Deficientes visuais colocam a mão na massa em oficina de culinária

Alunos de gastronomia da Uniso ensinaram 19 assistidos da Asac a fazer macarrão e pão recheado

Por Vanessa Ferranti

Proposta dos universitários é desmistificar preconceito de que deficientes não conseguem fazer as mesmas coisas feitas por pessoas que enxergam

Pessoas com deficiência visual, assistidas pela Associação Sorocabana de Atividades para Deficientes Visuais (Asac), participaram ontem (13) de uma oficina de culinária na Universidade de Sorocaba (Uniso). A iniciativa foi promovida pelos estudantes do curso de gastronomia da instituição. Alguns convidados puderam, literalmente, colocar a mão na massa e aprenderam a preparar macarrão. Eles fizeram a massa fresca, sovaram para ficar uniforme e lisa, escolheram o corte e prepararam o molho. Já outros, ficaram com a sobremesa — um delicioso Cinnamon Roll — um pãozinho recheado de canela.

Ao todo, 19 deficientes visuais participaram da ação. Já na manhã de hoje (14), os estudantes, convidados e profissionais de diversas áreas participam de uma roda de conversa para discutir o tema. O evento será aberto à população.

Segundo Letícia C. Rocha, de 22 anos, estudante do 4º semestre de gastronomia, o objetivo é compartilhar conhecimento e mostrar que as pessoas com deficiência visual são capazes de realizar as mesmas tarefas que aquelas que enxergam. “Existe um preconceito. Quem tem a visão perfeita acredita que quem não tem não é capaz de fazer tudo o que a gente faz. Mas viemos para desmistificar isso, tirar tudo isso da nossa cabeça; derrubar essa ideia de que eles não conseguem; mostrar que sim, eles conseguem. Então, tivemos essa ideia de trazê-los para cá, para a nossa cozinha”, declarou.

Para isso, 30 alunos do curso auxiliaram os convidados da Asac. Os estudantes passaram as orientações, indicando os ingredientes, quantidades e todo o processo para o preparo das receitas. Valdinei Aparecido Moreno, de 52 anos, foi um dos participantes da oficina. O aposentando nasceu com deficiência visual — tem 5% da visão apenas no olho direito. Durante a vida, Valdinei passou por muitos desafios. Ele conta que é de Sorocaba, mas cresceu em Fartura, cidade paulista do Vale do Paranapanema. Aos 13 anos, sem saber ler ou escrever, precisou voltar para a cidade natal e, assim, conseguir estudar. De acordo com o aposentando, naquela época os professores não recebiam capacitação para ensinar alunos com deficiência visual nas escolas. “Naquele tempo não existia a chamada inclusão que hoje tem. Então, eu tive que voltar para estudar. Eu comecei a viver, digamos assim, com 13 anos”.

Valdinei conta também que já cozinhou algumas vezes, no entanto, receitas mais básicas, do dia a dia. Para ele, participar da oficina, aprender e trocar experiências com os estudantes é gratificante. “Perguntei para a Letícia (estudante) se ela já tinha tido contato com um deficiente visual, ela disse que não, então, acho que foi uma troca de experiências múltiplas. O conhecimento que estou tendo hoje aqui é um conhecimento que vou levar para o resto da minha vida. Isso é muito válido, muito importante para nós, aprender, conhecer outras pessoas, conhecer alguns temperos que a gente não conhece. É uma via de mão dupla, uma nova realidade, para mim, como deficiente, e para a Letícia, que chamamos de pessoa vidente, quem enxerga é vidente”, explicou.

Reabilitação

A Associação Sorocabana de Atividades para Deficientes Visuais é uma entidade sem fins lucrativos que trabalha a habilitação e reabilitação visual de pessoas que nasceram ou perderam a visão ao longo da vida. A terapeuta ocupacional da Asac acompanhou a oficina. “Eles estavam superansiosos e foi bem bacana. Eles adoram participar de oficinas, de tudo que tirem eles dessa rotina, do comum, do dia a dia. Eles estão superfelizes e nós também, como instituição, ficamos felizes com o contato da turma da gastronomia e eles aproveitaram bastante, foi muito bacana”, relatou Caroline Antunes, profissional da associação.

A roda de conversa acontece nesta terça-feira (14) às 8h, no Anfiteatro da Biblioteca da Universidade de Sorocaba. O evento é aberto ao público. A Cidade Univesitária da Uniso fica na rodovia Raposo Tavares, quilômetro 92,5.