Não deixe o samba morrer - Confira entrevista com Teresa Baddini

Por Manuel Garcia

De azul, cantando em sua formatura em magistério, em 1987. Crédito da foto: Divulgação

A cantora e pedagoga Teresa Margarete Baddini Keller dos Santos. Crédito da foto: Divulgação

Nascida e criada na Rua da Penha, bem no coração de Sorocaba, a cantora e pedagoga Teresa Margarete Baddini Keller dos Santos ou, simplesmente, Teresa Baddini, é uma das pessoas que encantam com seu talento e simpatia. Filha de Rosa Maria Baddini e Antônio Keller, Teresa ganhou este nome devido ao fato de sua mãe ser devota de Santa Teresinha. A sorocabana não esconde seu carinho e admiração pela cantora Alcione e é um das defensoras do samba popular e de raiz. Aos 50 anos e dona de uma voz gostosa e poderosa, que se destaca interpretando sambas românticos que nos trazem memórias, Teresa Baddini é a nossa personagem da semana.

Onde você nasceu?

Sou sorocabana da gema, em 1970 nasci Rua da Penha, na casa dos meus avós. Hoje tenho a facilidade de morar na casa que era deles. Minha infância toda foi brincando em Rua da Penha, na época nos anos de 1970 eu tinha toda liberdade para brincar na rua, as casas não tinham grades, eram apenas muros baixos. era uma delicia.

Sua família sempre foi musical, você sempre quis seguir carreira musical?

Eu desde criança queria ser professora, ou de música ou de artes. Desde criança estudei música, minha família sempre foi muito musical, sempre gostei. Um tio meu tinha aulas de violão com um professor, o já falecido chamado Zé Bastante, e eu ficava na sala ouvindo eles tocarem e sempre cantarolando. Na época eu já estava tocando piano e ele falou pro meu tio para me dar aulas de violão também, comecei a fazer e depois de mais ou menos um ano ele falou: “Pode parar de tocar, você vai ser cantora”, e me apresentou o mundo da seresta no qual eu me apaixonei logo de cara.

Quando foi a primeira vez que você subiu em um palco?

O Zé Bastante me levou no famoso Bar Tudo Azul. Eu subi no palco pela primeira vez e cantei “Não deixo o samba morrer”. Foi um sucesso. Sempre gostei de samba e sempre amei Alcione. Até hoje o carro-chefe das minhas apresentações é o samba romântico. Quando vou compor também sempre acabo compondo letras românticas.

Quais artistas com que você já dividiu o palco que mais te marcaram?

Garças a Deus eu tive muitas oportunidades na minha vida de cantar ao lado de grandes cantores. Lembro quando cantei com Agnaldo Rayol com 15 anos de idade em uma festa junina no CIC, cantei com a grande Inezita Barroso, uma grande diva da música caipira. E um dos momentos que mais me marcou foi quando fiz a abertura de um show do Alexandre Pires. Quando ele chegou eu já estava no palco cantando e ele, ouvindo minha voz, me chamou no final para cantar a musica “Estranha Loucura” que ele canta com a Alcione, foi uma emoção só. Guardo com carinho quando fui participar do programa do Faustão no quadro “Iluminados”, aprendi muita coisa participando deste quadro. O meu sonho é cantar com Alcione nem que seja de joelhos, mas é sonho e ainda vou realizar.

Como foi seu começo cantando nos barzinhos?

No começo eu pedia para cantar, ia em quase todas as serestas e batia na porta dos bares para poder cantar. Às vezes não ganhava nada, mas ia pelo prazer de cantar e divulgar o meu nome. Foi porém o saudoso Mandala o primeiro bar que me abriu as portas de verdade e graças a ele fiquei muito conhecida.

Como é trabalhar com o seu marido?

Eu tenho o prazer de estar nos palcos com meu marido Vicente que é baixista, cavaquinista e cantor. Conheci ele em um bar. Ele participava do grupo Palasamba, que eu adorava. Tenho três filhos, porém o meu filho mais novo, o Davi, de 7 anos, é o que acho que vai seguir carreira musical pois ele ama. Para mim conciliar minha vida como cantora, professora, esposa e mãe não é muito difícil, as coisas vão se encaixando e minha família me ajuda muito. A vida do artista no Brasil é um calvário, para conseguir fazer o nome, ser conhecido é muito difícil. Os artistas não têm incentivo nenhum, quem é artista faz por amor.

Quais instrumentos você toca?

Minha formação é em piano clássico no Conservatório de Tatuí, mas toco também violão, violino, trompete, flauta transversal e um pouco de percussão. Somente o piano e o violão eu tive alguém que me ensinou, o restou aprendi tudo sozinha por necessidade mesmo.

Sua presença é constante em eventos filantrópicos de nossa cidade. Como é sua relação com o terceiro setor?

Eu vou sempre que eu posso me doar e doar minha arte para entidades sérias de nossa cidade. Acho bom para minha alma e pro meu espírito. Sempre que a causa é nobre e meu coração manda eu vou. Não consigo falar não. Sorocaba é muito solidária e tem muita gente querendo fazer o bem. E também temos muitos que precisam, todo mundo deve se doar um pouco, pois Deus sempre vai nos abençoar e dar em dobro.

