Termo ‘transnegro’ em emenda de projeto legislativo provoca polêmica
Matéria trata de cotas para afrodescendentes em publicidade oficial
O uso do termo transnegro em um projeto de lei em tramitação na Câmara de Sorocaba gerou polêmicas e foi repudiado por entidades da cidade. O vereador Dylan Dantas (PSC), autor da emenda com o termo, afirma que só a fez em protesto ao que considera hipocrisia. O projeto que recebeu a emenda trata da criação de cotas para afrodescendentes nas peças de propaganda oficial da Prefeitura de Sorocaba.
A inclusão do termo foi repudiada pelo Conselho Municipal de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra de Sorocaba. A nota tem apoio das Comissões de Resgate Histórico do Negro da Advocacia e de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Sorocaba. Para as comissões da OAB, “a iniciativa pode favorecer fraudes além do que reforça o racismo estrutural”. E ainda que “a iniciativa contraria o aprimoramento das políticas públicas que tratam as ações afirmativas que estabelecem condições de acesso a oportunidades iguais para grupos historicamente discriminados, como é o caso dos afrodescendentes”.
“Um representante do povo tem a obrigação de politizar e conscientizar sobre toda a desigualdade racial que perpetua a que estamos sujeitos. São 133 anos de uma falsa abolição, sem inclusão social, sem condições dignas de sobrevivência”, diz o presidente da Comissão de Direitos Humanos, Hugo Bruzi Vicari. A titular da Comissão de Resgate Histórico do Negro na Advocacia, Patrícia Oliveira Ferreira, diz que não existe o termo transnegro. “Essa palavra ganhou espaço em tom de brincadeira e desrespeitoso nas redes sociais e hoje é usada por reacionários para distorcer e enfraquecer as políticas públicas de ações afirmativas”, afirma.
Questionado se pretende mudar o termo e se imaginava a repercussão que a situação geraria, o parlamentar afirmou ontem (23) que ele mesmo pretende não votar favoravelmente à emenda de sua autoria. A nota segue e diz que o vereador a apresentou para mostrar a hipocrisia. Conforme ele, a esquerda tenta, “por meio de projetos como este, dividir a sociedade entre negros e brancos, gays e héteros, homens e mulheres, estimulando o ódio”. “A fragilidade deste projeto ideológico fica flagrante quando é recusado o termo transnegro, para pessoas que se identificam como negros, utilizando a mesma lógica deturpada da construção social defendida por eles. Por isso ele deve ser rejeitado”, comenta. O projeto é de autoria da vereadora Fernanda Garcia (Psol).
Dylan Dantas também divulgou uma nota pública para tratar da situação. No texto, ele cita que o presidente Jair Bolsonaro, quando deputado federal, tomou atitude parecida em projeto de lei que propôs cota para deputados e votou contra. “O intuito foi mostrar a hipocrisia de políticos que travam essa batalha ideológica. Assim, aqui em Sorocaba, propus uma emenda para que os vereadores também entrem nessa questão de cotas para serem eleitos, pois seria discriminação mantê-las somente para funcionários públicos, e tão logo, da mesma forma, mencionei os “transnegros”, disse. (Marcel Scinocca)