Data é oportunidade para falar sobre os direitos e igualdade

Por Virginia Kleinhappel Valio

"Mulheres lutam todos os dias", diz Josefina Tranquilin, cientista social e antropóloga.

Hoje, 8 de março, é comemorado o Dia Internacional da Mulher. Muitas vezes associada às flores e parabenizações, na maioria dos países, a data é marcada por conferências, debates e reuniões cujo objetivo é discutir o papel da mulher na sociedade atual. Quando falamos dos direitos da mulher no Brasil, muitos vão lembrar de leis importantes que foram marcos em nossa legislação, como a Lei Maria da Penha. Conquistar estes direitos no Brasil e no mundo ao longo dos anos só foi possível devido à união de mulheres em busca de igualdade.

Graduada em Ciências Socais, com mestrado e doutorado em Antropologia e pós-doutorado em Comunicação e Consumo, Josefina Tranquilin conta que desde que começou a observar o mundo, percebeu que os homens podiam fazer coisas que as mulheres não podiam “Eu achava isso bem chato e estranho. E muitas vezes sofri abusos por fazer algumas coisas que os meninos faziam. Nem sabia que era abuso! Quando entrei na faculdade de Ciências Sociais, entendi que essas diferenças eram estratégias do poder patriarcal”. Assim, Josefina iniciou sua luta pelos direitos humanos das mulheres e pela igualdade de gênero. “Me considero hoje uma ativista pelos direitos humanos, de forma geral, e uma feminista, que luta pela igualdade de gênero, sempre interseccionando gênero, raça-etnia e classe social”, disse.

Para ela, as mulheres lutam todos os dias. “Só de existirmos no patriarcado, já significa muita luta diária, mas, ter um dia especial, internacional é muito importante, porque neste dia unimos as nossas vozes. São mulheres do mundo inteiro lutando por um mesmo ideal: o direito à vida sem nenhum tipo de violência”.

A antropóloga destaca as conquistas das mulheres em termos cotidianos, como a ocupação das mulheres nas redes sociais, chamado de ciberativismo feminista, que cria uma forma completamente nova de atuação e consolidação do movimento feminista. Segundo ela, as mulheres estão lutando fora das instituições tradicionais de luta. “Isso nos traz uma horizontalidade, temos mais autonomia e pulverização das nossas ações; criamos mais grupos e coletivos, com caráter mais informal, com isso conquistamos mais interação e o apoio coletivo das mulheres feministas; o retorno às ruas, inclusive com atos estéticos; aprendemos sobre a interseccionalidade, ou seja, ampliamos a luta interseccionando classe/raça-etnia/gênero”.

Ela comenta também a conquista da implementação das cotas étnico-raciais nas instituições federais (algumas estaduais e particulares) de ensino superior, uma vez que mulheres negras, indígenas e periféricas tiveram acesso a universidades. “Isso é maravilhoso, porque a diversidade está dentro dos espaços que antes era diferente, mas, não diverso”.

A reivindicação mais importante, para ela, continua sendo a liberdade do corpo da mulher. “Nossos corpos ainda não são nossos! Eles são dos homens machistas, da família toda, das religiões proibitivas e de todas as instituições que não querem que nossos corpos sejam nossos. E isso é muito difícil, porque o comando dos nossos corpos está nas mãos de quem nos violenta o tempo todo”.

Fundadora da Casa Abrigo Valquiria Rocha, que há 34 anos realiza trabalho de resgate e acolhimento de mulheres e filhos vítimas de violência doméstica, a advogada e ex-vereadora Cíntia de Almeida, destaca a importância da data e da causa para a cidade. “É um dia importante para nós. Sorocaba foi a primeira cidade do interior de São Paulo a ter a Delegacia da Mulher 24 horas de plantão, também foi a primeira cidade a lutar para que o IML atendesse de imediato as vítimas de violência e a primeira e única cidade do interior paulista a ter um centro de reabilitação para o autor da violência doméstica, criado por mim, em 2014”.

O interesse em ajudar outras mulheres surgiu quando Cíntia, aos 24 anos e grávida, foi agredida pelo então marido. “Fiquei 30 dias em repouso para não perder o filho. Foi então que desabrochou esta missão e o sonho de ajudar outras mulheres. Como eu conheço as leis, tenho acesso ao fórum, juiz e promotor, além de ter passado por isso, vi como uma missão”. São 34 anos ajudando gratuitamente as mulheres e famílias em situação de vulnerabilidade no sentido da violência doméstica.

Quando atuou no legislativo sorocabano em um ambiente masculinizado, Cíntia diz que foi bem aceita, mas precisou se impor muitas vezes. “Fui a primeira mulher a ser vice-presidente na Câmara Municipal de Sorocaba. E a primeira presidente mulher do diretório municipal do MDB de Sorocaba. Fui muito bem aceita. Havia igualdade, mas porque a gente se impõe. Todos os dias você precisa se impor na política, mas fui muito bem recebida”.

Para ela, apesar das muitas pedras no caminho das mulheres, as conquistas precisam ser comemoradas. “Além da criação da Lei Maria da Penha, as mulheres conquistaram o direito ao voto, a ir e vir sem permissão do cônjuge. Passaram também a ter direito a moradias, afastamento do trabalho sem perder a remuneração, atendimento prioritário na saúde. A mulher precisa ter sua vida e trabalho respeitados. A maior conquista, é a da visibilidade”.

Sobre o mercado de trabalho, Cíntia acredita que os gestores precisam respeitar mais a mulher. “Hoje a mulher está em maior número dentro das empresas públicas e privadas, só que ela ainda tem a defasagem salarial e também tem a questão de gênero, do assédio moral e assédio sexual. É preciso ter uma conscientização disto tudo, para dar um basta”.

Por que 8 de março?

Em 8 de março de 1857, operárias de uma fábrica de tecidos situada em Nova Iorque fizeram uma grande greve para reivindicar melhores condições de trabalho como redução de carga diária de trabalho para 10 horas. Na época, as fábricas exigiam 16 horas de trabalho das mulheres. Elas também pediam equiparação de salário com os homens, pois elas recebiam 1/3 do salário dos homens, para exercer a mesma função. Outra reivindicação era o tratamento digno dentro do ambiente de trabalho.

A manifestação foi reprimida com total violência. As mulheres foram trancadas no local, que foi incendiado. Num ato desumano, 130 tecelãs morreram carbonizadas. Somente em 1910, em uma conferência na Dinamarca, o dia 8 de março foi reconhecido como o Dia Internacional da Mulher, em homenagem às mulheres mortas na fábrica. Em 1975, a data foi oficializada pela ONU (Organização das Nações Unidas). (Virgínia Kleinhappel Valio)