A solução está na origem do problema
Essas correntes migratórias só vão cessar, ou perder força, quando não houver mais motivo para alguém abandonar seu país
Pobreza, ditaduras, guerras, perseguições políticas e religiosas. Uma série de conflitos vem provocando um grande deslocamento de populações mundo afora. Terrível para quem é obrigado a deixar para trás suas raízes, seus pertences, seus entes queridos, sua história em busca de sobrevivência e de uma vida menos degradante. Ruim também para as populações que recebem esses imigrantes. O impacto da chegada de milhares de estrangeiros, de uma única vez, mexe com o mercado de trabalho, com a logística e cria sérias desavenças sociais e culturais. As diferenças, muitas vezes, são tantas que dificultam a convivência pacífica.
Foi o que aconteceu, por exemplo, com a pequena ilha italiana de Lampedusa. Do dia para noite 10 mil imigrantes, a maioria vinda da África, desembarcou no local, causando um transtorno na vida dos 6 mil habitantes que ali moravam. Aos poucos o governo italiano começou a transferir os estrangeiros para outras localidades, mas novos grupos chegam mês a mês.
A Itália, vira e mexe, se queixa junto aos seus parceiros da União Europeia. Pede maior participação das outras nações no acolhimento de imigrantes. Só que as demandas italianas nem sempre são ouvidas. Alguns líderes europeus adoram posar de humanistas, mas na hora de dividir o problema se fazem de cegos, surdos e mudos.
O presidente da Itália, Sergio Mattarella, reclamou que as normas da União Europeia (UE) para a distribuição de migrantes são “pré-históricas” e precisam ser atualizadas diante da crise migratória que assola a Europa.
Para o presidente italiano, é preciso considerar “como utilizar de forma diferente as ferramentas rudimentares e ultrapassadas face a um fenômeno que é totalmente novo”. Matarella explica que o regulamento de Dublin, que rege as migrações, estabelece que os estrangeiros devem se registrar no país da UE em que chegam. Se, de lá, viajarem para outro Estado do bloco, podem ser expulsos para o primeiro país em que foram registrados. Assim a Itália, que acolhe a maioria dos que chegam por mar, sempre acaba recebendo de volta milhares de migrantes.
O governo atual da Itália, liderado pela primeira-ministra Giorgia Meloni, desde dezembro do ano passado deixou de aplicar esse regulamento por razões “técnicas”. Outros países do Mediterrâneo argumentam que as regras de Dublin impõem uma carga excessiva a sua capacidade de acolhida e que muitos migrantes querem se estabelecer em outros países do bloco.
O problema é que essas outras nações, quase sempre mais ricas, estão dificultando a entrada dos migrantes. Na semana passada, a Alemanha suspendeu a acolhida voluntária de solicitantes de asilo procedentes da Itália, devido à “forte pressão migratória”. A solução parece estar cada vez mais distante.
Não é só a Europa que enfrenta esse tipo de desafio. A fronteira entre Estados Unidos e México também virou palco de muita confusão e troca de acusações na política. Todos os dias milhares de latinos, vindo de vários países, tentam atravessar a fronteira americana. Eles buscam uma vida melhor, longe da pobreza, da violência dos carteis que comandam o tráfico de drogas e das ditaduras.
O governo americano faz de tudo para impedir a invasão, mesmo assim muita gente consegue burlar a fiscalização para viver ilegalmente. Nos últimos dias, milhares de imigrantes entraram nos Estados Unidos pela Califórnia e pelo Texas. O crescimento do número de imigrantes na fronteira marca uma retomada das correntes migratórias, depois dos números terem caído nos últimos meses por conta da mudança na lei.
Em maio, o presidente Joe Biden lançou nova política para impedir as entradas ilegais, incluindo a deportação de imigrantes e o impedimento da reentrada por cinco anos. Só que poucos meses depois, o medo de represálias deixou de importar para quem vive em tamanho sofrimento.
Os líderes das principais potencias mundiais precisam entender que essas correntes migratórias só vão cessar, ou perder força, quando não houver mais motivo para alguém abandonar seu país de nascimento. Só atacando a origem do problema é que se chegará a uma solução satisfatória. Enquanto isso não se resolve vamos assistir, impotentes, o sofrimento de milhares de cidadãos obrigados a vagar, sem destino, pelo planeta.