Leis que criam adicionais elevam o salário de servidores municipais
São exceções dentro de um total de mais de 12 mil servidores da Prefeitura de Sorocaba. Mas são casos que assustam, como por exemplo no caso de uma servidora que recebeu no ano passado, valor líquido de quase R$ 500 mil em 12 meses. No contexto da folha de pagamentos do Executivo sorocabano há ainda outras situações, como as rescisões, que custaram aos cofres públicos pouco mais de R$ 20 milhões em 2019. As informações fazem parte de um levantamento realizado pelo jornal Cruzeiro do Sul com base nos dados do Portal da Transparência.
Segundo o Portal, ocorreram 62 situações em que o salário líquido do servidor, em um mesmo mês, foi maior que o salário do chefe do Executivo. Dessas, em 16 situações o valor era superior a R$ 50 mil. A maior parte das situações ocorre nas secretarias Jurídica e de Saúde.
No caso que mais chama a atenção, a servidora recebeu no ano pouco mais de R$ 484 mil. Com isso, a média salarial dessa servidora foi elevada para mais de R$ 40 mil por mês. Ou seja, mais de R$ 11 mil acima do teto do vencimento da chefe do Executivo. O salário da chefe do Executivo no período avaliado pelo reportagem era de R$ 29.378,82.
Em outro caso, os salário bruto do mês de um servidor foi de pouco mais de R$ 144 mil. A reportagem considerou apenas o valor liquido, que foi de cerca de R$ 96 mil.
Rescisões
No total, no ano passado, foram 1.541 rescisões na Prefeitura de Sorocaba. A grande maioria tem valores baixos, algumas correspondem a zero, outras têm valores irrisórios. Entretanto, e mais uma vez, chamam a atenção os valores vultosos. Duas dessas rescisões têm valores superiores a R$ 200 mil, sendo que uma delas apresenta valor de R$ 257 mil. Outras 82 rescisões tiveram valores entre R$ 50 mil e R$ 144 mil.
Conforme os dados disponíveis no Portal da Transparência, ainda referente às rescisões, foram gastos, bruto, R$ 20,2 milhões em 2019. Líquido, ou seja, o que, de fato, o servidor recebeu, o valor foi reduzido para R$ 18,1 milhões.
Segundo a Prefeitura de Sorocaba, todos os pagamentos estão baseados em lei, em especial o Estatuto do Servidor Público Municipal. Entre as leis que permitem que essas exceções, está uma de 2007, a 8.094. Ela determina os casos de prioridade no pagamento de licença-prêmio.
Base
A título de informação, o Cruzeiro do Sul usou como matriz para o levantamento, a folha de pagamento da Prefeitura de Sorocaba de janeiro de 2019. Com essa matriz, foram comparados os salários dos demais meses do ano. A comparação levou em conta apenas o salários líquidos, portanto, sem levar em consideração descontos como empréstimos e desconto de pensão, por exemplo. Todas as informações são públicas e estão disponíveis no Portal da Transparência da Prefeitura.
Vale frisar, como afirmou o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais em outras ocasiões, quando questionado sobre o mesmo assunto, é que a grande maioria dos servidores não recebe salários fora do padrão, ficando próximo de R$ 3 mil por mês.
Especialista
Para Rosely Bonora dos Santos, presidente do Observatório Social do Brasil em Sorocaba, a boa notícia vem por conta da emenda constitucional número 3, de 2019. Entre outras coisas, a emenda vedou a incorporação de vantagem de caráter temporário ou vinculadas ao exercício da função de confiança ou de cargo em comissão. “Realmente, onera bastante, mas não vai haver mais isso”, diz.
Antes, um servidor que tinha função de inspetor de alunos e que havia ocupado cargo de confiança como secretário, passava a receber salário acima de R$ 10 mil, mesmo voltando ao cargo de origem, cujo salário é inferior a R$ 2 mil.
Sindicato dos Servidores
O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba lembrou da legalidade dos pagamentos e ressaltou que a maior parte dos servidores recebe bem abaixo das exceções usadas como base pela reportagem. A instituição lembrou também sobre as questões envolvendo a emenda federal em vigor que proíbe as chamadas incorporações no serviço público.
Situação se repete
A situação vista em 2019, se repete em 2020. Alguns casos já chamam a atenção quanto aos valores. Em um deles, o servidor recebeu bruto mais de R$ 212 mil nos três primeiros meses do ano. Líquido, o valor cai para quase R$ 111 mil. Na composição de março, adicional de tempo de serviço -- R$ 9,6 mil --, décimo de agente político -- R$ 13 mil --, gratificação -- R$ 3,7 mil --, saldo de abonadas -- R$ 10 mil --, sexta parte -- R$ 6,3 mil --, entre outros. Já nos descontos, redutor salarial, imposto de renda e previdência, entre outros, que, somados, dão mais de R$ 33 mil. O salário normal deste servidor é de R$ 18,7 mil.
