Noite do beijo completa 41 anos nesta segunda-feira (7)

Por Wilma Antunes

7 de fevereiro de 1981: "Noite do Beijo" reuniu 5 mil jovens no centro de Sorocaba contra decisão judicial que proibia carinho em público.

“Beijem-se: sejam criminosos!” A frase pintada em uma faixa exposta na praça Coronel Fernando Prestes, em pleno regime militar, marca uma das maiores manifestações já vistas em Sorocaba. No dia 7 de fevereiro de 1981, um sábado, a “Noite do Beijo” reuniu aproximadamente cinco mil jovens. O célebre ato de rebeldia completa 41 anos amanhã (7). Mesmo depois de quatro décadas, o protesto ainda desperta reflexões para a sociedade atual.

Com 270 mil habitantes na época, a mocidade da então pacata cidade ficou estarrecida com a portaria publicada no dia 28 de janeiro do mesmo ano. A decisão judicial expedida pelo juiz substituto Manuel Moralles condenava demonstrações de carinho entre casais. “Estão proibidos os beijos cinematográficos, em que as mucosas labiais se unem em expansão insofismável de sensualidade assim como as apalpadelas, apertões, abraços indecorosos, beijos prolongados ou qualquer ato libidinoso, quando praticados em locais públicos”, dizia o documento.

Carlos Baptistella, que tinha apenas 17 anos na ocasião, conta que a “Noite do Beijo” surgiu, primeiramente, como uma brincadeira. Afinal, os beijos consentidos nunca representaram perigo a ninguém. Entretanto, quando os casais que paqueravam e namoravam nas praças da cidade começaram a ser importunados, uma manifestação artística foi organizada por jovens, artistas e universitários.

“Um rastilho de pólvora”

Poucos dias após a publicação da portaria, a “Noite do Beijo” aconteceu. “Foi como um rastilho de pólvora. Pouco tempo depois, grupos de teatro amador, oposição e estudantes de medicina fizeram uma corrente para espalhar a mensagem. Era pra ser como um sarau, mas no fim das contas o ato tomou uma dimensão maior. Em um determinado momento, houve infiltração de pessoas que estavam lá a fim de causar tumulto. Eram umas pessoas mais velhas, umas figuras mais estranhas. Eles falaram para encerrar o ato ali senão iriam ‘quebrar tudo’”, relembra Baptistella.

Com a censura ainda vigente no Brasil, a tentativa de oprimir a manifestação a favor do beijo -- que, na verdade, era uma reivindicação à volta das práticas democráticas em geral --, não deu certo. Mesmo com autoridades policiais “espantando” os jovens da região, o encontro ocorreu e teve participação de milhares de pessoas. O assunto tomou grande dimensão nos noticiários nacionais da época e repercutiu até mesmo fora do País.

O escritor uruguaio Eduardo Galeano cita a “Noite do Beijo” em sua obra. “Os Filhos dos Dias” (2011) é um calendário humano da história que conta uma história para cada dia do ano. A memória do dia 8 de fevereiro é, justamente, a “Noite do Beijo”. “A gente vive em um mundo muito difícil e perigoso. Somos bombardeados com notícias falsas, essa divisão é gerada de forma completamente artificial... esse é o momento crucial de levantar a cabeça, refletir e mudar os rumos”, analisa Carlos. (Wilma Antunes)