Viajantes reforçam ações de solidariedade
Deuzani dos Santos aprendeu o ofício da cerâmica com a mãe, dona Izabel. De geração em geração, as artesãs do Vale do Jequitinhonha passam adiante a tradição. Após viagens à região, Marianne Costa percebeu que divulgar a arte mineira não bastava. “Valia mais levar as pessoas até lá do que comprar a cerâmica e vender. Quis oferecer essa vivência de resgate dos valores, de conexão, neste momento em que as pessoas estão buscando propósito”, conta a fundadora da Vivejar, que faz roteiros para comunidades do Brasil desde 2016.
A valorização do saber popular e a relação próxima com os moradores impeliram Marianne a se movimentar para ajudar essas comunidades, duramente atingidas com a paralisação do turismo após a pandemia do novo coronavírus. Afinal, enquanto não é recomendado viajar, é mais do que indicado colaborar.
“Está sendo muito bacana. A gente criou essa vaquinha on-line e tinha botado a meta de R$ 7 mil. Em 15 dias, tinha batido isso e aumentou para R$ 14 mil”, afirma. “Além da campanha, a gente tem feito pontes. Apoiou os guaranis de Parelheiros, por exemplo, com 300 máscaras, 700 escovas de dentes e 250 cestas básicas, doadas por empresas parceiras.”
Também foi a história da Venturas Viagens com a Chapada Diamantina que motivou Jota Marincek, sócio-fundador da operadora, a lançar uma iniciativa para apoiar guias, motoristas e canoeiros baianos. “O mercado por muito tempo nos identificava com a Chapada Diamantina. A gente fez muitas viagens para lá”, comenta. “Em outras regiões, agora houve uma mobilização, como nos Lençóis Maranhenses e na Chapada dos Veadeiros, em Goiás. Mas na Diamantina a gente sentiu que estavam meio perdidos. Já arrecadamos R$ 20 mil.”
Petar
Quem conhece as cavernas do Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Petar) também colabora com a iniciativa para ajudar guias e trabalhadores de pousadas da região, no sul do Estado de São Paulo. “A campanha começou no fim de abril e já fizemos duas distribuições, no total de 200 cestas básicas”, diz Rodrigo Aguiar, gestor do Petar de 2013 a 2019. Para dar transparência e estimular doações, foi criado o Instagram @conexaopetar. O próprio Aguiar começou no Petar como monitor ambiental, acompanhando estudantes. “No fim da viagem, eles entendiam que a relação das pessoas com a natureza não impede o desenvolvimento econômico e que pequenas ações podem mudar o mundo.”
Povos indígenas
É na dependência de muitas dessas pequenas ações que estão aldeias pelo Brasil, já que os indígenas foram muito atingidos pela Covid-19. “Estamos incentivando campanhas e criamos a nossa”, diz Israel Waligora, sócio-fundador da Ambiental Turismo, que oferecia viagens a terras indígenas antes da pandemia.
Em agosto de 2019, o fotógrafo Valdemir Cunha fez uma viagem com alunos para a aldeia Etenhiritipá, organizada pela Ambiental. Os fotógrafos pagaram pela impressão de um livro e iriam doar os exemplares para os xavantes venderem aos visitantes. Com a Covid-19, a publicação foi posta à venda e a verba será revertida para a aldeia. Além dessa ação, há outras no Instagram @ambiental_turismo.
Coordenada pela Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), que defende 23 povos da Amazônia, a ação Rio Negro, Nós Cuidamos custeia itens de limpeza, alimentos e comunicação nas línguas indígenas. A campanha tem o apoio da ONG Garupa, que formata roteiros que usem o turismo para preservar patrimônios culturais e naturais. Um deles, o Serras Guerreiras de Tapuruquara, leva ao Rio Negro e foi cancelado com a Covid-19. “A gente está apoiando iniciativas de associações indígenas porque a logística é um desafio para o recurso chegar à ponta”, diz a antropóloga Camila Barra, consultora da ONG.
O mercado de luxo também se mobiliza. Integrantes da Brazilian Luxury Travel Association (BLTA) promovem campanhas, caso do Cristalino Lodge, na Amazônia, que está vendendo fotografias de João Paulo Krajewski com lucro destinado à famílias de Alta Floresta (MT). Em 1997, foi criada a Fundação Ecológica Cristalino, para contribuir com pesquisas sobre a biodiversidade da Amazônia e a realização de ações sociais. Segundo Simone Scorsato, diretora executiva da BLTA, 47% dos associados mantinham projetos ligados a comunidades em 2019; agora são 55%.
Como ajudar
Petar (SP) - A vaquinha (vaka.me/1155951) auxilia famílias de monitores ambientais, prestadores de serviço e trabalhadores terceirizados de restaurantes e pousadas.
Chapada dos Veadeiros (GO) - A região recebe alimentos, produtos de higiene e equipamentos de proteção com os recursos da campanha chapadasolidaria.org.
Chapada Diamantina (BA) - A Venturas está à frente da iniciativa (abacashi com/p/sos-guias- chapada-diamantina) para ajudar guias, motoristas e canoeiros.
Vale do Jequitinhonha (MG) e Ilha do Cotijuba (PA) - A Vivejar apoia três comunidades de artesãs, fornecendo EPIs às famílias com as doações feitas por combatecovid.org/vivejar.
Comunidades no País todo - A BLTA divulga ações de seus associados no Instagram @brazilian_luxury_travel.
Indígenas do Brasil inteiro - A ONG Garupa apoia a ação Rio Negro, Nós Cuidamos, coordenada pelas mulheres da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro, para custear alimentos e itens de limpeza e higiene para aldeias no Amazonas: noscuidamos.foirn.org.br.
Há duas iniciativas para ajudar o povo xavante, em Mato Grosso, ambas divulgadas pela Ambiental: um livro de fotos à venda em editoraorigem.com.br e doações em captar info/campanha/sosxavante. No site socioambiental.org, é possível conhecer as ações. (Nathalia Molina - Estadão Conteúdo)