Vale quanto pesa

Segundo estimativas de especialistas, só em 2024, a Vale já perdeu R$ 38 bilhões de valor de mercado

Por Cruzeiro do Sul

O mar de incertezas passa pelo risco de interferência direta do Governo Federal nos rumos da empresa

Milhares de brasileiros são acionistas da Vale. Muitos se tornaram sócios da empresa ao utilizar parte da reserva do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para adquirir os papéis no início do século 21. Nesses mais de 20 anos, as ações se valorizaram muito, o ganho foi bem superior à renda que o trabalhador obteria se deixasse o dinheiro parado só com as correções normais do fundo. Uma vantagem e tanto. Mesmo assim dá uma dor no coração ver o preço das ações da companhia despencarem nos últimos anos.

Quem tinha na reserva cerca de R$ 80 mil reais no primeiro trimestre de 2021, hoje deve ter perto de R$ 50 mil. Uma má notícia principalmente para quem está perto da aposentadoria e pretende sacar esse dinheiro. A dúvida, nesse momento, é saber até quando as ações vão desabar.

O mar de incertezas passa pelo risco de interferência direta do Governo Federal nos rumos da empresa. A simples intenção de nomear o economista e ex-ministro dos governos do Partido dos Trabalhadores, Guido Mantega, a um cargo no Conselho já provocou sérios rumores no mercado financeiro. A Bolsa de Valores não perdoou a atitude de pressão estatal e os papéis se desvalorizaram. Desde o início do ano, no meio de tantos boatos, a queda passou dos 11%.

Segundo estimativas de especialistas, só em 2024, a Vale já perdeu R$ 38 bilhões de valor de mercado. É claro que a ameaça de intervenção do Governo não provocou todo esse desastre. Outros fatores também contribuíram. O preço do minério de ferro anda em baixa, principalmente pela redução da demanda da China, que vem crescendo menos que o esperado. A possibilidade de troca de comando na empresa é outro complicador.

Somado a tudo isso, a notícia de que a Justiça Federal condenou a mineradora, a BHP e a Samarco a pagar uma multa de R$ 47,6 bilhões como indenização por danos morais coletivos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 2015, azedou ainda mais os ânimos. Isso sem falar na tragédia de Brumadinho, que é outro capítulo à parte e anda vai render muitos dissabores para a empresa e para os acionistas.

A semana que vem ainda vai ser de muita turbulência para a Vale. O conselho de administração da mineradora (CA) vai se reunir para discutir a permanência de Eduardo Bartolomeo na presidência da empresa. Os executivos vão ter que analisar o desempenho do CEO e decidir se recomendam que ele fique no cargo ou seja substituído.

Bartolomeo teve um início difícil no comando da empresa e, aos poucos, foi mostrando seu valor e as coisas se acalmaram um pouco. A percepção que se tem agora é que não seria de todo mal que ele mantivesse a posição.

A troca de comando, nesse momento de grandes dificuldades globais, demandaria um esforço enorme para a Vale, o que poderia prejudicar, ainda mais, os resultados. Quanto mais tempo as incertezas permanecerem, pior o cenário.

O problema maior que o CEO enfrenta hoje não está no campo administrativo e sim na pressão do Governo, verbalizada pelo ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre os conselheiros. O Planalto deseja o afastamento de Bartolomeo para abrir uma vaga que seria possivelmente ocupada por Guido Mantega. Só que a articulação deu tão errado, que o próprio ex-ministro deve anunciar sua retirada de qualquer disputa.

Enquanto as brigas pelo poder seguem nos bastidores da Vale e da Brasília, quem sofre é o pequeno investidor. Pessoas que apostaram parte de suas reservas do FGTS num programa que tinha tudo para dar certo e que agora é posto em dúvida.

A antipatia e má vontade que o Partido dos Trabalhadores tem pelas privatizações feitas por outros governos é tanta que não basta tentar sabotá-las. É necessário também causar prejuízo a muitos brasileiros, a maioria simples trabalhadores assalariados.