Esqueletos à mostra

O governo atual quer que todas essas alterações contratuais sejam investigadas e, se houver irregularidade, que o cofre do Estado seja ressarcido

Por Cruzeiro do Sul

Obras não terminadas causam prejuízo ao Estado

As eleições de 2022 se encerraram no final de outubro, mas alguns de seus reflexos e consequências ainda podem ser sentidos em vários aspectos. Esqueletos que ficaram escondidos dentro de alguns armários começam a surgir e colocar em xeque algumas obras iniciadas apressadamente no transcorrer do ano passado.

Nos últimos meses, o governo Tarcísio de Freitas, que assumiu o cargo em janeiro depois de décadas do PSDB no comando do Estado, identificou uma série de irregularidades e reajustes suspeitos em contratos firmados pela gestão anterior, chefiada por João Doria e Rodrigo Garcia. Em muitos casos, os problemas se concentram em obras e contratos destinados a melhorar a condição de estradas do interior paulista. Tudo foi feito utilizando verbas da Secretaria Estadual da Agricultura e Abastecimento.

Alguns aditivos de “reequilíbrio econômico-financeiro” foram assinados no apagar das luzes da administração anterior e englobam cerca de 111 contratos do programa “Rotas Rurais - Melhor Caminho”. Só esses reajustes, autorizados por Rodrigo Garcia, aumentaram os custos das obras de recuperação de estradas rurais em R$ 37 milhões. Para se ter uma ideia, durante todo o ano de 2022, o governo estadual gastou cerca de R$ 520 milhões com o programa.

A meta do Melhor Caminho, na época do lançamento, era asfaltar 5 mil quilômetros de vias rurais em um ano. Isso representaria um aumento de dez vezes no ritmo de execução em comparação à versão anterior do programa, criada em 1997. No entanto a expectativa não se realizou e somente 1,6 mil quilômetros foram concluídos até maio deste ano, um terço do total previsto.

O caso foi parar, em maio, no Tribunal de Contas do Estado, na Corregedoria-Geral do Estado, no Ministério Público de Contas e no Ministério Público. O governo atual quer que todas essas alterações contratuais sejam investigadas e, se houver irregularidade, que o cofre do Estado seja ressarcido.

Os documentos entregues pela Secretaria de Agricultura para os órgãos de fiscalização apontam “graves irregularidades” no programa Melhor Caminho, de construção e manutenção de estradas rurais, entre os anos de 2021 e 2022. Segundo o relatório, foram pagos cerca de R$ 200 milhões por obras que não foram concluídas. Em alguns casos, as obras sequer foram iniciadas e, mesmo assim, as empreiteiras foram irrigadas com parte do orçamento público. Ao todo, mais de 40 obras foram paralisadas, canceladas, o que corresponde a mais de 2,4 mil quilômetros de estradas rurais.

As manobras feitas em fim de mandato não param por aí. Teve contrato que foi reajustado nos dias 8 e 9 de dezembro, mas os extratos com os valores acrescidos e empresas beneficiadas só foram publicadas no Diário Oficial em janeiro, numa clara intenção de esconder o malfeito. Para piorar, as justificativas utilizadas para legalizar essas mudanças todas foram consideradas pelos técnicos como “frágeis” e “imotivadas”. Até o presente momento os dois ex-governadores paulistas optaram pelo silêncio diante dessas denúncias. Nenhuma explicação foi dada pelos procedimentos adotados na execução do programa.

Vai ficar, agora, a cargo dos órgãos fiscalizadores passar um pente-fino em todos esses dados apresentados pelo governo Tarcísio. É importante passar a limpo toda essa história para que não haja dúvida nem prejuízo financeiro ao Estado de São Paulo.

Até que isso se resolva, o governador preferiu adotar uma medida preventiva. Ele transferiu a execução das obras das estradas rurais do programa Melhor Caminho para o Departamento de Estradas de Rodagem (DER), órgão responsável pela manutenção das rodovias estaduais. O DER está sob comando do coronel do Exército Sergio Codelo, pessoa que detém a confiança de Tarcísio.

A iniciativa do governador, em aumentar a transparência dos gastos públicos, vem em boa hora. Os governantes devem essas explicações à população, cansada de recolher tantos impostos e de receber tão pouco de volta. Tomara que esse exemplo seja seguido por outros e tenhamos um Brasil cada vez mais justo para o cidadão.