Alunos se adaptam ao uso restrito de celular na escola
Estudantes e educadores se ajustam à nova realidade no ensino paulista

O ano letivo de 2025 começou com uma novidade tanto nas escolas particulares quanto nas públicas: a restrição do uso do celular. A medida foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) em 13 de janeiro. Embora o uso do aparelho já fosse regulado por algumas normas, como a limitação do acesso a aplicativos e plataformas sem fins educativos pelo Wi-Fi das instituições, agora os estudantes estão se adaptando a uma nova realidade.
A aluna Manuela Lipparotti, de 14 anos, que está no 9º ano do Ensino Fundamental II, inicialmente não aceitou bem a nova regra. A ideia de não poder usar o aparelho durante o período escolar lhe parecia estranha. No entanto, após duas semanas de aula, percebeu que o desafio não era tão grande quanto imaginava.
“Eu achei que seria muito mais difícil, mas não foi. Na verdade, ajudou bastante na concentração, pois antes era fácil se distrair com o celular na mesa e com as notificações chegando o tempo todo”, conta a estudante. “Claro, é uma mudança significativa. Antes, eu usava o celular para pesquisar termos que não conhecia, agora preciso recorrer ao material didático. Mas vejo que foi uma boa mudança.”
Além disso, Manuela relata que a ausência do celular no ambiente escolar a aproximou mais das amigas, gerando mais interações. “Antes, os assuntos eram todos relacionados a algo visto nas redes sociais. Agora, conversamos mais sobre o cotidiano, a escola e acontecimentos do dia anterior.”
Ela menciona, no entanto, um ponto negativo: “A única coisa de que sinto falta é de registrar momentos com meus colegas. Nossa turma é muito unida, e temos o costume de gravar muitos vídeos juntos. Às vezes, acontece algo muito divertido e eu gostaria de registrar para guardar como lembrança.”
Adaptação no Ensino Médio
Para Isabella Pires de Camargo Oliveira, de 15 anos, os primeiros dias de aula transcorreram normalmente. No 1º ano do Ensino Médio, o uso do celular já era restrito em sala, sendo permitido apenas com autorização do professor. A maior mudança ocorreu no intervalo, quando o uso do aparelho passou a ser proibido.
“Os pontos positivos são que a turma realmente presta mais atenção e está bem mais participativa. Além disso, agora conversamos mais com os professores”, relata a estudante. “O que mais dificulta é a comunicação com os pais ou amigos de fora. Também há o problema do pagamento na cantina, já que costumávamos usar Pix, e agora isso não é mais permitido.”
E para os professores?
Enquanto os estudantes se adaptam a uma rotina sem celular, os professores também vivenciam essa nova realidade. Para a professora Débora Denilde da Silva Santos Ricardo, de 45 anos, muitos alunos ainda enfrentam dificuldades, principalmente aqueles que usavam o celular constantemente como ferramenta de apoio. No entanto, alguns benefícios já são perceptíveis.
“Sem as distrações dos dispositivos móveis, o ambiente está mais concentrado, com mais discussões sobre os temas estudados e maior interação entre os alunos”, afirma.
Por outro lado, Débora acredita que a proibição total pode limitar os benefícios do celular, como o acesso a informações e recursos online que podem enriquecer o aprendizado. Ela também destaca que muitos alunos utilizavam o aparelho para anotações, lembretes e organização de tarefas.
“O uso do celular no intervalo, na entrada e na saída poderia ser mais flexível. Assim, os estudantes conseguiriam se comunicar com mais agilidade com os responsáveis em caso de necessidade”, sugere.
Além disso, segundo sua experiência em sala de aula, os alunos têm buscado novas formas de distração, como pintar, desenhar ou ler sobre assuntos fora do conteúdo escolar.
O melhor dos dois mundos
Para a psicóloga escolar Cristina Bachert, de 62 anos, a nova lei ajudará os jovens a desenvolverem um uso mais consciente da tecnologia. Assim como Débora, ela vê vantagens e desvantagens na restrição, mas acredita que o equilíbrio entre o mundo online e offline é essencial.
“O celular é extremamente fascinante e sedutor, oferecendo desde jogos até informações. Com a facilidade de acesso, passamos a utilizá-lo cada vez mais. Hoje, percebemos que crianças e adultos estão excessivamente dependentes do aparelho”, explica a especialista.
Além de melhorar a concentração e a atenção em sala de aula, a ausência do celular no ambiente escolar pode trazer benefícios emocionais e sociais, como maior interação entre os alunos e desenvolvimento de habilidades para resolver conflitos. Cristina destaca que as redes sociais acostumaram as pessoas a simplesmente bloquear umas às outras para evitar divergências de opinião. Agora, os alunos precisarão resolver seus conflitos por meio do diálogo e aprender a aceitar diferenças.
“As tecnologias não podem substituir ou silenciar nosso lado humano. O que nos torna humanos é a capacidade de nos compreendermos, algo que só conseguimos por meio do relacionamento com outras pessoas”, enfatiza.
Contudo, após 25 anos atuando na área da educação, Cristina reconhece que a tecnologia é uma competência prevista na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e deve ser incentivada. No entanto, precisa ser integrada ao aprendizado de forma planejada e com propósito.
“O celular pode ser uma excelente ferramenta, assim como qualquer outra tecnologia, desde que seu uso seja feito dentro de um contexto educacional bem definido”, conclui.
Como os pais encaram a situação?
A arquiteta Débora Prezotto Dal Bom Lipparotti, de 38 anos, mãe de Manuela, acompanha de perto a adaptação da filha. Para ela, a medida é positiva para proteger o ambiente escolar, já que o uso excessivo do celular em sala compromete o aprendizado e prejudica a interação social.
“Acredito que seja uma oportunidade para os alunos descobrirem novas formas de se relacionar e despertar interesses de maneira mais criativa”, reflete.
Quanto à adaptação, Débora imaginou que a transição seria mais difícil, mas percebeu que a filha e os colegas se ajustaram rapidamente. “Ouvir a opinião dos alunos e oferecer alternativas para que possam interagir e se divertir faz toda a diferença”, conclui. (Beatriz Falcão)