Todos os meses deveriam ser cor-de-rosa

À véspera do final da campanha Outubro Rosa, mulheres relatam como venceram o câncer de mama e incentivam autocuidado

Por Virginia Kleinhappel Valio

Por ser o tipo de câncer com maior índice de mortalidade entre as mulheres, a luta contra à doença precisa ser permanente

A campanha Outubro Rosa, de conscientização da prevenção do câncer de mama, se encerra na terça-feira (31). No entanto, por ser o tipo de câncer com maior índice de mortalidade entre as mulheres, a luta contra à doença precisa ser lembrada todos os meses do ano. É a prevenção que aumenta as chances de um diagnóstico precoce e, consequentemente, de cura. O autocuidado e a prevenção, unidos à força e vontade de viver, salvou a vida de mulheres que foram surpreendidas com o diagnóstico do câncer de mama.

Há sete anos, Rossana de Sousa, de 54 anos, percebeu algo ao fazer o autoexame durante o banho. Procurou o médico, realizou os exames e descobriu 19 nódulos na axila. Em dois meses, eles se espalharam. A partir daí, começou a sua luta contra um tumor considerado agressivo e raro. O momento do diagnóstico é descrito por ela como um choque. “Tinha as minhas caçulas com 12 anos, ainda tinha filhos para criar. Era medo e pânico, Quando fez a mastectomia total, não conseguia escovar os dentes e o braço não levantava”, comenta. Ela conta que estava fragilizada fisicamente e emocionalmente: “Estava devastada. Fiquei com 38 kg, foi um processo muito difícil. Hoje, faço até crochê. Eu já fazia, mas achava que nunca mais ia conseguir fazer por conta da dor no braço”.

Em uma fala que demonstra amor-próprio e aceitação, Rossana comenta que não tem interesse em fazer a reconstrução da mama. “Tenho um marido maravilhoso, que fez eu me aceitar assim. Sou casada há 36 anos, hoje, sou bem resolvida nessa questão estética e não tenho essa preocupação”. Os seus pilares de sustentação durante o tratamento foram o marido, a fé em Deus e as terapias: “No atendimento fisioterápico, você consegue lidar com suas emoções muito melhor. Porque na sala de quimioterapia acontece muita coisa. Durante o processo todo você vivencia perdas, mas também vivencia grandes vitórias”. Para Rossana, depois de passar pelo câncer, a simplicidade se torna necessária: “Acordar e pensar no dia de hoje, não no ontem ou no amanhã. Vou viver e vou viver bem, vou se grata!”

Em 2016, Maria Ângela Rosa, de 55 anos, mãe de dois filhos, descobriu o câncer de mama durante um exame de prevenção e pensou que não resistiria. À época, precisou se afastar do trabalho para fazer o tratamento. “Achei que eu ia morrer, pensei o que eu havia feito de errado. No começo, vem a revolta e você pensa: eu fiz tudo direitinho, por quê comigo? Eu tenho uma vida, tinha 47 anos quando aconteceu. Mas hoje eu não vejo assim”.

Maria não se entregou ao câncer, ao contrário, fez pilates, yoga e terapia bioenergética. O pensamento de que iria morrer mudou a partir do momento que Maria iniciou o tratamento. “Eu vi que tudo tem um motivo nessa vida e que eu não iria morrer. O tratamento durou cerca de 10 meses, com quatro sessões de quimioterapia e 30 de radioterapia. Mesmo após sete anos da vitória contra o câncer, Maria continua sua rotina na Liga Sorocabana de Combate ao Câncer, agora para conversar com outras mulheres que passam ou passaram pelo mesmo que ela. “Eu vejo a importância de ter todo esse aparato psicológico, carinho e aconchego”. Hoje, liberada do tratamento, ela ressalta a importância de se manter atenta e cuidadora em relação ao próprio corpo. “Se não fosse a prevenção, eu não teria tido um diagnóstico precoce”.

O poder do otimismo

Rosana Camargo Rodrigues, de 58 anos, descobriu o câncer durante exame de prevenção. Ela tinha um nódulo que acompanhava com o médico há seis anos. “Ele explicou que eu tinha um câncer de mama na auréola. Fiquei assustada, na hora a gente choca”. Mesmo assustada, Rosana conta que não teve medo de morrer. “Todo mundo liga o câncer à morte, para mim isso não existe”. Ela conta que não quis fazer a reconstrução da mama. Ao contrário, optou por tirar a outra auréola também. Logo que soube do câncer, correu fazer os exames e em pouco tempo, fez a cirurgia. “Comecei o tratamento com quimioterapia em janeiro e terminei em maio. Pelo tamanho que eram os tumores, não precisei fazer radioterapia”.

Em pouco tempo de conversa, é possível notar o otimismo de Rosana, que ela afirma ser uma grande característica sua. “Sou otimista. Eu estou viva, é uma passagem. É uma coisa que você tinha que ter, passar por você, era seu, mas não é mais. Não me prendi a doença. Era como se eu soubesse que iria passar. Sempre fui assim, para frente. E sempre que encontro as pessoas que estão com câncer de mama tento transmitir isso”, disse.