Em outra situação, uma servidora recebeu em março mais de R$ 52 mil líquidos, sendo que o salário bruto deste servidor neste mês foi de mais de R$ 57 mil. No holerite, R$ 41 mil somente com referência à licença-prêmio indenizada. Há ainda outro caso que chama a atenção. Nos três primeiros meses deste ano, outra servidora recebeu bruto quase R$ 170 mil. Líquido, o valor cai para R$ 105 mil.
Os três casos citados, referentes a 2020, são da Secretaria Jurídica e da Secretaria de Planejamento.
O salário como resultado da soma de inúmeros benefícios
Vários fatores afetam a composição do salário dos servidores. É preciso considerar ainda, conforme a Divisão de Administração de Pagamentos da Prefeitura de Sorocaba, que, por exemplo, alguns funcionários recebem adicionais, como insalubridade. “O que compõe o salário dos servidores é salário de origem, mais os reflexos, como a sexta-parte, o adicional do tempo de serviço”, informa o setor. Esse adicional é adquirido a partir de cinco anos de serviço. Com isso, ele passa a receber também um adicional de tempo de serviço, um acréscimo de 5% sobre o salário.
A partir daí, o servidor passa a receber também 1% sobre o salário de origem por ano. Há ainda, com vinte anos de serviço, a chamada sexta-parte. Nesse caso, como explicação básica, o servidor divide o salário por seis e recebe a mais uma dessas partes.
Para exemplificar, se uma pessoa começasse a trabalhar hoje na Prefeitura de Sorocaba, recebendo R$ 1.000.,00 por mês, em 2025 ela teria um reajuste de 5% sobre os vencimentos, passando a receber R$ 1.050,00. No ano seguinte, ele receberia R$ 1.060,00 e em 2027, R$ 1.070,00 e assim sucessivamente. A partir de 20 anos de serviço, ele passaria a receber R$ 1.399,20, contanto com a sexta-parte. A análise não leva em conta os reajustes anuais.
Ainda conforme o Setor de Recursos Humanos, todos os servidores tem direito a rescisão. Um estatuário tem direito, por exemplo, ao proporcional aos dias trabalhados, proporcional de férias, 13º e licença-prêmio proporcional.
Com relação aos valores maiores que o comum observados pela reportagem, o setor explica que vários fatores podem gerar o montante, como férias, vencidas e proporcional, além de licença-prêmio. Nesse caso, a cada cinco anos exercidos, o servidor tem direito a três meses de gozo -- descanso -- ou pecúnia -- dinheiro. A rescisão só ocorre quando ele se desliga da Prefeitura.
Sobre os casos em que servidores receberam por mais de uma vez, mas de R$ 100 mil, o servidor pode ter recebido a licença-prêmio que ele tem direito a cada cinco anos. Entretanto, em alguns casos, os servidores só recebe perto de completar os 10 anos de atividades, quando já está vencendo a segunda, que pode ser recebida, por exemplo, dois meses depois da primeira. Assim, hipoteticamente, um servidor que recebe mensalmente R$ 10 mil, poderá receber R$ 90 mil em 90 dias, sendo três salários de R$ 10 mil mais duas licença prêmio de R$ 30 mil, ou três salários cada. “Licença prêmio é uma verba indenizada. Não há desconto nenhum”, lembra.
O setor também lembra que os servidores que são procuradores podem receber como teto 90,25% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), podendo chegar a R$ 35.462,00. Ainda conforme o setor, mesmo após uma rescisão, o servidor poderá continuar a receber da Prefeitura, se tiver, por exemplo, outro vínculo, caso de alguns médicos.
Outro ponto lembrado é a aplicação do chamado redutor de salário. Nesse caso, quando o salário líquido ultrapassa o salário do chefe do Executivo, o excesso é imediatamente descontado. Esse redutor vale apenas para o salário.
Câmara
A Câmara de Sorocaba também possui várias situações em que o vencimento dos servidores, em um único mês, ultrapassa o valor recebido pela chefe do Poder Executivo. As mesmas regras e a legislação aplicada aos servidores da Prefeitura de Sorocaba também são válidas para o Legislativo. A Câmara lembra que não há qualquer ilegalidade no pagamento da folha de seus funcionários. (Marcel Scinocca)