Na terra das verbas prometidas
A física já explica, na terceira lei de Newton, que toda ação gera uma reação de igual intensidade, mas que atua no sentido oposto
Os ministros do Governo Lula já podem respirar aliviados. Pelo menos por enquanto seus empregos estão mantidos. O Senado aprovou nesta quinta-feira, dia 1º, a medida provisória (MP) que reestruturou a organização do Executivo. O embate para que se chegasse a essa votação final durou até poucas horas antes da MP perder a validade.
O impasse maior foi registrado na Câmara dos Deputados. O presidente Arthur Lira adiou o quanto pode a apresentação do projeto em plenário, alertando o Governo de que seria difícil aprovar o texto sem que fosse feito um acordo. Temendo pelo pior, cerca de R$ 1,7 bilhão em verbas públicas foi liberado para pagar emendas a parlamentares. Essa “boa-vontade” de Lula em atender os pedidos do Congresso acabou azeitando o caminho para a aprovação do texto na Câmara ainda no final da noite de quarta-feira (31).
No Senado, o trâmite foi acelerado, mesmo porque não havia mais tempo para se mexer em nada. O placar foi de 51 votos a favor da medida provisória e 19 contra, além de uma abstenção. Houve uma tentativa de votação simbólica, sem contagem de votos, mas a oposição pediu verificação do quórum e ameaçou entrar em obstrução, o que impediria o desfecho pretendido pelo Governo.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), que foi o relator da medida, chegou a pedir desculpas aos colegas pelo pouco tempo que a Casa teria para debater o assunto e reafirmou a necessidade de não se alterar nada para evitar que a MP caducasse. “Sei que nunca agrada aos senhores e senhoras senadores o fato de recebermos uma matéria com o tempo praticamente esgotado para que se possa fazer qualquer discussão. Ou, pior ainda, aceitar qualquer modificação proposta por algum colega. Aí nos obrigaria a voltar à Câmara e seguramente caducaria tudo”, disse Wagner. Diversos senadores deixaram registrado o desconforto que tal atitude causava na Casa.
Esse debate todo, sobre uma mudança meramente administrativa na composição do Governo, deixou escancarada a falta de articulação política dos ministros de Lula. Alexandre Padilha que cuida das Relações Institucionais e Rui Costa, lotado na Casa Civil, chegaram a trocar farpas publicamente. Para piorar a situação, um culpava o outro pela falta de capacidade de organizar uma base sólida no Congresso que evite derrotas marcantes para os projetos do presidente da República.
As principais queixas dos parlamentares giravam em torno do atraso no pagamento de emendas e também na dificuldade de se conversar com os ministros. Com isso tudo posto na mesa, eles aproveitaram o prazo curto para aprovar a MP dos ministérios e emparedaram o Governo. A pressão fez efeito e a torneira do Orçamento começou a jorrar o dinheiro prometido. Lula, nas cordas, chegou a convocar uma reunião de emergência com seus ministros e exigiu que o problema fosse resolvido de qualquer forma.
Lira, ao liderar a rebelião, se colocou numa posição de alvo. Por coincidência, horas antes de iniciada a votação da MP, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, liberou para julgamento um recurso da defesa do presidente da Câmara num processo que Lira é acusado da prática de corrupção passiva. O caso estava parado desde 2020. Toffoli, para quem não se lembra, foi advogado do Partido dos Trabalhadores e indicado pelo próprio Lula para uma vaga no STF, em 2009.
Nos próximos dias, a vida não deve ser fácil para Lira. Logo na quinta-feira, auxiliares dele e alguns empresários amigos foram alvo de uma ação da Polícia Federal. O objetivo é apurar desvio de verbas públicas e compras superfaturadas de kits de robótica para escolas de várias regiões do País.
A física já explica, na terceira lei de Newton, que toda ação gera uma reação de igual intensidade, mas que atua no sentido oposto. O presidente da Câmara pressionou forte o Governo e agora está recebendo o troco. Resta saber se Lira vai se manter no jogo, ou vai achar melhor repensar, por hora, sua estratégia. Lula só não pode esquecer que Lira é quem detém o poder de iniciar processos de “impeachment” contra o presidente da República. Se a carta vai ser usada agora, ou permanecerá na manga, é uma outra história.