STF), e afirmou que deputados se “ressentem” da participação do Senado nessa discussão. De acordo com ele, a autocontenção dos Poderes é importante para manter o equilíbrio da democracia.
Eleito por esmagadora maioria de votos, tanto da situação quanto da oposição, o presidente da Câmara está bastante insatisfeito com o rumo que as coisas estão tomando. As mensagens que têm sido enviadas por ele e as várias reuniões pouco têm adiantado para destravar as negociações com o Governo e definir os limites que cada poder deve ter na democracia brasileira.
Lula, às vezes, não se lembra que é Lira que tem nas mãos, nos próximos dois anos, o poder de autorizar a abertura de um processo de “impeachment” contra o presidente da República. Por enquanto, o presidente da Câmara tem sido bastante paciente, até quando isso vai durar é uma grande incógnita que talvez seja respondida pelas CPIs que vêm por aí.