A memória ferroviária ao alcance das crianças em Sorocaba
Exposição sobre o Trem Ouro Verde também reforça a importância de preservar bens históricos das ferrovias
Talvez você ainda não tenha tido a oportunidade de viajar em um trem de passageiros, mas com certeza já viu algum -- seja pelos livros, fotos, filmes ou até avistando de longe. Você sabe a história e a importância desse meio de transporte para a nossa cidade e região?
Houve um tempo que a ferrovia era a forma mais rápida e segura de se locomover, pois as rodovias e os ônibus ainda eram muito precários. Uma das heranças desse tempo é o trem Ouro Verde, que foi a composição de passageiros mais famosa da Estrada de Ferro Sorocabana (EFS), e está em exposição até dia 10 de setembro no Centro de Memória Ferroviária de Sorocaba, na Estação Paula Souza.
O projeto “EFS Ouro Verde 80 Anos” é desenvolvido pela Sorocabana -- Movimento de Preservação Ferroviária por intermédio do Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo (Proac ICMS) e objetiva reforçar a mensagem da necessidade de preservação material de elementos representativos da ferrovia paulista. Nesse sentido, difundir às crianças de Sorocaba o conhecimento patrimonial a respeito do primeiro trem de aço da ferrovia, construído em 1937 na Alemanha, tem um valor muito especial.
No início do mês, alunos da E.E. Visconde de Porto Seguro visitaram a mostra. Ao todo, 29 crianças entre 13 e 14 anos fizeram uma visita monitorada pela estação e pelo próprio trem. A mostra é dividida em cinco estações, que abordam diferentes momentos do Ouro Verde e do transporte ferroviário de passageiros no Estado: “Raízes” (carro Bagagem-Correio), “Luxo” (1ª Classe), “Declínio” (2ª Classe), “Agonia” (Dormitório-Salão) e “Renascimento” (Restaurante). Ao longo dos quase 100 metros de comprimento do trem, os alunos puderam “viajar” pelas cidades por onde ele passava.
Um dos alunos que aproveitou o passeio para descobrir mais da história e refletir sobre a atual situação dos trens foi Lucas Aleixo Corrêa, 14 anos. “O que mais gostei foi o trem de primeira classe, porque era pra ser o mais bonito, porém é o que está com mais marcas do tempo. E isso é muito triste, porque se houvesse um projeto de preservação e cuidado há mais tempo, quem sabe a gente pudesse usá-lo como transporte aqui no Brasil.”, analisou. O estudante ainda acredita que a ferrovia possa ser restaurada e que só vê benefícios nisso. “Levaria mais gente por um gasto menor, economizaria combustível, entre tantas vantagens que o transporte tem.”
Lucas teve a chance de andar de trem apenas uma vez, com a avó, ainda criança. Diferentemente dele, seu professor de história, Ronaldo Benedito Messias, de 56 anos, nasceu perto da Fazenda Ipanema, em Iperó, uma das rotas da ferrovia Sorocabana. Ele também acompanhou os alunos na exposição e relatou uma nostalgia em cada estação que passava. “Era um tempo tão gostoso, a exposição me remeteu a momentos importantes da vida”, contou.
Para o professor, a exposição é a oportunidade dos alunos sentirem com maior intensidade os aprendizados que tem na escola, ainda mais por ser um assunto tão importante pra nossa cidade e região. “Tudo é história. Eles são jovens, não sabem do valor que isso tem para sociedade. É muito além de tirar fotos desse espaço. Por isso é tão importante essa exposição”, ponderou.
Ao longo do tempo
A Estrada de Ferro Sorocabana (EFS) foi fundada em 1870 e inaugurou em 1875 o seu primeiro trecho, com 110 quilômetros, entre Sorocaba e São Paulo. Com o passar dos anos, a tecnologia ferroviária encurtou as distâncias e aumentou consideravelmente a velocidade e peso dos trens, contribuindo para o transporte do algodão e café entre os municípios brasileiros. Novas extensões foram criadas e outras ferrovias foram conectadas, levando a EFS ao topo de sua extensão em 1959, com 2.172 quilômetros.
A modernização dos trens, com a adoção de novas tecnologias como locomotivas elétricas e a diesel em substituição às antigas “Marias-Fumaça”, e a construção de grandes estações e oficinas entre os anos 1930 e 1950, permitiram que a Sorocabana se tornasse a ferrovia mais eficiente do País, batendo recorde de toneladas-quilômetro útil de cargas transportadas entre o final dos anos 1940 e início dos anos 1950. A partir daí, entretanto, o setor ferroviário começou a perder espaço no País. Com menos investimentos e problemas financeiros, a Sorocabana adotou o nome de Fepasa em 1971 e foi passada para a iniciativa privada em 1999, estando atualmente concedida à empresa Rumo Malha Oeste.
O declínio do transporte ferroviário condenou o trem de passageiros ao desaparecimento e, com isso, o próprio Ouro Verde esteve ameaçado de virar sucata. “Agora ele voltou a estar acessível à população, ganhando uma nova função cultural”, comemora o jornalista Eric Mantuan, coordenador geral do projeto.
Você sabe o que é educação patrimonial?
Um dos objetivos da exposição é despertar nos visitantes a consciência quanto à preservação do patrimônio histórico ferroviário. Isso é educação patrimonial. Para a educadora Maria Tereza Parente, de 39 anos, Sorocaba tem elementos ferroviários gigantes, mas que carecem de cuidados. Por isso, a exposição tem a oportunidade de recuperar histórias que, muitas vezes, ficam esquecidas.
Quanto à presença dos alunos, ela espera que as visitas não sejam pontuais. “Os professores já estavam trabalhando o assunto em sala e muitos deles chegaram com perguntas pertinentes, sabiam ler as plantas. E eu espero que o tema não pare por aqui, porque como a ideia é do renascimento, espero que os alunos integrem equipes de pesquisa e que possam fazer a diferença mais para frente”, finaliza.
A exposição
A mostra é gratuita e fica aberta ao público até 10 de setembro, podendo ser visitada às quintas e sextas-feiras das 14h às 19h e aos finais de semana e feriados das 10h às 18h. O Centro de Memória Ferroviária fica na Estação Paula Souza, à rua Paula Souza, nº 420, no Centro. (Thaís Marcolino)