É difícil viver de música? Você se sente valorizada?

A valorização que eu sinto não é governamental nem pública e sim do meu público. Devo o meu reconhecimento aos moradores da cidade e que curtem Teresa Baddini e me apoiam nas minhas apresentações. Os músicos da cidade sofrem muito, os recursos para área cultural são muito pequenos. Graças a Deus Sorocaba tem grandes empresários que valorizam os músicos e as artes locais. Mas viver de arte é sim muito complicado, principalmente agora durante esta pandemia.

Por falar em pandemia como está sendo vida de Teresa Baddini sem o seu banquinho no bar e o público cantando junto?

Está sendo muito difícil para todo brasileiro. Tivemos que nos reinventar não só eu, mas também todo mundo. Graças à tecnologia podemos estar em vários locais com várias pessoas ao mesmo tempo. Eu tenho feito ‘lives’, fiz a primeira sobre o Dia dos Namorados, depois fiz uma somente para crianças. È uma maneira do meu público não ficar sem minha música e não esquecer de mim além de levar um conforto através da música e acalmar as famílias. Infelizmente, financeiramente falando, creio que está muito difícil para todos os artistas. Creio que este recurso emergencial para os artistas vai ajudar muito. Eu, ainda bem, sou aposentada e ainda ministro aulas, então não passo por necessidade, mas tenho muitos colegas músicos que estão passando por um grande perrengue e espero que esta ajuda chegue logo até eles.

Você se aposentou como professora. Apesar de ainda dar aulas, em quais escolas você já passou?

Eu comecei a dar aula com 15 anos de idade quando comecei fazer magistério na OSE, eu dei aula por 23 anos na OSE e no Uirapuru. Atualmente, dou aula no Objetivo Portal, Colégio Humanos e no Sesi. Já fui professora na faculdade de Arras também.

Em sua vida de bar em bar acaba encontrando algum aluno?

Às vezes chega homens barbudos com filhos e esposa bate no meu ombro e fala: “Tia Teresa, fui seu aluno”. Eu fico feliz por eles não esquecerem do meu nome, fico mais feliz ainda quando alguns falam que apreenderam a tocar algum instrumento, para mim é o auge. Vejo ali que minha missão de professora foi cumprida.

Como uma apaixonada pelo samba e pelo Carnaval recebe uma notícia que talvez não tenhamos Carnaval em fevereiro de 2021.

Recebo com muito luto, pois a festa mais tradicional e popular do Brasil é o Carnaval. Acho que vamos ter que nos reinventarmos par não deixar o samba morrer. Vamos dar um jeitinho. Como professora eu tenho visto vários alunos em minhas aulas on-line que estão super agitados, eles querem logo poder sair e se divertirem. Como professora eu estou tendo que ser um pouco psicóloga, as minhas aulas, por serem musicais, têm sido uma forma deles aliviar o estresse. Tenho certeza de que quando for seguro, poderemos fazer um Carnaval com quatro dias de festa com muita alegria.

Sua canção autoral, “Basta um olhar”, foi lançado em julho do 2019, quando teremos mais lançamentos?

Foi algo que meu público pedia faz tempo, foi minha primeira música autoral, foi uma maravilha. Tenho algumas coisas na gaveta e quero lançar em 2021 um álbum com pelo menos dez faixas.

Durante a pandemia você se apresentou no estacionamento do Edifício La Vista Guadalajara, como foi se apresentar em um local tão diferente?

Eu nunca tive uma sensação tão maravilhosa. O síndico me ligou e perguntou se eu topava cantar na garagem para três blocos de apartamentos eu topei na hora. Foi muito bom olhar para cima e ver as pessoas cantando e as luzes piscando. Mminha voz ecoou pelo bairro. Moradores de outros prédios acabaram me filmando e me marcando nas redes sociais, a imprensa divulgou. Lembro que no primeiro andar tinha duas senhoras de idade que colocaram só a cabecinha para fora da janela e elas ficaram cantando junto comigo. Quando acabou elas fizeram uma cartinha e jogaram pela janela. Foi muito lindo.

Como você avalia os novos ritmos da música brasileira como o funk?

Eu, como professora de música e formada em piano clássico, entendo que estes novos ritmos foram da evolução tecnológica que foi chegando, não me vejo cantando um funk, mas respeito quem canta. A música brasileira passa por uma crise, estamos com carência muito grande de músicas com letras que falem coisas melhores, conteúdos e melodias melhores, porém é a evolução. Eu percebo que nas novelas as trilhas sonoras são formadas por músicas regravadas. Vejo que os autores das novelas procuram canções para resgatar o passado que tem uma letra com conteúdo melhor.

Como você vê a vida do músico de bar depois da pandemia?

Eu entendo que quando isto passar, o povo vai estar tão carente de música e de cultura que eles vão se agregar culturalmente, vão invadir os bares e os eventos beneficentes. Vai ser um divisor de águas, pelas ‘lives’ eu percebo o quanto o povo está carente e tenho certeza que vamos ter mais festas e bares e um público valorizando mais os artistas e os profissionais de eventos.

Bate Bola:

Samba: Alcione

Família: Porto Seguro

Deus: O maior de todos

Morte, tem medo: Nem um pouco é o ciclo

Quem é Teresa Baddini: Guerreira.

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