O primeiro barco
Artigo escrito por Vanessa Marconato Negrão
Falar de um livro de José Saramago sem fazer uma citação direta é muito difícil. Para mim, parece impossível. Então já começo transcrevendo suas palavras: “Ali esteve todo um dia e toda uma noite, a ver como subia e baixava a maré, a ver levantaram-se ao largo as ondas, a ouvir o fragor delas quando se desfaziam na linha de rebentação, e depois o suspiro delicado da espuma ao ser sorvida pela areia.”
Antes de conhecer esse trecho de “O primeiro barco” nunca tinha atentado para o som da água ao ser tragada pela areia na volta de uma onda. Nunca mais esse ruído me passou despercebido, embora sejam tão raras as minhas visitas ao mar. Os poucos momentos vividos na beira da praia são embalados por sonoros suspiros do mar. Saramago faz isso com quem o lê: descreve detalhes de forma tão minuciosa que os agiganta. Suas palavras nos levam para dentro de nós mesmos, se tornam familiares logo em seguida a leitura.
Por isso, ler Saramago para uma criança é o mesmo que dizer a ela: veja como o mundo é bonito, veja como você é capaz, veja como a vida é extraordinária. É, sobretudo, deixar nas entrelinhas a mensagem de que não é justo nem coerente subestimar a infância.
O texto que este livro traz foi publicado pela primeira vez no Brasil em 2014 -- com o nome “Prefácio para um livro”, no livro Cadernos de Lanzarote II -- e descreve a experiência do primeiro contato entre o homem e o mar. Quem nasceu longe do litoral conhece a sensação de vê-lo pela primeira vez, numa mistura de admiração e espanto. Uma fonte inesgotável de poesia e reflexão. Um livro para presentear crianças de qualquer idade, que sejam muito amadas. Da editora Companhia das Letrinhas.
Vanessa Marconato Negrão é professora e apaixonada pela literatura infantil