O próximo voo do Aeroclube de Sorocaba

Os problemas envolvendo o Aeroclube de Sorocaba passam principalmente pela disputa acerca da área e das instalações para suas atividades

Por Cruzeiro do Sul

A entidade foi criada em 1942, a partir da campanha "Deem Asas para o Brasil"

Do alto dos seus 81 anos de existência, o Aeroclube de Sorocaba enfrenta um dos momentos mais desafiadores e precisa de apoio do poder público e da sociedade sorocabana para continuar desenvolvendo suas atividades.

A entidade foi criada em 1942, a partir da campanha “Deem Asas para o Brasil”, tendo início em um grupo de empresários e pessoas de destaque, incentivados pelo jornalista Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados, que tinha fazenda na região de Sorocaba.

Entre os apoiadores, estavam o bispo dom José Carlos de Aguirre, os empresários Antônio Pereira Ignácio (S.A. Indústrias Votorantim), Severino Pereira da Silva (Companhia Nacional de Estamparia) e Luiz Pinto Thomaz (fundador da Siderúrgica Nossa Senhora Aparecida).

O primeiro hangar, projetado pelo engenheiro Alexandre Albuquerque, da Escola Politécnica da USP, tem um vão livre de 25 metros.

O primeiro avião, um Piper, de fabricação americana, foi doado pelo empresário Valentim Bouças, conselheiro financeiro do ex-presidente Getúlio Vargas.

De lá para cá, o Aeroclube de Sorocaba formou grandes nomes da aviação, como Alberto Bertelli, que conseguiu grande projeção no Brasil como piloto de acrobacia aérea.

Profissionais ligados à aviação militar e comercial também iniciaram a carreira no local.

Entre eles, o ex-presidente do Superior Tribunal Militar de Brasília, ministro e tenente-brigadeiro Cherubim Rosa Filho.

Trata-se da única escola de pilotagem vinculada a um aeroclube instalada num raio de 100 quilômetros, onde cerca de 2,5 mil pilotos já foram formados.

Outra contribuição para a aviação brasileira foi a de ajudar a criar uma geração inteira de apaixonados pelo tema ao sediar a Aero Sport, grande feira de aviação que ocorreu na cidade nos anos 1990 e 2000.

Os problemas envolvendo o Aeroclube de Sorocaba passam principalmente pela disputa acerca da área e das instalações para suas atividades.

Juridicamente falando, a maior parte das instalações por ele ocupadas pertence à Prefeitura de Sorocaba: quatro hangares, salas de aulas, alojamento, pátio de estacionamento, escritórios e oficinas.

Em 2018, a municipalidade determinou a desocupação das instalações do Aeroclube por conta do vencimento do Termo de Concessão de Direito Real de Uso de Área Pública.

Ao que consta, em janeiro de 2021, uma comissão para estudar a viabilidade de nova concessão à entidade foi instalada, sem conclusão dos trabalhos até o momento.

“Despejado” da área municipal, o Aeroclube teve, então, as atividades relegadas ao hangar cedido pelo Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (Daesp) à entidade.

Porém, com a concessão do Aeroporto de Sorocaba feita pelo Estado à iniciativa privada, a nova administradora, Rede Voa São Paulo, passou a fazer exigências que o Aeroclube não pode cumprir, como a constituição de um novo CNPJ e o pagamento de aluguel.

Outro litígio envolve a área da concessão feita pelo Estado à Rede Voa, de mais de 2,3 milhões de metros quadrados, quase 2,5 vezes maior que a área total aeroportuária, de aproximadamente 1 milhão de metros quadrados.

Aparentemente, houve erro formal do governo estadual ao incluir a área municipal na concessão.

Próximo a uma das cabeceiras da pista do atual Aeroporto Estadual de Sorocaba - Bertram Luiz Leupolz, existe um pequeno bairro de aproximadamente sete quarteirões que imortaliza, no seu nome e no de sua principal rua, o amor entre um casal de jovens imigrantes alemães: Elza e Adolfo Frederico Schleiffer.

Fugindo da Segunda Guerra Mundial, eles chegaram a Sorocaba nos anos 1940, onde adquiriram terras e, em um gesto de idealismo, doaram uma gleba de 1 milhão de metros quadrados (40 alqueires) para a instalação do pioneiro “Campo de Avião”, ou “Campo dos Schleiffer”, dando início à história do Aeroclube e, também, do Aeroporto de Sorocaba.

Com o passar dos anos, e a municipalização da área, ironicamente, a entidade responsável pelo início de tudo está apartada dela.

É bem verdade que o Aeroclube de Sorocaba sofreu em passado recente uma crise de credibilidade, por conta de atos administrativos de ex-diretores, que praticaram a concessão irregular de áreas públicas a terceiros, entre outras ações justificadas pela necessidade de manter a instituição viva durante uma crise financeira nos anos 2000.

Sem prejuízo das devidas apurações legais, contudo, o legado da entidade é maior que isso e precisa ser preservado e fortalecido para as próximas gerações.

Como um avião que atravessa uma tempestade e alterna sua rota para um aeroporto seguro, de onde continuará decolando e gerando empregos e riquezas.