Colocar em mente que é passageiro e pensar positivo é um dos conselhos de Rosana às mulheres com câncer: “Viva, pense para frente, pense positivo, se você não pensar positivo, em você, na sua saúde, na sua felicidade, você não vai ter nada para passar para os outros. Eu amo, eu faço, eu quero: assim tem que pensar. Se você quer realmente ser curada, pense para frente”.

O apoio da Liga

Todas as mulheres entrevistadas contaram com o apoio da Liga Sorocabana de Combate ao Câncer, onde são oferecidas terapias complementares, como reiki, pilates, yoga e terapia familiar. Na Liga, as mulheres têm acesso a nutricionistas, fisioterapeutas, psicólogos e assistente social. Todo o atendimento é feito por voluntários e parcerias com universidades de Sorocaba.

Para Marisa Lopes, presidente da Liga, todos os meses deveriam ser cor-de-rosa, que é preciso uma campanha de conscientização permanente. “Nós recebemos mulher com câncer de mama aqui de janeiro a dezembro. Tem muita mulher que esquece, marca a consulta e ela demora. Todo mês deveria ser feito uma campanha de conscientização. Quando começamos esse modelo que temos, em 2010, eram mulheres de 65 anos, 70, 80. Nesses treze anos, a faixa etária vem diminuindo, caiu para 50, 40, 30, 20. A mulher precisa ficar atenta”.

“A mulher recebeu o diagnóstico do médico? Venha para a Liga. O médico não precisa encaminhar para isso. Vamos encaminhar para psicóloga, e oferecer as nossas atividades aqui. Vai fazer a cirurgia daqui três meses, por exemplo? Nós encaminhamos ela para a fisioterapia, para preparar essa mulher para a cirurgia, pós-cirúrgico, é só chegar que a gente recebe”, disse Marisa.

O mais incidente

Segundo o relatório de 2023 do Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer de mama é o mais incidente em mulheres -- excluídos os tumores de pele não melanoma -- em todas as regiões do Brasil, com as taxas mais altas registradas nas regiões Sul e Sudeste. Para o Brasil, foram estimados 73.610 casos novos de câncer de mama em 2023, com um risco estimado de 66,54 casos a cada 100 mil mulheres.

A doença também ocupa a primeira posição em mortalidade por câncer entre as mulheres no Brasil, com taxa de mortalidade ajustada por idade, pela população mundial, para 2021, de 11,71/100 mil (18.139 óbitos). As maiores taxas também estão no Sul e Sudeste.

Fatores de risco

De acordo com a ginecologista e obstetra, Carolina Furtado Macruz, o câncer de mama não tem causa única, mas há situações que aumentam o risco de desenvolver a doença, como idade (após os 50 anos), obesidade, sedentarismo, consumo de álcool, tabagismo, histórico familiar de câncer de mama e ovário, principalmente parentes de primeiro grau antes dos 50 anos, alteração genética, menarca precoce (antes de 12 anos), menopausa tardia (após 55 anos), primeira gravidez após 30 anos e exposição frequente a radiação ionizante.

“O risco de desenvolver câncer de mama é maior na mulher a partir dos 50 anos de idade. Quanto maior a idade, maior também é o risco isolado para o desenvolvimento do câncer de mama. A idade média no momento do diagnóstico é de 60 anos, o que não significa que uma mulher entre os 20 e 40 anos não possa vir a apresentar a doença, com menor probabilidade. Na faixa etária entre 40 a 49 anos concentra-se cerca de 15% a 20% dos casos de câncer de mama. Em homens podem ocorrer casos de câncer de mama, mas é raro”, explica a especialista.

Prevenção

A prevenção da doença está relacionada a realização de atividades físicas, manter peso corporal adequado, ter uma alimentação saudável, evitar bebidas alcóolicas e não fumar. “Os sintomas mais comuns do câncer de mama são a presença de “caroço” ou nódulo na mama, pele da mama avermelhada ou parecida com casca de laranja, saída de secreção pelo mamilo, inversão mamilar (bico) e nódulo na região axilar”.

Já o tratamento varia de acordo com o estadiamento da doença, suas características biológicas, bem como das condições da paciente (idade, status menopausal, comorbidades e preferências). As modalidades de tratamento do câncer de mama podem ser divididas em: tratamento local (cirurgia, radioterapia e reconstrução mamária) e tratamento sistêmico (quimioterapia, hormonioterapia e terapia biológica). O principal objetivo do Outubro Rosa é realizar a conscientização da prevenção do câncer de mama. Essa prevenção consta na procura do profissional especializado para avaliação e realização do exame clínico das mamas e solicitar a mamografia (indicada a partir dos 40 anos, segundo a Sociedade Brasileira de Mastologia).

No Brasil, a Sociedade Brasileira de Mastologia, o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia recomendam a mamografia anual para as mulheres a partir dos 40 anos de idade, visando o diagnóstico precoce e a redução da mortalidade. O Ministério da Saúde preconiza o rastreamento bianual, a partir dos 50 anos. (Virgínia Kleinhappel Valio)