MP questiona prefeitura sobre tratamento precoce para Covid
Atualizada às 11h54
O Ministério Público questionou nesta terça-feira (23) a Prefeitura de Sorocaba sobre a adoção do chamado "tratamento precoce" em pacientes com sintomas de Covid-19. A cidade começou a distribuir nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) na sexta-feira (19) os medicamentos Azitromicina e Ivermectina para moradores com sintomas do novo coronavírus que possuem prescrição médica. Em nota, a Secretaria de Saúde afirmou que disponibilizará todas as informações solicitadas pelas entidades e órgãos responsáveis.
O despacho é fruto de representações protocolados contra a adoção do "Kit Covid" na cidade. No documento, a promotora Cristina Palma classifica o assunto como "tormentoso". "A medicina está em constante evolução e o tratamento eficaz, indiscutível e comprovado ainda não surgiu", escreve ao afirmar que há diferentes opiniões na comunidade médica sobre o assunto e citando publicações que alertam sobre os efeitos colaterais dos medicamentos.
Cristina afirmou ser de responsabilidade de cada médico a prescrição e o acompanhamento dos pacientes. "Não cabe nem à Promotoria, nem ao Judiciário, ao meu ver, dizer à comunidade médica e científica qual tipo de tratamento adotar", escreve.
Ela, porém, afirma que cabe ao gestor público "otimizar de maneira correta os recursos, empregá-los onde se faz necessário, de maneira a atender a população, e abastecer a rede com os medicamentos preconizados. Não pode obrigar profissional médico a preconizar o kit saúde, ao nosso ver, nem despender recursos públicos em remédios que não estão sendo demandados”.
O despacho do MP dá o prazo de 30 dias para que o secretário de Saúde, Vinícius Rodrigues, esclareça quais medicamentos foram adquiridos, os valores gastos e as orientações dadas aos profissionais. A promotoria também questionou se havia demanda para a aquisição do kit de tratamento precoce e se a prefeitura recebeu "prescrições da rede de atendimento a justificar a compra e uso dos medicamentos", a fim de "evitar o desperdício de recurso público".
A promotora também pediu ao Conselho Regional de Medicina um posicionamento da entidade de classe sobre o assunto, questionando se os profissionais da rede pública estão tendo a autonomia de prescrever os medicamentos conforme a necessidade de cada paciente e "se há medicamentos disponíveis em quantidade necessária, sem falta ou excessos".
A partir das respostas, a promotora vai definir se abrirá a investigação proposta nas representações das vereadoras Iara Bernardi (PT), Fernanda Garcia (PSOL) e do vereador Francisco França (PT), a outra representação, do ex-deputado Raul Marcelo (PSOL), com possível conversão em inquérito civil.
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde informou que disponibilizará todas as informações solicitadas pelas entidades e órgãos responsáveis. "É sabido que o tratamento precoce gera opiniões diversas e que há estudos científicos favoráveis e desfavoráveis a essa alternativa. Há 46 estudos que falam de benefícios da Ivermectina no tratamento precoce da Covid-19, além de resultados positivos já obtidos com o uso desse mesmo medicamento em diferentes municípios brasileiros. Assim, o que a Prefeitura de Sorocaba fez foi dar a liberdade de escolha por se optar, ou não, por essa alternativa de tratamento a médicos e pacientes, em um momento tão crítico da pandemia em todo Brasil, quando cada tentativa e arma contra o vírus é válida", conclui, ao reforçar que "o foco dos esforços no combate à Covid-19" é a vacinação.
R$ 58 mil em medicamentos
Na sexta-feira (19) a prefeitura afirmou que possuía um estoque com 1,5 mil comprimidos de Azitromicina e 3 mil de Ivermectina. Segundo o secretário de Saúde, a pasta deve receber mais 15 mil comprimidos de cada um dos remédios nos próximos dias, com um custo de R$ 58 mil. A estimativa é de que cada kit saia por cerca de R$ 18 por paciente. O objetivo, segundo o prefeito Rodrigo Manga (Republicanos), é diminuir o número de internações na cidade, em especial em Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
O uso do tratamento precoce divide a opinião de especialistas em todo o país. O Conselho Nacional de Saúde (CNS), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP) desde o início da pandemia têm se posicionado contrários à indicação de qualquer medicamento para tratamento da Covid-19 sem eficácia comprovada.