Balança mas não cai
Por sua situação geográfica -- é cortada por um rio que lhe deu o nome -- e por uma barreira criada pelo homem -- a ferrovia, que originalmente também usou seu nome --, Sorocaba teve durante muitos anos sua expansão urbana limitada por esses dois obstáculos físicos. A primeira ponte que se tem notícia ficava onde hoje está a Francisco Dell’Osso, e ao seu lado funcionou nos séculos 18 e 19 como Registro de Animais, local onde tropeiros pagavam imposto pelos muares ou equinos que vinham do sul do continente e eram comercializados na Feira de Muares da cidade. A partir de 1875, quando a Estrada de Ferro Sorocabana passou a ligar a Capital à Real Fábrica de Ferro de São João do Ipanema, criou-se outra barreira que limitou a área urbana do município. A expansão da malha urbana só foi possível com as obras que transpuseram esses obstáculos -- pontes, pontilhões e viadutos -- e surgiram bairros no que se convencionou chamar de Além-Linha, para aqueles criados depois de linha férrea, e Além-Ponte, os localizados na outra margem do rio.
Com o crescimento da cidade e necessidade de transposição desses obstáculos foram sendo construídos viadutos e pontes. A ponte da rua Padre Madureira é da década de 1950; o pontilhão da rua Professor Toledo, principal acesso ao bairro do Trujillo, é de 1957. O viaduto Jânio Quadros também é dos anos 50. Nos anos 1980 ocorreram mudanças importantes no sistema viário da cidade. A interligação da avenida Dr. Afonso Vergueiro com a Dom Aguirre, por meio da praça Lions, deu origem ao pontilhão que ali está. Os dois antigos pontilhões da praça da Bandeira, originalmente construídos em pedra, deram lugar aos atuais, de estruturas metálicas, e que permitem a passagem de mais de um veículo por vez, desafogando o trânsito. As obras de alargamento da rua Padre Madureira também permitiram a ampliação do pontilhão daquela via, assim como foi construído um novo pontilhão na rua Humberto de Campos, com a duplicação do trecho final da Afonso Vergueiro. O viaduto dos Ferroviários foi inaugurado em 1996.
Todas essas obras de arte, termo usado pela engenharia, necessitam de fiscalização, conservação, vistorias periódicas e obras de manutenção. A falta desse serviço por parte do poder público ou empresas responsáveis, no caso da ferrovia, podem trazer resultados catastróficos, não só para o sistema viário do município como também pelo risco potencial que representa para a população.
Dias atrás este jornal trouxe reportagem sobre a situação em que se encontra o pontilhão localizado na confluência das avenidas Afonso Vergueiro e Dom Aguirre. Há trincas em sua estrutura e o tabuleiro está bastante danificado devido ao choque de caminhões com cargas muito altas. Na edição de ontem foi mostrada a situação ainda mais preocupante do pontilhão sobre a rua Professor Toledo, local de grande movimento de pedestres e veículos. Há rachaduras no concreto e desnível na estrutura que suporta a linha férrea. Ao contrário do pontilhão da praça Lions, usado eventualmente por composições ferroviárias, este pontilhão suporta a linha que tem movimentação diária e por onde passam todas as composições da carga que cortam a região de Sorocaba.
Alertada pela reportagem da situação desse pontilhão, que apresenta rachaduras há um bom tempo, segundo moradores próximos, a Rumo ALL informou que as obras de manutenção deverão ser iniciadas na próxima semana, sem especificar data ou que tipo de serviço será realizado. Segundo um ex-maquinista entrevistado, a empresa tem conhecimento do problema naquele pontilhão há pelo menos cinco anos e chegou a orientar os seus colegas para que diminuíssem a velocidade dos trens ao passar por esse local.
Viadutos, pontes e pontilhões sem manutenção são um risco para a população. A reportagem pediu informações à Prefeitura de Sorocaba sobre as condições de viadutos e pontes sob sua responsabilidade, alguns com mais de 60 anos, mas obteve uma resposta genérica. Todos acompanham o caos no trânsito que provocou a queda parcial de um viaduto na Marginal do rio Pinheiros em São Paulo e que ainda passa por obras de recuperação. A interdição de outro viaduto que dá acesso à rodovia Dutra, na Marginal do Tietê é outro exemplo de falta de manutenção. Esperar algum fato mais grave ocorra com esses equipamentos urbanos para depois fazer uma vistoria rigorosa será um absurdo. A população não merece viver com a sensação de que grandes estruturas de concreto e ferro com rachaduras e fissuras possam vir ao chão a qualquer momento.